CAPÍTULO II - VILMAR

491 57 111
                                    

Vilmar está jogado no sofá. Ele é o atual marido da minha mãe e pai de Helena, minha irmã mais nova. Atualmente está desempregado e passa o tempo em frente à TV vendo futebol e bebendo cerveja. Se bem que nem lembro a última vez que ele conseguiu trabalho. Vilmar é alto, loiro natural, olhos verdes, todo musculoso. Acho que deve ter uns 30 anos. Sempre desleixado, usa bermuda e blusa aberta exibindo o abdômen como sinal de virilidade. Está sempre com a barba por fazer.

Vou direto para o banho antes que ele me aviste. Faço o possível para não chegar perto dele.

Meu banho é interrompido pelos gritos de Heitor:

- Páris, vou fazer um trabalho na casa dos amigos. O almoço tá pronto, arruma a casa e cuida da Helena.

- Tá certo! – grito - Que horas você volta?

- À hora que terminar o trabalho.

E ouço a porta batendo.

Ao sair do banho, vejo que Vilmar ainda está assistindo ao jogo de futebol na TV, então resolvo almoçar no quarto. Depois que Heitor o enfrentou, ele também tem me evitado, o que torna minha vida um pouco melhor.

Quando criança, eu era diferente dos outros meninos do bairro, não gostava de futebol, nem curtia violência. Preferia quadrinhos, livros e animes. Sempre fui educado com todos e, por ser muito fraco, virei motivo de piada entre os moleques do bairro. Motivo pelo qual não tinha amigos e passava cada vez mais tempo sozinho em casa.

Vilmar diz até hoje que isso não é coisa de "macho" e, naquele tempo, começou a me espancar "para aprender a ser homem". Dizia que umas pauladas iam me consertar.

Minha mãe nunca soube, é claro, e todas às vezes eu criava uma desculpa diferente para os machucados. Mesmo se eu lhe contasse, não acreditaria. Na frente dela, Vilmar sempre me trata muito bem e a faz acreditar que ele se preocupa comigo, até presentes ele já me deu.

Do contrário, Heitor começou a desconfiar quando o repertório de desculpas ficou menor que os hematomas. Um dia Vilmar quebrou meu nariz e tive a péssima ideia de dizer que foi jogando bola. Mas meu irmão sabe que não jogo futebol. Então, no ano passado, Heitor chegou mais cedo do trabalho e viu Vilmar me batendo com o cinto por eu ter deixado uma cerveja cair. Com seus 16 anos, o garoto foi pra cima dele e tomou o cinto. Eu corri para o quarto e só consegui chorar. Quando minha mãe chegou, Vilmar mostrou a ela um cigarro de maconha afirmando que havia encontrado em nossas coisas, disse que nos bateu por causa disso e nos colocou de castigo. Tentamos falar a verdade, mas a mãe achou que era mentira para sair do castigo. A partir desse dia, Heitor e Vilmar não se falam mais. Assim, meus espancamentos diminuíram e minha mãe nunca soube a verdade.

Almoço, arrumo a casa e vou ajudar Helena com a tarefa. Ela é filha de Vilmar, então é minha meia-irmã, assim como Heitor. Quando o pai dele morreu, por causa de um acidente no trabalho, ele ainda não tinha nascido. Algum tempo depois, minha mãe conheceu meu pai, que a abandonou quando ainda estava grávida de mim. Tempos depois apareceu Vilmar.

- Como foi seu primeiro dia de aula? - pergunta Helena me trazendo de volta à realidade.

- Foi legal. E o seu?

- Foi muito bom. Minha professora é muito legal e conheci muitos amiguinhos. Você fez novos amigos?

Imediatamente me lembro do garoto que sentou à mesa comigo. Tenho a sensação de que algo me intriga e eu não sei o que é.

- Acho que sim! - respondo para Helena.

- Que bom! Tomara que você tenha muitos amigos nessa escola nova. – ela fala abrindo os braços.

O Renascer De PárisOnde histórias criam vida. Descubra agora