Ikún
Ikún sempre acordava quando a primeira estrela surgia no céu do entardecer anunciando o início da noite, ainda a tempo de ver o último raio de sol desaparecer no horizonte, e logo seguia para os limites do bosque para realizar seus deveres de Guardião enquanto se mantinha atento ao movimento dos animais que iam dormir e dos que despertavam para a noite que chegava, mas algo estava em sua mente neste belo entardecer, uma presença que parecia observar seu despertar e desapareceu assim que ele se aproximou.
Ele não conseguiu realmente ver quem o observara, mas algo deixou um cheiro doce no ar, como o perfume de todas as flores do bosque em perfeita harmonia, de uma maneira embriagante que alterou seus sentidos, quase o deixando fascinado. Quase. Como Guardião do bosque, ele devia vigiar por incursões mortais nos arredores do recanto de sua rainha e não seria uma das fadas lhe observando que iria mudar sua rotina.
À noite, menos animais vagavam pela floresta e a grande maioria dos súditos da rainha Mab estava repousando, por isso Ikún estava acostumado a vagar sozinho pela noite, ver coisas que os outros feéricos não viam, predadores noturnos num ciclo feroz que acontece apenas quando o sol se põe, sombras do bosque que amedrontariam seus irmãos acostumados com a luz, mas também existiam flores que desabrochavam apenas à noite, belezas que apenas ele conhecia.
— Indo caçar no campo sozinho novamente, Âmbar? — Ikún pergunta antes de um lobo cinzento com olhos dignos do apelido dado pelo feérico se revelar por um arbusto — Você parece cansado, amigo, mais magro, o bosque não tem lhe sido gentil?
O lobo se aproxima de Ikún quase tocando seu grande focinho em suas mãos e então, com um olhar mais criterioso, o Guardião repara em meio aos seus pêlos cinza escuros alguns mais claros, grisalhos, principalmente em volta do nariz.— É verdade, você deve estar ficando velho já... — certa tristeza toma conta de Ikún — Me prove que ainda tem o espírito de caçador que sempre teve, meu bom amigo.
Gentilmente ele toca a cabeça de Âmbar e um leve brilho claro, quase que como a luz da lua, cerca o grande lobo e em um instante ele parece ter voltado com seu olhar afiado e logo fareja algo contra o vento. Com um olhar para o Guardião, Âmbar se despede e segue para a caçada noturna.
— Boa caçada, que não seja sua última.
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O bosque da rainha Mab sempre foi cheio de vida, mesmo à noite, porém hoje todos estavam agitados.
Ikún não costumava interagir com os outros feéricos, pois a grande maioria deles temia o Guardião da Noite mas, vendo a comoção por todo o bosque ele se aproxima de um trio de centauros que vinham dos campos ao norte.
— Saudações, guerreiro dos campos livres — diz Ikún para o centauro que vinha à frente, portando uma lança de pedra tingida de vermelho pelo sangue seco dos inimigos enfrentados — que novidades trazem do norte?
— Saudações, Guardião da Noite, os mortais avançam por nossas terras com armas de guerra antinaturais que cospem aço e fogo, retornamos a pedido da Rainha Mab para organizar nossas fileiras e defesas. — responde o centauro enquanto recupera o ar nos pulmões.
Ikún observa o campo ao norte, nem um sinal dos mortais podia ser visto até o horizonte, porém para um centauro estar exausto, ele deve ter corrido muito tempo.
— Obrigado pela informação, podem seguir para o bosque em segurança, amigos.
Os centauros fazem uma leve reverência a Ikún e entram bosque a dentro, desaparecendo em instantes entre os arbustos e árvores.
— Maya deve saber o que devo fazer, ela sempre nos guiou em tempos assim — refletiu Ikún ao pensar em sua tutora, uma fada tão antiga quanto a própria rainha — está na hora de descobrir meu papel no conflito que virá.
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Maya estava vigorosa como sempre, guiando e orientando todos com palavras que acalmam até mesmo os mais novos e nervosos, Ikún poderia observá-la por uma eternidade e ainda teria algo a aprender com ela.
Ao perceber Ikún nas sombras, Maya sorri e faz sinal para que ele se aproxime, fazendo com que vários outros abaixassem a cabeça ou desviassem completamente o olhar ao ver Ikún ali. Isso sempre o incomodou, afinal ele era o guardião deles, por que ele era tratado de tal maneira? Não importava agora, pois ele sabia que havia chegado a hora de cumprir seu dever.
Ele se aproxima e se coloca em apenas um joelho diante de Maya.
— Criadora, qual o desejo de nossa Rainha para mim?
— Vamos ao fronte de batalha ao norte, Guardião da Noite.
Ikún levanta a cabeça confuso, ambos sabem que ele é conectado ao bosque e que não pode deixá-lo, como ir até o fronte de batalha?
— Eu vivo para servi-la, mas... — ele diminui o volume da voz, tornando quase um sussurro — eu não posso deixar o bosque.
— Então levaremos o bosque conosco, doce Ikún — com uma mão, Maya ergue o rosto de Ikún para que ele possa ver algumas bolotas de carvalho em sua outra mão.
Como sempre, Maya tinha a resposta e, a essa altura, Ikún não se surpreendia mais com isso.
— Eu plantarei e com nossa magia as árvores crescerão em poucas horas e à noite você poderá nos ajudar, eles não estão prontos para alguém com o poder de Roxie e o seu.
— Roxie? — Pergunta Ikún, confuso, e instintivamente o cheiro de flores toma seus sentidos novamente.
— Você não a conhece, nem teria como... — Maya parece triste por um breve instante, mas logo retoma o ar vibrante que sempre tem — O que importa é que vocês irão salvar nosso povo, a Rainha Mab confia em vocês.
Ikún se enche de perguntas sobre essa aliada poderosa, quase ignorando o fato de Maya ter citado Mab diretamente.
— É uma honra ter tamanha confiança. — Diz o Guardião, reassumindo a postura de joelhos em frente a Maya.
— Se despeça da floresta, logo partirei para o norte e assim que tudo estiver pronto você acordará em meio ao caos e conflito.
Maya parecia diferente, para a maioria ela estava ali como um farol de esperança, mas Ikún a conhecia há tempo o suficiente para saber que havia tristeza em seu olhar, e ele logo entendeu que essa não era uma missão com objetivo de vitória, ele estava indo se sacrificar para ganhar tempo para seu povo.
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Crônicas de Albaran: Amor de Fadas e Sombras (DEGUSTAÇÃO)
FantasiLivro completo na Amazon. No mundo de Albaran, os Reinos Humanos enfrentam uma guerra contra os povos feéricos que já dura séculos. Ikún e Roxie são os Guardiões da floresta encantada da Rainha das fadas Mab, separados por uma maldição que o prende...