parte cinco.

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O incómodo ruído provocado pela brusca imobilização de um veículo pela ação dos travões, ecoou por o, até então, silencioso espaço e despertou, de forma súbita, a aspirante a profissional na área da saúde que, ao descerrar as suas pálpebras, o seu verde-água marcou encontro com o atlético peito onde a sua cabeça repousava, provocando-lhe um breve, mas tímido e genuíno sorriso, pelas lembranças do modo como terminara aquela anterior noite, e concedendo-lhe uma atípica coragem para conduzir a sua mão ao exposto abdómen do portista, com o propósito de ali a colocar numa posição cómoda. Contudo, no mesmo instante em que conquistara aquela unusual valentia, perdera-a para as suas inseguranças, que lhe obstruíram de prosseguir com os seus reais intentos.

Volta atrás e faz o que era teu o desejo de fazer. E que eu, também, quero que faças. — A sussurrada voz de Diogo penetrou-lhe os tímpanos, sendo a primordial causa do ligeiro sobressalto de que fora alvo. As risadas do casal fundiram-se, acalentando o coração de Maria que, puramente, sorria.

       — O que fazes ainda acordado? Já deverias estar em repouso, Leite. É cedo. — Após, minimamente, erigir a cabeça a fim de observar o contemporâneo relógio digital sito na superfície da mesa de cabeceira do espaço pessoal do futebolista — e que exibia um horário próximo das três da madrugada —, a finalista do curso de enfermagem, num baixo volume, aconselhou, enquanto, acatava a expressa ordem do defesa central e conectava a sua mão ao visível, e bem construído, ventre do próprio, sendo, no imediato, transportada a uma viagem de retrocesso no tempo, mais concretamente, ao verão, três anos antes, com os íntimos e inolvidáveis momentos protagonizados por eles. Em vagarosos, e veementemente tímidos, movimentos, os seus dedos iniciaram o delinear de imaginários círculos ao redor dos abdominais do rapaz, e que instigaram o camisola quatro a, também, ele voltar a sentir a fina pele — que durante três meses, tão profundamente, explorara e assinalara —, através dos afagos que inaugurou nas costas da Maria, provocando-lhe o mais visceral dos arrepios, que bailaram pela extensão da sua espinha.

O suster da sua respiração afigurou-se inevitável, sobretudo porque aquele era o primeiro contacto que partilhavam, após alguns anos sem qualquer tipo dele. Inúmeros cenários indecentes subjugaram a sua inocência e clamaram os seus pensamentos, coagindo Maria a pontapeá-los para o mais longínquo lugar da sua mente, ali enclausurando-os. Não era o momento, ou sequer, o espaço propício para permitir-se ser dominada pela voluptuosidade, um dos tantos sentimentos que descobria-se ainda nutrir pelo defesa-central.

       — A travagem acordou-me. — O de vinte primaveras justificou o seu estado desperto, movimentando o seu verde claro para as venezianas não cerradas na sua totalidade, o que viabilizava o trespassar da luminosidade provida do exterior, ainda que num exíguo nível.

       — Como te sentes? — Num baixo volume, a irmã de Francisco quis conhecer a atual condição do futebolista de profissão, erguendo a sua face, a fim de consumar contacto visual com o rapaz e, no seu brilhante verde, encontrar a veracidade da réplica para a sua questão. Apesar de já haver deliberado consigo mesma que não estaria, de forma constante, a questioná-lo, naquela circunstância, por ser o primeiro tratamento, Maria desejava conhecer, ao pormenor, o estado do atleta.

Sinto-me nauseado. E, sobretudo, doído. — Com franqueza, Diogo retorquiu, não camuflando o seu verdadeiro, e atual, modo de estar, conquistando da loira, um movimento positivo de cabeça e um sorriso munido de conforto. — Mas estou bem. — Foi veloz a salientar, correspondendo ao mostrar de dentes que lhe havia sido endereçado.

       Diante da revelação, a irmã de Francisco procurou afastar-se do moreno, uma vez que algum do peso do seu corpo encontrava-se sobre o dorido físico dele, contudo, o próprio vedou a prossecução da sua real intenção.

Maria | Diogo Leite Onde histórias criam vida. Descubra agora