Afraid

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(Frank)

Acordei em um espasmo agressivo ocasionado por um som de trovão alto que reverberou todo o quarto. Eu não sei o quanto dormi, mas foi o suficiente para que o tempo se fechasse por completo e a chuva finalmente se fizesse presente lá fora.

A manhã e início de tarde ensolarada haviam dado espaço para uma tarde chuvosa.

O fone ainda permanecia preso ao meu ouvido e ao de Gerard, que ainda jazia sereno como antes, de barriga pra cima e com uma das mãos em cima de si e a outra escorregando pela lateral do seu corpo, parando no pequeno espaço entre nós dois e o colchão. Supus que ele estivesse dormindo, pela respiração bonançosa e seu rosto todo calmaria. Apoiei-me nos cotovelos, o suficiente para que pudesse me espreitar e olhar melhor o seu rosto. Agora que eu estava próximo o bastante em um momento não tão caótico como os anteriores, pude notar o quanto suas feições eram mais delicadas e diferentes que as de Mikey. O formato do seu queixo não era tão pontudo e fino quanto o do irmão mais novo, e o seu nariz era perfeitamente desenhado, parecia até esculpido, eu diria. Eu não achava que fosse possível alguém parecer tão apresentável enquanto dormia até ver com meus próprios olhos.

– Eu gostaria que você não ficasse me encarando feito um esquisitão. – Sua voz repentinamente áspera e ao mesmo tempo casual me faz saltar de susto uma segunda vez.

– Caralho! Eu pensei que você estava dormindo e... Espera! Como diabos você sabe que eu estava te olhando?

– Eu sempre sei. – Ele decreta com tranquilidade.

– Como?

– É como se os olhares fizessem pressão em cima de mim. Eu sempre sinto.

– Mas que porra. Eu acho que você consegue enxergar.

– De olhos fechados? – Ele questiona, quase chalaceando, e eu apenas estalo a língua em resposta, checando o relógio na tela do iPod entre nós dois.

– Já são quatro da tarde. – O informei, impressionado pelo tempo que escorreu entre meus dedos e eu nem vi.

– Sim, e dai? – ele pergunta com um desinteresse presente.

– Ainda não comemos.

– Não estou com fome.

– Mas eu sim, e de fato não quero descer sozinho. Vamos, eu posso procurar alguma porcaria não-saudável qualquer pra gente comer. – Propus, e agora parecia ter despertado interesse em Gerard que dessa vez abre seus olhos, encarando vários pontos aleatórios do teto, sempre sem focar em lugar algum em específico. Suas orbes estavam muito mais esverdeadas que antes, tomando minha atenção por reles segundos com alguns questionamentos após me dar conta de que seus olhos não possuíam o tom azul esbranquiçado característico de deficientes visuais.

Gerard aceita a minha proposta, levantando-se e seguindo-me até o andar de baixo sempre em silêncio. O tempo todo ele se virava sozinho, apenas caminhando lentamente e tateando as paredes sem sequer usar a sua bengala para deficientes. Ele de fato andava melhor naquela casa do que eu mesmo que podia enxergar tudo.

Gerard se direciona para a sala de estar, me esperando pacientemente sentado no sofá até que eu voltasse da cozinha com um pacote de salgadinhos e duas latas de coca-cola, como eu disse que faria.

E assim de fato fiz, me acomodando ao seu lado, abrindo o pacote e oferecendo a ele, que não demora a aceitar.
Embora silêncio entre a gente não fosse desconfortável como eu pensei que seria, eu ainda sentia vontade de conversar sendo o bom tagarela que sou, entretanto, mesmo com as poucas horas que estivemos na companhia um do outro, era notável o quão reservado ele parecia ser, e logo, decidi não incomoda-lo. Apenas passo a comer os salgadinhos barulhentos, sem incomoda-lo com alguma conversa fiada.

Behind Your EyesOnde histórias criam vida. Descubra agora