Capítulo 23 - Gaspar

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(Mía narrando)


— Não acredito que você aceitou! — Minha amiga soou irritada atraindo os olhares de algumas garotas da mesa ao lado.

Estávamos no refeitório, 7:30 da manhã de uma quarta feira, em meio a vários alunos. A mesa lateral do refeitório nos abrigava enquanto eu comia meu sanduíche e explicava pra Zoe minha conversa com Gaspar na noite anterior.

— Fala baixo! — Pedi, vendo seu rosto se retorcer em uma careta.

— Será que eu preciso te lembrar que ele é um traidor? — Perguntou, ignorando meu pedido.

— Não precisa. — Dei um gole no suco, sendo fulminada pelo olhar mortal de Zoe. — E para de me olhar assim.

Ela balançou a cabeça contrariada, encostando as costas na cadeira e tirando seus olhos dos meus.

— O que ele fez não tem perdão.

— Zoe! — Inclinei meu corpo pra frente chamando sua atenção. — Olha pra mim, amiga. — Ela me encarou com cenho franzido como se estivesse com dor. — Você não precisa ter raiva do Gaspar só porque ele fez aquilo comigo.

— Ele também me magoou, Mía.

— Eu sei. — Mordisquei o lábio. — Mas também sei que ainda gosta dele.

— Não gosto não.

— Gosta sim, se não gostasse não teria dado um fora no coitado do Rulo depois do segundo encontro. — Eu disse divertida tentando fazê-la sorrir, mas não funcionou muito. — Eu amo que você se preocupe comigo, amiga.

— Mas...?

— Mas eu também me preocupo com você e também quero vê você feliz.

— Ele é um babaca que só se preocupa consigo mesmo, como eu posso ficar com uma pessoa assim, Mía?

— Ele não é assim.

— Como você ainda consegue defender ele?

Suspirei, colocando uma mexa de cabelo atrás da orelha. Conforme os minutos se passavam o refeitória enchia mais.

— Eu não sei. — Respondi sincera. — O Gaspar é meu amigo de infância e eu sempre vou amar ele, independente de qualquer coisa.

Ela não disse nada, em vez disso, seu olhar estacionou em algo atrás de mim, encarando com o semblante com um misto de raiva e mágoa. Virei o rosto vendo Gaspar se aproximar da nossa mesa e no segundo seguinte Zoe já estava de pé.

— Bom passeio pra vocês.

— Zoe... — Chamei, em vão.

Meu melhor amigo se aproximou. Ex melhor amigo. Sei lá.

— Ela me odeia, não é?

— Não, ela só tá... — Parei de falar tentando encontrar uma palavra certa. Sem sucesso.

— Tá tudo bem, eu entendo. — Ele levantou os ombros, soltando-os de uma vez. — Podemos ir?

— Sim! Só preciso deixar as bandejas. — Disse pegando minha bandeja e de Zoe e deixando na bancada e aproveitando para mandar uma mensagem para Álvaro.

Eu: espero que tenha amanhecido melhor

Eu: estou indo conversar com o gaspar, quando eu voltar passo por ai, bj

Quando retornei, caminhamos até a saída do refeitório. O tempo estava agradável naquela manhã o que me possibilitou usar uma camiseta sem casaco por cima, mas por via das dúvidas o mesmo permanecia amarrado na minha cintura. Sentados próximo ao lago, Lupe e Bernardo conversavam assim como na noite anterior. Não entendia o que eles estavam falando, mas devia algo algo bom pois Lupe não tirava o sorriso dos lábios. Não sabia ao certo mas algo estava rolando entre eles e eu estava feliz, minha irmã merecia ser feliz.

Gaspar e eu caminhamos em meio a um silêncio um pouco desconfortável, mas o que eu queria, afinal? Que tudo voltasse a ser exatamente como antes? Isso era um pouco impossível. Seguimos a trilha que levava para trás do refeitório, escutando os pássaros cantarem enquanto voavam de um galho par outro. Sorri quando um pousou bem na nossa frente, bicando o chão com rapidez.

— Devagar! — Ele disse baixo, desacelerando o passo.

Fiz o mesmo, sorrindo com empolgação. O pássaro parou de bicar o chão nos observando com curiosidade, sua cabeça inclinada para o lado. Ele era tão bonitinho, cinza com listras amareladas. Ele deu alguns passos em nossa direção nos fazendo parar de vez.

— Ele é tão bonitinho. — Murmurei, sorrindo largamente.

E como se fosse sensível ao menor ruído, ele bateu as asas voando para longe deixando Gaspar e eu terminar nosso trajeto. De longe, vi a árvore gigantesca com . Não consegui conter o sorriso enquanto nos aproximávamos.

— Gostou? — Perguntou com expectativa.

— Sim! É lindo!

Sentei no balanço sob seu olhar. Coloquei o pé no chão pegando impulso e tirei me balançando de um outro para o outro.

— Posso te perguntar uma coisa?

— O que quiser.

— Você ainda gosta da Zoe?

Gaspar abaixou a cabeça chutando uma pedrinha que estava no chão. Minha resposta não veio de imediata e eu também não fiz questão de repetir, talvez esse assunto foi difícil pra ele, mais do que eu imaginava.

— Gosto! — Ele confessou, em um murmurio. — Mas a coisa toda é complicada demais.

— Ou é a gente que complica. — Rebati, meu corpo ainda voando de um lado para o outro. O olhar de Gaspar retornou para mim. — Você tinha a garota e acabou deixando ela ir.

— Você também terminou com o Álvaro, ou não?

Soltei uma risada divertida.

— É! Talvez eu e você sejamos iguais.

— Não foi isso que eu quis dizer. Só que... Eu tava passando por um período difícil quando comecei a namorar com a Zoe. Eu queria muito ter entrado para o Saint Mary, Mía. Muito mesmo. E quando rolou toda aquela confusão com meus documentos eu fiquei abalado.

— E acabou descontando tudo na Zoe...

— E em você.

Por aquilo eu não esperava. Coloquei os pés no chão parando o balanço de uma vez.

— Eu fui um idiota do inicio ao fim e eu sinto muito. Sei que isso não é suficiente, mas eu quero muito ficar de bem com você, com a Zoe. Sinto muito sua falta.

Mordi o lábio sentindo algumas gotículas de água se formarem nos cantinhos do meus olhos e eu quis gritar. Me levantei.

— Você não tinha o direito de me machucar como machucou. — Sussurrei com um enorme nó na garganta.

— Eu sei, eu fui um idiota. Mas me dar uma chance, te prometo que vou fazer tudo certo dessa vez.

Senti uma lágrima traiçoeira descer por minha bochecha e então rompi a distancia entre nós, me aconchegando em seus braços.


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