Capítulo 12 - A Comandante

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Cordélia Velez

Apenas trevas cercavam a bela guerreira de cabelos castanhos escuros, quase negros, pele bronzeada pelo sol e armadura escura, que se misturava com a escuridão à sua volta. Nem a lua ou ao menos uma estrela estava presente no céu, coberto por nuvens de tempestade, para iluminar a fonte dos grunhidos e rosnados ao seu redor, mas ela sabia a quem pertenciam aqueles olhos que brilhavam na escuridão.

"Orcs e worgs..." — Pensa sacando sua espada longa, repleta de símbolos celestiais por toda sua lâmina. — "... já lidei com muito pior."

A calma no rosto da guerreira perante tal situação a tornava quase assustadora demais para que as criaturas nas sombras a atacassem, o vento que trazia a tempestade fazia sua capa negra tremular junto de seus longos cabelos.

— Eu não tenho a noite toda, venham e morram diante de mim. — pronuncia com a mesma calma que manteve até então.

Um trovão ilumina os céus, revelando por um instante dezenas de inimigos a cercando sobre os cadáveres de seus companheiros, e então o vento parou de soprar.

Um worg foi o primeiro a atacar, saltando da escuridão em direção à comandante, que com um único golpe de sua espada, parte o focinho da criatura em duas partes, fazendo com que a criatura agonizasse de dor enquanto sangrava ao seu lado.

E lá ela ficou, sem mover um músculo até o próximo inimigo sair bufando da escuridão direto para sua lâmina, que com outro golpe preciso partiu o cabo do grande machado orc, rasgando seu peito em um movimento limpo.

O segundo trovão foi o arauto da tempestade, que desabou sobre o campo de batalha, incitando os orcs a fazerem o mesmo contra a guerreira, worgs à frente, cercando e rosnando enquanto os orcs esperavam a brecha para dar o golpe fatal.

Mas ela sabia melhor do que se deixar ser cercada, tão rápido quanto os inimigos avançam contra a comandante, ela avança contra o lado com menos oponentes, iluminando sua espada com energia arcana, fazendo com que as runas de sua lâmina brilhassem ao ponto de forçar os inimigos a desviarem o olhar por um instante, e isso era tudo que ela precisava.

Os orcs olhavam pasmos para três de seus companheiros e mais um worg caídos frente à pequena humana, que se virava lentamente para eles enquanto mais um relâmpago iluminava o acampamento, arrasado pela emboscada orc.

— Vocês pagarão pelo que fizeram aqui. — Avança em direção aos inimigos, agora todos à sua frente.

O último dos grandes lobos avança em direção da guerreira, liderando a investida dos bárbaros.

Cada movimento da comandante era preciso e fluido, o sangue dos inimigos se misturava com a chuva torrencial que caía naquela noite, nunca deixando de avançar, sempre cortando o caminho até o fim da horda e então, ela alcançou o outro lado.

A luz que a espada emitia foi esvaecendo conforme a guerreira recuperava a respiração. Ela olha por cima de seu ombro para verificar a fila de criaturas mortas por onde havia passado, mas todos haviam desaparecido.

O próximo relâmpago ilumina a horda a cercando novamente, mas dessa vez eles avançam sem hesitar, fazendo com que a comandante precise se defender de todos os lados ao mesmo tempo. Porém a fúria dos orcs lhes concedia um peso brutal a cada golpe, e mesmo a grande habilidade da guerreira tinha limites, até que o primeiro golpe do machado conecta contra sua armadura, arremessando-a no chão enlameado e coberto de sangue.

"Eu nunca perco."

Um pulso de energia é emitido pela mão da comandante caída, arremessando a multidão ao seu redor de volta para a escuridão, lhe dando a chance de se levantar e voltar à ofensiva cortando inimigo após inimigo.
Rugidos de fúria e berros de dor eram encobertos por trovões e disparos no horizonte, logo seus reforços chegariam, mas ela deveria lidar com isso antes, golpe após golpe, em uma rajada de morte envolta na escuridão de uma tempestade.

Até que havia apenas silêncio e sangue em suas mãos, ela olha ao redor e vê um grupo de nobres a observando com pavor nos olhos, sem entender observa sua espada que estava cravada no peito de um jovem garoto de cabelos loiros e olhos verdes, já sem brilho.

— Eu... ele não... ele deveria ter se defendido! — Ela diz com um aspecto muito mais jovem e indisciplinado do que tinha a alguns instantes atrás.

— O que você fez, Cordélia?! — O nobre de cabelos castanhos curtos, pele tão bronzeada quanto a da menina e um olhar furioso grita se aproximando dela.

— Pai, eu nunca quis isso! — Ela diz o encarando.

Um golpe rápido e forte com a manopla no rosto da jovem a joga de joelhos ao lado do garoto que havia matado. Um pequeno, mas fundo corte em sua maçã do rosto deixa escorrer seu sangue quente até seu queixo, seguido por uma lágrima.

— Cordélia, você nos arruinou!! — Ele grita.

— Executem-na!

— Ela deve pagar!

— Cordélia! Cordélia!

As vozes se misturavam com a chuva e o barulho dos cavalos e a marcha dos soldados, até que apenas restou uma voz.

— Cordélia? — Um homem negro, com olhos azuis claros, quase brancos e vestindo um manto azul diz gentilmente — Você estava tendo outro pesadelo.

Ela reconhece o interior de sua carruagem e Mikael, seu conselheiro e amigo. E respira aliviada, era um pesadelo, não uma memória.

— O que foi dessa vez? — Ele pergunta.

— A emboscada no acampamento da décima nona legião. — diz olhando a estrada pela janela.

— Seu comandante e legião caíram na emboscada e apenas você sobreviveu, aquela noite lhe rendeu seu posto de comandante, certo?

— Me fazer falar sobre isso não vai apagar da minha cabeça. — desconversa.

— Mas ajuda dividir o fardo, a mente humana faz parte dos meus estudos e...

— Além daquela noite também era o dia do meu noivado. — Cordélia interrompe o mago, levando a mão até a pequena cicatriz em sua maçã do rosto.

— Quer falar sobre isso? Todos sabemos a história, mas você nunca fala sobre.

— Não tenho o que falar, vocês sabem o que aconteceu e nada que eu diga vai fazer parecer menos terrível.

— Faz muito tempo.

— Quinze anos, quinze anos desde que eu matei pela primeira vez e fui condenada a servir no fronte. — Ela diz, quase abismada com o tempo.

— E nesse tempo você construiu uma carreira, se tornou comandante de uma legião e nunca perdeu uma batalha. Você tem muito do que se orgulhar.

— Seriam belas palavras se eu não lhe pagasse para ser meu conselheiro. — sorri para o amigo — De qualquer forma, falta muito para que eu traga honra de volta para minha família.

— E é isso que você busca?

— Não...

— O que você busca, Comandante?

Ela olha pela janela da carruagem para a grama verde e cheia de vida do outro lado da fronteira e volta o olhar para a outra janela, vendo a terra árida e morta de Valúria.

— Salvar nosso povo, custe o que custar.

Crônicas de Albaran: Amor de Fadas e Sombras (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora