"Boys Don't Cry"

48 3 4
                                    

Capítulo 12

    Quando as coisas não nos cabem, forçá-las somente nos causará sofrimentos desnecessários.    Entender isso requer uma habilidade que leva muito tempo aos jovens de nossa era e de qualquer outra.

    Júlio não conseguia aceitar o fato de ter sido rejeitado pelo primo. Desde que ele entrou no carro do primo e este o levou até o metrô mais próximo, Júlio não conseguia parar de pensar que havia estragado tudo. Estava confuso, ansioso e cheio de decepção. Em casa, ele não viu o César e trancou-se em seu quarto, de onde não saiu até a manhã seguinte, bem tarde. 

    Sua noite foi perturbada por pensamentos discordantes. Uma parte soltava impropérios contra o primo por tê-lo rejeitado, mas a outra parte um pouco mais poderosa, derramava-se em auto-culpa por ter botado tudo a perder, mesmo tendo consciência de que não havia feito nada demais. Talvez acreditasse que fosse haver uma amizade colorida com o primo, ou um elo mais forte seria criado e eles poderiam, quem sabe às escondidas, manter um relacionamento juntos. Por fim dormiu, simplesmente devido àquele cansaço mental. 

    Pela manhã o primo mandou-lhe uma mensagem, que quase aliviou a tensão da noite anterior, mas só serviu para cimentar o que seu lado racional já sabia. O extenso texto dizia não ter nada contra o primo, mas que ele não se sentiu confortável após o seu orgasmo, sentia-se confuso por ter virado "viado", preocupado com sua reputação, debatendo-se com seu eu interior. Júlio achou de tudo aquilo que leu uma merda de uma desculpa esfarrapada, mesmo que tentasse entender durante o resto da manhã, como estas coisas poderiam se dar na mente de um rapaz heterossexual; e por fim, foi se convencendo da possibilidade de haver verdade nas palavras do primo e respondeu com uma mensagem curta mas complacente. 

    César não conseguia aceitar o fato de ter brigado com o Márcio no ambiente de trabalho, e ainda por cima na frente de todo mundo, incluindo o chefe. Sua culpa atirava-lhe flechas por diversas razões: Sua sacanagem com o amigo, um dos únicos do trabalho, foi a principal delas. Juntamente com o fato de ter mentido, de ter ignorado ambos os amigos e ainda por cima ter se desentendido com aquele que morava consigo. Seu sono foi interrompido várias vezes, acordava atordoado e mal sabia onde estava, e voltava a dormir sem nem perceber, até que finalmente o sono lhe abandonou às seis da manhã. 

    Logo sentiu que sua testa estava dolorida no canto superior direito, seu olho também não parecia bem. Seu peito, suas costas e ambos os braços e ombros estavam em consonância com a dor geral. 

    "Devia estar muito mais dolorido ontem, mas ainda bem que consegui chegar a salvo em casa". Refletia olhando para o teto com pouca claridade. "Por que fui inventar de ir no centro? Poderia ter perdido minha mochila ou meu celular, aí sim eu estaria muito fudido. E ainda por cima não consegui pegar minha farinha. Droga!" a pitada de tentação foi instalada. "Uma simples indireta foi motivo pra disparar nele algum gatilho de ódio contra mim? Acho que não. É, ele já sabia. Como ele soube? Filho da Puta covarde, me pegando desprevenido." Entretanto, esse pensamento não se sustentou por muito tempo. "Puta merda, como é que vai ficar o clima entre a gente? E no restaurante como um todo? Já perdi dois dias e... Já era… Provavelmente perdi o emprego também. Mas, se eles tiverem câmera naquele corredor, poderão ver quem começou a briga e punir o culpado justamente. No meu caso, foi legítima defesa." 

    Estes pensamentos deram voltas e voltas, como num carrossel, apenas mudando as palavras, as desculpas, as razões. Conclusões eram poucas numa mente agitada como a do César. 

*

    César levantou-se quando tudo já havia clareando, e saiu do quarto... Parou no meio da sala observando uma leve bagunça aqui e ali. Pegou a garrafa térmica de cima da geladeira e se serviu de uma xícara de café. Fez careta quando provou, estava frio. 

Júlio & César (1ª Temporada)Onde histórias criam vida. Descubra agora