Prólogo

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Ela chegava pontualmente as 19h36 no Starbucks. As vezes se atrasava 10 minutos mas nunca mais que 10 minutos e fazia sempre o mesmo pedido: Choco Chip Frappuccino. Sentava próxima a porta de vidro sempre sozinha com algum livro e ficava até as 20h30, 20h45. Eu já tinha decorado todos seus movimentos desde que percebi que ela vinha ali com a frequência de quem mantinha uma rotina e gostava disto. Ela se tornou o meu momento favorito do dia e eu passei a esperar ansiosamente por "L".

Kara Danvers P.O.V:

Já faz 3 meses desde que me mudei para National City. Eu nunca estive tão longe de Smallville, pra ser mais precisa a 600 km distante dos limites da pequena cidade.Não foi fácil chegar até aqui, depois de muito argumentar, discutir, dramatizar e jurar para minha mãe que voltaria para casa se tudo desse errado eu finalmente estava em National City, a cidade mais barulhenta e hostil da America. É claro, ocultei essas impressões da minha família, como também  escondi que fui assaltada assim que cheguei, também não mencionei que não morava mais com minha irmã mais velha. Apesar de não estar na melhor cidade do mundo posso dizer que tive alguma sorte, além de ter conseguido um apartamento mobiliado financeiramente  acessível depois de ter ficado algumas semanas com Alex e a namorada,  também consegui um emprego no Starbucks. O salário não era ruim, eu podia tomar todo o café que aguentasse e também podia olhar descaradamente  a mulher mais linda que já tinha visto. Não só linda, lindíssima, não era exagero ser superlativa, era o tipo que você compara com deidades mitológicas, o tipo que te demove do seu lugar comum e te coloca de frente a algo de tirar o fôlego. Eu era uma filha da puta sortuda demais só por poder olhá-la por alguns minutos. No entanto, eu não sabia como ela se chamava, sempre que perguntava qual nome deveria escrever no seu copo de frappuccino, ela dizia "L."  A maioria dos clientes apressados ignorava e passavam em branco, alguns usavam seus apelidos, os mais jovens escolhiam ser chamados por algum personagem, Supergirl, Naruto, Harry Potter, Poison Ivy entre tantos outros.

Mas L... tinha milhares de possibilidades. Lucy? Lauren? Lizzie?

- Pode ser L de lésbica. - Uma vez Nia comentou.- Tente isto, quando ela vir até aqui escreva Lésbica em vez de L. O máximo que pode acontecer é ela dar meia volta e jogar o frappuccino na sua cara, será uma interação. Você olha esta mulher a dois meses e nem se quer sabe o nome dela.

A única vez que trocamos mais de duas palavras além do "O de sempre, por favor", "Aqui está" e "Obrigado" foi quando tive a ideia ridícula de tentar chamar sua atenção e passei um batom vermelho. Quando ela chegou deixei escapar aquele sorriso bobo que ela sempre me tirava. "L." olhou demoradamente para minha boca e ergueu uma das sobrancelhas. Estava dando certo, pensei. Mas logo que pagou o pedido, se aproximou do caixa e me disse baixinho.

-O seu dente está sujo.

Grande dia, inesquecível. Sempre que me recordo volto a experimentar aquela sensação vergonhosa que fez meu rosto queimar. Ainda me vejo dando as costas para ela e esfregando um dedo no dente sujo de batom.

                            ×××

Olhei mais uma vez para o relógio colado na parede. 19h32. Havia poucas pessoas no Starbucks, apenas algumas adolescentes tagarelando. Minhas mãos suavam, minha cliente mais atraente chegaria em alguns minutos vestida em um terninho sexy e eu não conseguia disfarçar o nervossísmo. Era sempre assim, aquela mulher me deixava inquieta o dia todo.

- Você deveria dar o seu número de telefone para ela. - Sam chegou sorrateiramente me pegando distraída olhando para a porta e me fazendo saltar assustada.

- Quem?

- Não se faça de desentendida Kara Danvers. Estou falando da que pede para ser chamada de L., da morena de incríveis olhos verdes que você tomou para si e não deixa nem eu nem Nia atender.

- Isso é tão, tão, tão... absurdo. Aquela mulher veste Armani e eu sou só uma atendente padronizadamente uniformizada... Qual são as chances dela querer sair com alguém como eu?
- Nenhuma se você não fazer nada mas suas chances podem subir consideravelmente se você não deixasse a timidez te paralisar.

- Ela riria alto da minha cara pelo atrevimento e nunca mais voltaria...
- Não se dê por derrotada antes do jogo começar  e se quer saber acho que isto não  a afetaria tanto a este ponto. Você não perde nada por arriscar. Vai lá, tenha coragem uma única vez na vida, você pode se surpreender...  - E apontou para porta. L. acabava de entrar.

Ela estava linda mas isto não era novidade, eu só me perguntava como era possível alguém ficar cada dia mais bonita. Os cabelos pretos soltos levemente ondulados, o terninho escuro e a camiseta branca desabotoada o suficiente para a curva dos seus seios estar visível, os olhos verdes mais acesos que costumeiramente e aquele gingado que deslocava o pescoço de todo mundo.

- Olá, o de sempre por favor.

Ela retirou um livro da bolsa tiracolo e antes de me virar para fazer seu frappuccino consegui ler o título. Garota Exemplar. Não sabia que ela gostava deste tipo de literatura mas o que eu sabia sobre ela? Só que era uma grande gostosa, riquíssima, de hábitos regulares e que tinha uma bunda de outro planeta.

Escrevi o L. no centro do copo e a caneta resvalou trêmula por  um pensamento que me ocorreu de repente. E se eu deixasse o meu número de telefone ali?

- Eu já estou ferrada mesmo. – E finalizei o que tinha começado.

Ela pagou depois de pegar seu frappuccino e foi se sentar no lugar rotineiro. Acompanhei seu mover de quadris e num lapso recuperei o senso que tinha me fugido. Pensei em correr para ela e dizer que havia errado a bebida ou quem sabe esbarrar propositalmente para fazê-la derrubar o copo. Eu tive mesmo coragem de dar o meu número para aquela mulher? Talvez ela nem notasse... mas assim que se sentou e deu o primeiro gole olhou confusa para o copo e depois se voltou para mim com uma expressão indecifrável e aquele olhar arqueado...

Mas que porra eu tinha feito?

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