EU CONTRA O MUNDO

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Quando a noite chegou nós estávamos reunidos com toda aldeia a volta da fogueira. Conseguia sentir a quentura
das chamas, o som de mulheres a cantarem. Guerreiros haviam voltado da caça e nós celebrávamos pela comida daquela noite. Era costume fazermos sempre isso. A música parou e ouvi a voz de meu pai soar no meio do nada.

— Oremos a Oxóssi, nosso Deus! Por essa carne de caça.

Fechei os olhos. Minha mãe estava no meu lado segurou minha mão e começamos a orar em forma de coro todos a volta da fogueira.

“ Meu pai Oxóssi! Vós que recebestes de oxalá o domínio das matas, de onde tiramos o oxigénio necessário a
manutenção de nossas vidas durante a passagem terrena, inundai os nossos organismos com a sua energia, para a cura dos nossos males. Vós que sóis o protector dos caboclos, dai-nos a vossa força, para que nos possa transmitir toda a pujança, a coragem necessária para enfrentar-mos as dificuldades a serem superadas. Dai-nos paz de espírito, a sabedoria que possamos compreender a perdoar aqueles que procuram nossos centros, nosso guia, nosso protector.
Dai-nos paciência para suportarmos aqueles que se julgam os únicos com problemas e desejam merecer das
entidades todo tempo e atenção possível, esquecendo-se de outros irmãos mais necessitados. Dai-nos tranquilidade para superarmos todas as ingratidões, todas as calúnias.
Dai-nos força para repelir aqueles que desejam vinganças e querem a todo custo magoar seus semelhantes.
OKE ARÔ OXÓSSI!”


Um barulho de alegria reinou o local. Aderi ao barulho, o barulho que transbordava felicidade. Oxóssi era o meu orixá favorito e o mais adorado em minha aldeia. O orixá da caça,
nosso grande protector. A noite ficava mais fria consoante o tempo passava, o barulho dos batuques e som lindo dos chocalhos tornaram-se os sons mais lindos daquela noite.


Na manhã seguinte… Acordei enquanto o mundo ainda dormia. Estava tão ansioso que não consegui dormir direito, coloquei a mão na parede de meu quarto e ela começou a me guiar pela casa.
Ainda arrastando a mão pela parede consegui chegar até o local que minha mãe descrevia como sala. Minha mãe deixava sempre a minha bengala no mesmo lugar “encostada a parede a esquerda” me aproximei dela, apalpei-a e coloquei minhas mãos nuas sobre ela. Com a bengala é muito mais fácil caminhar. Fui até a mesa e sentei na cadeira que estava próxima a ela. Fique lá sentado durante muito tempo, a espera que meu pai acordasse.

O tempo passava os galos começaram a cantar. Presumo que o sol estava a dominar a sala e meu coração
batia cada vez mais depressa. Eu estava ansioso, estava prestes a dar o primeiro passo para realização do meu sonho. Coloquei um sorriso no rosto só de pensar no quanto seria
divertido e surreal ser treinado para ser um guerreiro, mas será mais surreal participar do torneio do guerreiro das sete flechas.

— Qual é a graça? — Ouvi uma voz perguntar. Eu nem tinha ouvido ele chegar, era a voz do meu pai.

— Eu vou ser um guerreiro, essa é a graça pai. — Voltei a sorrir.

— Não podemos esperar a tua mãe filho, levanta e vamos logo.

Ele segurou minha mão e começamos a caminhar. Notei que saímos de casa pelo barulho do lado de fora. Pássaros, pessoas as conversa, o que me deu a entender que já havia amanhecido.

Durante nossa caminhada eu pude ouvir vozes de pessoas a saudarem meu pai. Sendo ele o líder de nossa
aldeia é normal isso acontecer. Eu não conseguia ver por onde passávamos apenas ouvir o barulho das coisas ao meu redor. Senti a velocidade do andamento de meu pai abrandar e de repente paramos.

KELLANOnde histórias criam vida. Descubra agora