Capítulo 20 - Banana e Canela

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Nerissa


Chego em casa e ouço mamãe falando animadamente com alguém.

- Eles estão ótimos! - ela diz e ri - Max se casou com Leyla, Victoria também se casou com um rapaz bom para ela e Nerissa encontrou um bom homem para ela.

- Fico feliz! - ouço a voz da outra pessoa e eu começo a correr para vê-la.

- Tia Verônica! - digo contornando a ilha da cozinha e a abraçando - Ai, que saudade! - grito e ela me abraça forte.

Na verdade tia Verônica não é minha tia de verdade, ela é madrinha de Max e melhor amiga da mamãe desde os tempos da faculdade delas. Mamãe cursou literatura e ela cursou Artes. Tia Verônica é bem maluca. Seus cabelos são castanhos cacheados com muitas mechas coloridas e suas unhas sempre tem vestígios de tinta, ou argila, ou os dois. Ela tem lindos olhos castanhos amendoados, pele morena e é um pouco voluptuosa e cheia de curvas. Ela está com os cachos presos por um pincel, vestindo um macacão jeans, ma blusa que um dia foi branca mas que agora é colorida e all star amarelos. Inspiro seu cheiro e o familiar cheiro de biscoitos de banana e canela continuam lá. Eu não sei como ela consegue mas sempre cheira a biscoitos de banana e canela. E eu sou simplesmente apaixonada por essa mulher incrível! Ela canta, dança todo tipo de dança, compõe, toca vários instrumentos, pinta, escupi, atua...

- Nossa, como você está linda, meu raio de sol! - ela diz me afastando para dar uma boa olhada - E eu vi a sua menina. Que linda menininha você tem! - ela diz e aperta a ponta do meu nariz.

- O que faz por aqui, tia? - pergunto me livrando de seu aperto - Você não estava em Paris?

- Sim, eu estava. - ela confirma - Mas algumas das minhas telas estão em exposição numa galeria aqui perto e eu vim com elas.

- Ah, isso é ótimo! - digo e ela ri do meu entusiasmo - Não gostaria de inspirar alguns jovens a seguir o caminho da arte e não das drogas, tia Vee?

- Claro, querida! - ela me diz com carinho e faz uma careta logo em seguida - Só me diga que eu não vou ver seu tio que eu topo!

- Na verdade sou eu que estou a frente da fundação. - digo e ela bate palmas - Meu pai descobriu que os responsáveis estavam roubando o fundo Esperanza e passaram para mim. Então eu resolvi abrir uma fundação para crianças carentes. Um lugar para dar a elas a oportunidade de ser algo mais, de transformar realidade deles em algo construtivo.

- É um objetivo muito nobre, querida! - ela diz e ouvimos as vozes do meu pai e de Tio Logan na sala e sua expressão passa de feliz a desagrado - E lá se vai meu bom humor! - ela resmunga e eles entram na cozinha.

- Ah! - tio Logan diz de mal humor também - Por que ela está aqui, James? - ele pergunta ao irmão.

- Não tenho nem ideia! - papai diz e abraça tia Vee. - Quanto tempo, Vee! - ele diz sorridente - Como você está?

- Indo. - ela responde e vejo uma sombra de tristeza em seus olhos.

- Onde está Vincent ? - tio Logan pergunta cruzando os braços com um ar de riso - Te deixou? Ele percebeu como você é insuportável? Ou será que encontrou a lucidez?

- Meu esposo morreu mês passado, Logan. - ela responde com um olhar de profundo desprezo - Obrigado por fazer piada do meu sofrimento! Você é gentil como sempre! - diz e desvia o olhar.Uau! Essa foi pesada! Eu tenho que fazer algo para mudar esse mal humor.

- Então, aproveitando que a família toda está aqui, eu quero contar uma coisa muito boa que aconteceu hoje. - digo e papai grita um palavrão em espanhol.

- Aquele moleque miserável aprontou de novo, não foi? - ele pergunta e começa a planejar a morte de Caleb.

- Não, pai. - digo rindo dele - Eu descobri um que tenho um parente vivo aqui. Meu bisavô, Louis La Simon.

- La Simon? - tia Vee repete - Eu conheço alguns La Simon! São meus vizinhos lá em Paris. Mas a maioria mora em Saint-Emilion. - ela conta e eu sinto as lágrimas se acumulando nos meus olhos - São pessoas muito legais! A Rebecca, minha vizinha, cozinha divinamente e sempre me dá geleias, biscoitos, pães e outras gostosuras que ela faz na cozinha dela. E os filhos dela são umas coisas fofas que sempre iam brincar lá em casa com Vincent.Sinto uma euforia crescer dentro do meu peito. Minha família está bem aí... Eu posso conhecê-los!

-Tia Vee? - chamo sua atenção interrompendo seu devaneio sobre como tio Vincent cozinhava mal - Pode entrar em contato com eles?

- Claro, querida! - ela diz e tira o notebook de dentro da mochila colorida que está em cima do balcão da cozinha - Posso fazer uma chamada em vídeo para você.

Olho para meus pais e eles parecem desconcertados. Acho que pensam que eu estou traindo eles.

- Não pensem que isso é uma traição, por favor! - peço enquanto tia Vee digita algo no computador - Eu só quero conhecê-los. Passei tanto tempo acreditando que era a ultima da minha família... sentindo um peso no meu coração e agora... Saber que existem mais deles eu me sinto mais leve e menos sozinha.

- Está tudo bem, filha. - papai diz com um sorriso fraco - Eu só estou... um pouco chocado. Eu procurei tanto pela sua família antes de te adotar. Eu não encontrei ninguém!

- Eu sei, pai! - digo e ele me puxa para um abraço - Eu sei o quanto você e a mamãe fizeram por mim.

Tia Vee começa a falar em francês e ouço uma mulher responder. Papai me solta e eu me apresso a ficar do lado de tia Vee.

- Rebecca, está é Nerissa. - ela diz e a mulher na tela do computador, uma morena de nariz arrebitado, olhos castanhos e lábios finos, sorri para mim - Achamos que ela pode ser parente do seu marido.

- Marcel? - Rebecca chama e fala algo em francês que eu não entendo.

Instantes depois um homem grande e loiro, de grossas sobrancelhas e mandíbula angular, aparece na tela. Seus olhos são de um azul claro idêntico ao do vovô La Simon e seu sorriso se parece um pouco com o meu.

- Bonjour! - ele diz meio tímido - Hum... Desculpe. Olá! Eu sou Marcel La Simon, minha esposa me disse que você pode ser minha parente.

- Ah, sim! - digo acordando do transe em que estava ao observar as semelhanças entre nós. - Eu sou Nerissa Romero, nascida Simons. Uma variação do sobrenome La Simon. Sou neta de Louis La Simon mas só descobri a família a pouquíssimo tempo.

- Acho que tínhamos um Louis na família. - ele diz e franze as sobrancelhas como eu quando estou pensando - Ele é irmão da minha bisavó Narcisa. Outro dia fomos visitá-la e ela lembrou dele. Mas pelo que sei ele parou de dar notícias a anos e nós achávamos que ele havia morrido.

- Não, não. - digo e sinto uma lágrima escorrer pelo meu rosto. - Ele está bem. Aconteceram várias coisas e perdemos contato. - digo e queimo meus neurônios pensando num jeito de comprovar se somos mesmo família - Você tem como fazer sua bisavó participar de uma chamada de vídeo como essa? - pergunto e ele assente - Ótimo! Você faz isso e eu levo meu computador para vovô Louis participar também. Assim eles podem se ver e saberemos se somos mesmo parentes. - falo e ele começa a rir - O que foi?

- Você é mesmo uma mulher La Simon! - ele diz ainda rindo - Todas as mulheres da nossa família são bem autoritaire.

- Autoritaire? - repito e ele assente.

- São mandonas. - Ele explica rindo - Todas elas gostam de mandar nos homens.

Continuamos conversando e ele me conta como sua, talvez nossa, família é grande. Nem sei dizer quanto tempo ficamos conversando, mas Caleb aparece e ao me ver conversando com Marcel ele fica visivelmente enciumado. 

- Então, Marcel, eu vou te mandar meu número de celular. - digo e vejo a carranca de incredulidade e revolta de Caleb pelo canto do olho. - E aí vamos mantendo contato, tudo bem? 

- Oui, Nerissa. - Marcel responde sorrindo - Jusqu'à plus tard! - diz e encerro a chamada.

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