P O R Q U E S A L V A R É U M T A L E N T O

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Visto uma blusa preta que me aquece o suficiente junto a uma calça da mesma cor e botas de cano longo enquanto acompanho Charlezie e os outros seguranças pelo jardim. Lanço um breve olhar a Aaron que vem mais afastado, não sei sua opinião sobre isso, me pergunto desde a conversa de ontem se ele vai mesmo abandonar os sentimentos que nutre por mim, é tão fácil assim? Você desfaz as escolhas que fez pelo amor quando ele não parece sincero o suficiente? Amor não vai além da sinceridade? Amor não deve ser o que perdoa o que não parece capaz de ser perdoado? Engulo a seco me voltando a Charlezie, ela está mais fria que o normal, e por mais que sua decisão tenha lógica algo não está sendo dito. Algo sempre deixado nas entrelinhas, essa é a mulher  que me concebeu, um espelho que reflete a mim mesma. Uma forma de me ver cruel. Mas que posso suportar.

Estamos indo a empresa, Charlezie me apresentará a todos como a noiva de Hyun, uma francesa de família discreta que se casará com um dos grandes acionistas, se eu não me tornar visível para o mundo dessa forma será difícil explicar porque nosso casamento será em sua mansão, temos que parecer próximas. De forma alguma esse casamento pode não ser destacado, o plano dela depois do meu sim é me manter presa a Hyun em convenções sociais como festas nas quais ela passa o poder que acha que tem sobre mim para ele.

Nos sentamos juntas no carro, desde que sou criança essa é a vez fora suas eventuais repreensões físicas na qual estamos mais perto uma da outra. Ela tem o cheiro da minha infância, no qual achava que ela era só uma funcionária de Sophie, jasmin fresco, depois que descobri na noite das escadas quem ela era passei a não suportar esse aroma. Mexo minha mão e a pego olhando meu anel. O floco de neve, ela estava lá, quando aprendi a patinar, Charlezie esteve em todos os momentos da minha vida, parte de mim tenta ignorar isso. Recolho a mão para meu colo engulo a seco e resisto a vontade de encará-la.  

As paisagens surgem com o passar do tempo, sem a permissão dela baixo o vidro sinto o vento em minha pele, não quero provocações hoje, odiá-la toma tanto esforço de mim, e hoje só quero ser consumida pela saudade, porque vou visitar o que era de Sophie.

Charlezie não liga para o sol, para o ar, para nada além dela mesmo, isso me dá esperança, me faz quase sorrir. É o que me faz diferente dela, capaz de ser melhor, ela me deu esse corpo, Sophie me deu parte da sua alma. Fecho um pouco dos meus olhos, ouço os elogios de Sophie, o tanto que me amava, Sophie sorrindo. Sophie sempre sorria. Então abro os olhos. 

Quando paramos o veículo em frente a empresa multimilionária somos escoltadas pela frota de homens que protegem o segredo de Charlezie, se eu arriscar qualquer movimento terei que pagar. Aaron ajusta sua escuta fazendo contato visual com os outros enquanto sigo Charlezie sem que ela me peça isso, sou rápida em fingir que obedeço comandos. 

Não tropeço em meus saltos nem por um segundo, não baixo a cabeça para nada que é meu, apenas observo, e sou observada também porque logo que adentramos ao edifício ouço murmúrios dos funcionários se perguntando quem sou, alguns falando sobre minha beleza, flagro Aaron sorrindo para si mesmo, como se isso fosse uma piada que só ele entendesse. Queria  nossa conexão de volta, queria que ele me entendesse sem que eu falasse, queria entendê-lo sem que ele falasse.

Hyun que já chegou me cumprimenta com um beijo no rosto, forço um sorriso para ele. Noivos, é  o que somo nessa farsa. Ele abraça minha cintura para a surpresa daqueles que nos veem, e então Patrick é o próximo a chegar. Charlie não está aqui, sempre nos bastidores dos planos de Charlezie.

— Vejam só como Hyun é sortudo, se casará com a mulher mais bela que conheci. — os sussurros e fofocas crescem a medida que ouvem o que tem que ser ouvido, finjo me sentir lisonjeada. Como se eu não soubesse, como se eu precisasse de alguém para me dizer o quão bonita sou. Você gostou quando Aaron disse. Minha mente lembra. Porque gosto de tudo que é sobre ele. Me respondo.

Tudo Ou Nada - ConcluídoOnde histórias criam vida. Descubra agora