𝖕𝖔𝖓𝖙𝖊 𝖉𝖊𝖘 𝖆𝖗𝖙𝖘

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o tintilar da velha ponte dos cadeados precede sua queda. ela range os dentes com calma, mastiga as minhas bochechas, e então, dolorosamente, para.

fotografias de príncipes azuis dos anos oitenta sufocam copiosamente nas correntes entrelaçadas ao ferro da ponte, e não posso deixar de gargalhar  num sussurro congelante: "nós não estamos mais nos anos mil e novecentos pra você me fazer chorar...", porque sei que eles jamais sobreviveriam ao gelo do rio sena quando eu roubei todos os seus casacos.

almas cristalinas assompram como as penas de um harpa, e a epiderme cintila quando a orquestra mais assustadoramente linda do mundo todo floresce da carne nas minhas entranhas. o meu coração não ressoa junto ao cobre da partitura, ele está ocupado demais tentando não estilhaçar. gotas de chuva escorrem e mancham o quadro pincelado em minha frente, e tenho certeza de que agora não posso cantar como um violino, nem rir nas notas de um piano, porque se eu não posso ser feita de música, então ninguém vai. egoísta, eles disseram. ha. grande coisa. mais um ponto pra mim.

dedilho uma das mil poesias inacabadas que sufoquei naquela ponte, e uma porção de estrelinhas brilham no rio dos meus pés. a minha pele racha, mas lua não me embala no seu sonho cor-de-rosa junto ao sol, muito menos estica os lábios pra me beijar na boca. e tudo bem, porque no fim das contas eu nunca poderia ser callisto e nem teria porra de coroa pra me provar pertencer aos céus, mesmo que eu me lembre muito bem de como é a sensação de despencar da atmosfera.

quando eu ainda era residente do paraíso, ele me pediu para que pincelasse as cores do meu coração, e eu misturei as suas lágrimas aos potes de tinta para que assim eu pudesse o amar por um pouco mais. péssima notícia: eu não pude. não enquanto estive em paris, onde o céu era muito alto e o inferno muito quente. nas mãos eu fervia o sangue do diabo, os olhos chorando todas as serpentes de medusa, só porque ele se achou no direito de me entitular no valor de duas moedas de prata.

ele nunca foi romeu. e eu jamais poderia me tornar julieta. então era mais do que justo que só um de nós dois cometesse suicídio.

lucas jurou do ouro aos cadeados, me agarrou na sala mais quente do inferno e prometeu que depois de me foder ainda lembraria de sussurrar o meu nome. ele me deu todos os pecados mais horrendos de todos os príncipes mais certinhos, mastigou as flores de maçã direto boca do diabo, me mandou ficar quietinha porque assim era mais gostoso, e quando eu pedi pra que ele saltasse da borda do fim do mundo comigo, ele disse não.

paris jamais seria a cidade do amor, e o meu coração sangrando em notre-dame era a prova viva de que o romance não passa de uma orquestra desgraçada que morre de medo de não ter um maestro.

em breve anoiteceria na frança, e logo aquele príncipe azul não economizaria fôlego pra um beijo de adeus quando eu mergulhasse a boca na água, tentando acreditar que o meu coração ainda batia. qual foi a coisa mais bonita que uma vez me disseram? você é má.

má, má, má.

seria convenientemente melhor se ele tivesse sido o maestro nos anos oitenta.

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dia dos namorados ne porra parabens pra vcs ai que tem um coraçao e um maestro porque eu nao tenho👏👏👏👏 amo vcs

ROMEO IS DEADOnde histórias criam vida. Descubra agora