Maria | Diogo Leite

parte nove.

Logo que a imponente e autoritária voz do regente ecoou pelo, até então, silencioso auditório, Maria findou a escrita do seu último parágrafo, não refreando um suspiro de puro alívio, por se ter manifestado capaz de controlar o tempo e distribuí-lo pelas diversas questões encerradas no exame final, daquela forma, concedendo a devida resposta ao conjunto delas.
Ergueu o seu corpo da cadeira, levianamente, desconfortável, recolheu os materiais — que consistiam em duas esferográficas azuis, uma a utilizar e outra a desempenhar o papel de suplente, em caso de um indesejado "acidente", como a sua simples falha de escrita, e o seu cartão de estudante, para que ao docente fosse possível confirmar a sua identidade —, segurou o enunciado e respetiva folha de resposta, e desceu o considerável número de degraus, que compunham a escadaria de madeira, a fim de alcançar a secretária central e onde se situava o mestre, na missão de compilar as inúmeras provas de averiguação de aptidões e conhecimentos e, até mesmo, averiguar, através da inquirição a alguns estudantes, qual a opinião acerca do grau de dificuldade pelo qual optara.

Beneficiando do natural alvoroço de universitários, que buscavam entregar os papéis, a fim de abandonar o estabelecimento de ensino superior e dirigir-se em busca de uma meritória diversão, a antiga estagiária da ala da oncologia — cuja aprendizagem profissional fora concluída no final do primeiro semestre, e que lhe rendera uma dezanove de classificação —, dispôs os documentos escritos na superfície da mesa e escapuliu às questões apresentadas pelo professor, desejando, também, apenas e tão só, desocupar a instituição e, naquele momento e mais concretamente, aquela espaçosa sala. Envergou o seu quente e comprido casaco, bem como o gorro, que lhe ofertaria a devida, e imensamente almejada, proteção das cortantes temperaturas exteriores que imperavam na cidade invicta, naqueles finais do mês de janeiro, do ano civil de dois mil e vinte, e caminhou na direção da porta de saída, onde Rafaela, com a sua característica impaciência, já expectava a sua chegada.

— Como correu a prova? — A morena dotada de umas bonitas íris de uma tonalidade cinza questionou a portuense que, imediatamente, exibiu um erguer de ombros, não lhe pertencendo a vontade de exteriorizar quaisquer prognósticos que, posteriormente, não correspondessem à realidade. Apesar de ser uma virgiana munida de uma, quase, inexistente paciência, no que ao período de avaliações dizia respeito, a de lisos e loiros fios dava primazia à espera.

       — E quanto a ti? — A irmã de Francisco retorquiu com outra interrogação conquistando, num primeiro momento, a mesma exata que havia dirigido à amiga. Contudo, não demorou a que a aveirense discursasse.

       — Honestamente, e diante do meu exíguo tempo dedicado ao estudo, confesso pensar que se revelaria uma autêntica catástrofe, no entanto, julgo ter feito o suficiente para conquistar uma nota positiva, embora talvez não muito exuberante. — A única herdeira do casal de emigrantes revelou, enquanto se encaminhavam para em direção à parte externa da universidade. — E esse sorrisinho, Maria Miguel? É por consequência do término da época de exames, sempre desgastante, ou porque vais, finalmente, estar com o teu cavaleiro andante? — Diante das palavras da sua mais prezada amizade, a irmã de Francisco não refreou uma gargalhada, acomodando a peça de lã, que lhe abrigava os, já maiores, ainda que curtos, fios loiros.

— Posso escolher as duas opções? — A tripeira de coração retorquiu, provocando na boavisteira uma breve risada, consecutiva de um mostrar de dentes. — Não me podes julgar. Estas duas semanas sem contacto com o Diogo, quase, me conduziram à loucura. — Um beicinho afigurou-se inevitável, assim que rememorou a otite e a constipação que a vitimizaram por um considerável período de tempo, e cujo lento processo de recuperação obstruía-a de desfruir dos usuais momentos com o futebolista, de modo a não prejudicar o plano de restabelecimento da sua saúde — sendo que, em setenta e duas horas, o internacional português seria submetido ao seu oitavo tratamento, findando o quarto ciclo, dos seis idealizados pelo médico responsável pela sua cura.