Ano 693 ( Antes das Posses dos Poderes)
Ano 897 da Idade da Estação em Branco.
Mês Eglestov, o sexto.
Dia dos Gutra, o segundo dia da novena.
A luz do dia tomava seu espaço, irrigando o horizonte com calor e exilando o frio murmurante, assinatura da noite passada. Os passos apressados, as vozes amontoadas e o mormaço dos animais em labor revelavam que Zasturalém despertará. Junto ao reino, uma garota, isolada em seu próprio castigo, banida em solidão restante, abre seus olhos, dois poços de mel selvagem. Ao relento, a garota dormirá mais uma vez. Perderá o número de sonos que ela se permitiu ter sobre pedra ríspida, vizinha do muro mofado e companheira das goteiras incessantes.
Deitada ao lado de seu próprio vômito congelado, a garota maltrapilha já não manifesta revolta dessa viela cinzenta, provida apenas de indiferença. Fedia a álcool e desilusão. Suas roupas refletiam a rotina de seus dias passados, uma mesclagem de desamparo e lamentação.
O rangido da porta da pousada de Lar Tai se alastra para o lado do beco, onde apenas o corpo da mulher lhe presenteia com vida. Sua mente se desperta com violência ao sentir seus músculos rígidos da mão se contraírem em dor febril. Dor qual é o seu lembrete que cada segundo seu é uma gota sobre uma poça de desespero, que consome paz como fogo consome papel.
Sua dificuldade em se levantar tanto pela dor e embriaguez não é sutil ao silêncio do beco, mas ela não se importa, ninguém em Zasturalém se incomoda com mais uma alma abandonada pela esperança. Sua presença adiciona tanto valor para a cidade quanto mais um cisco de pó incorpora o manto de sujeira em uma mobília antiga.
Ela caminha e leva sua mão enfaixada ao seu eixo de batalha. Um machado atraente de dois gumes de aço em prata pálida, de fio impecável, que reflete luz trêmula. Cabo negro como ébano, ornamentado com runas gravadas em um azul gasto.
- Muita força será pouca diante de ti e a sede da brutalidade se apropriará sobre vós - As runas emitem sua mensagem.
A arma era grande para o porte da garota, mas seu peso servia somente á ela, em suas mãos o machado era leve e de fácil manuseio, mas distante de sua posse, a cada metro, um peso incomum caia sobre o machado, três homens teriam dificuldade em levantá-lo se seu aço estivesse fora do alcance de sua portadora.
Empunhou o machado e avaliou sua bolsa de dinheiro, agora magrela como si mesma, alguns keines de madeira para somente algumas bebidas, talvez até a metade das horas de luz*. Seu rumo depois que suas riquezas terminassem era uma dúvida preocupante sem resposta aparente.
Adentrou a pousada pelo quinto dia seguinte. Nelo, o dono da estalagem não se importava com a aparência da menina ou de qualquer um que pisasse sobre seu chão encardido, se o bolso daquele que entrava em seu domínio possuísse mais valor do que em seu coração, sua presença era mais do que ansiada. Um homem de coração vazio sempre vai tentar preenchê-lo com uma caneca cheia.
Nelo encarava Ayven como pirata encara rubi. Tesouro oportuno, raro e melancólico.
Ela se sentou sobre o velho banco já depositando uma moeda no balcão, e em seguida uma caneca fria de Zidrí amarga foi depositada em sua frente.
Logo aquele lugar estaria cheios de corruptos, ladrões, agiotas...escórias de Zasturalém. Lar Tai não era único em servir como antro de imundice, o próprio reino ancião atraía pestilência. A menina sempre pensará na cidade do berço humano como um cadáver que atrai vermes não importa a situação.
"Já foram quatro castelos em cinco dias. O oeste de Zasturalém está em desespero, nunca vi tantos guardas patrulhando a rua no lado nobre da cidade'' Comentou um homem, a outro, entrando na estalagem.
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Vínculo da Ferida
ФэнтезиO chamado prematuro da morte em noites que o frio e o desamparo regem o tempo, se torna mais cortejante que a ceia de um rei soberbo. Uma ferida de dor pérpetua, saciada somente por sangue e brutalidade cria uma alma rígida. O preço da paz é inest...