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Magali tinha acabado de notar que ficar acordada até tarde da madrugada maratonando “Pesadelo na Cozinha” tinha sido uma ideia horrível. Seus olhos estavam pesados e por mais alto que o Professor Licurgo gritasse, ela não conseguia entender uma só palavra. Tudo bem que os meninos sentados logo atrás dela não ajudavam, Cebola e Cascão ficavam gritavam, falando bobagens e comentando sobre alguma aluna mais nova.
Ela queria levantar e mandar eles ficarem quietos, mas seu corpo não obedecia as ordens. Continuava caída sobre um braço direito que formigava com cabelo no rosto e morrendo de calor. O seu corpo só voltou responder às ordens de sua mente quando Licurgo jogou um canetão enquanto gritava “eu não sou louco” e o objeto bateu de jeito no magricelo braço de Magali.
- O que rolou? - ela levantou exaltada, sentido o cabelo bagunçado e, nossa suas costas estavam suadas. Que nojo.
- A Denise falou aquela palavra... lou... - Marina levou os indicadores de ambas as mãos aos lábios formando um x, como forma de censurar parte da palavra -..ura.
- Loucura? - a mente de Magali ainda não estava funcionando muito bem, o que fez outro cantão voar na direção delas, acertando o rosto de Maria Mello.
Licurgo era sempre assim, meio biruta, atacando objetos em direção a aluno e gritando sempre que alguém falava a palavra louco ou qualquer derivado da palavra. Mas depois de tantos anos estudando com aquele… doidinho, as meninas estavam perfeitamente acostumadas. Os pais dos alunos agredidos já tinham concluído que não valia a pena brigar com a direção da escola e a maioria já tinha planos de fuga de centões, bolas e papel e as vezes até cadeiras que eram jogadas pelo professor.
- Mas a culpa não é minha. - Denise estava sentada duas cadeiras a frente de Magali, mexia no celular escondida enquanto falava. Sua perna direita estava sobre a esquerda, de forma que sua coxa grossa tampava o celular em sua mão. - Vai ser uma lou...ura.
- O que vai ser, lou...ura? - Magali soltou e prendeu o cabelo duas vezes, olhando seu reflexo na janela, evitando que os montinhos de cabelo formassem “chifrinhos”.
- Denise vai financiar nossa viagem pra praia na semana do saco cheio. - Cascuda parecia animada ao falar da viagem, seus olhos brilhavam e ela parecia menos tensa do que costumava ficar.
A semana do saco cheio era a semana do feriado de dia das crianças, dia de nossa senhora também. Naquele ano, o feriado seria no meio da semana e quando isso acontecia nem os melhores alunos apareciam na escola. Talvez no máximo o Do Contra, mas nem ele aguentaria as aulas sozinho por uma semana. Ainda assim, era semana pra “dar rolê”, viajar, ir em festas. Era como uma semana de férias no meio do semestre. Ou como a Denise gostava de chamar: Saco-Cheio-palooza.
- Financiar nada, criatura. - Denise soltou o celular pela primeira vez desde o início das aulas. Ele ainda estava desbloqueado sobre a coxa da menina, as mãos agora vazias começaram a gesticular para as meninas ao redor dela. - Eu vou dar hospedagem pra vocês, o cash vocês que arrumem. ‘Cês já vão ficar na minha casa contra a minha vontade.
- Contra a sua vontade? - Magali perguntou confusa.
- Eu ia chamar você, a Mônica e a Sofia, mas essas enxeridas se convidaram pra minha casa. Eu tive que falar que tudo bem. - ela deu de ombros voltando a pegar o celular, que ainda brilhava na timeline do Tuíter enquanto Cascuda e Denise começavam a jogar na cara dela que a menina nunca era convidada para os passeios que iam em grupo e mesmo assim elas sempre financiavam-a.
Enquanto as meninas brigavam, a mente de Magali voltou a sonhar. Uma semana na praia era tudo que elas precisavam! Claro, ela ia sentir falta do Quim, mas se livrar das preocupações do Limoeiro seria um alívio necessário. A animada garota encarou a melhor amiga, sentada logo ao seu lado, mas menina parecia distraída enquanto digitava no celular. De fato, Mônica estava alheia às conversas das meninas, tinha estado ocupada demais analisando diversas vezes as mensagens que trocava pra se importar se aquela seria a viagem do ano. Magali chamou o nome da amiga três vezes, antes de puxar o braço da garota que se virou visivelmente irritada.
- Quié, Magali?
- Sai desse celular, Mô. Tá todo mundo conversando e você ai!
- A Denise também tá no celular. - Mônica não sabia se defender sem acusar os outros de errarem e isso era irritante. Era impossível para ela admitir as merdas que fazia e pedir desculpa? Magali às vezes queria poder bater nela.
- Você vai com a gente? - era melhor não esticar a conversa sobre o celular, se Magali fosse direto ao assunto, talvez Mônica prestasse atenção em algo que não fosse o projeto de vegetal sentado há alguns metros.
- Vou aonde?
- Viajar comigo e com as meninas na semana do saco cheio.
Mônica pensou um pouco. Uma viagem com as meninas seria legal, precisava de um dia de sol na praia com calma e sem sentir o celular vibrando, como estava acontecendo naquele momento. A mensagem era do Cebola: “Então a gente fechou, né?”. A garota virou o rosto, tendo uma visão melhor do namorado que alterava o olhar entre o celular e o Cascão, mas que quando percebeu o olhar sobre ele deu uma piscadinha.
- Eu não posso. Combinei de sair com Cebola semana que vem.
- Ai amiga, você pode sair com ele sempre, uma viagem assim nunca acontece. E a Denise vai financiar.
- Eu já disse que não vou financiar nada, ô estrupício! - Denisse berrou, se virando e percebendo o olhar da Mônica sobre o namorado. Eca. - Mas calma, a Mônica não vai?
Denise não sabia explicar, mas ela estava tão animada com aquela viagem! Tirar fotos pra postar no Instagrão, fazer histories reflexivos com as musicas do Zé Beto e Crispiano e finalmente ter um dia sem ter que ouvir sua mãe falando asneiras no seu ouvido. E ir com Magá, Sofia e Mônica seria um sonho. Um sonho interrompido por Maria, Marina e Cascuda, mas ainda assim um sonho. Ela só queria curtir o feriado com as amigas, era pedir demais?
- Eu tenho um compromisso com o Cebola, Dê. - Mônica não estava triste, estava mais preocupada do que triste por perder aquela chance.
- Mônica, você é uma sonsa. - foi a única coisa que Denise disse.
As meninas também se calaram depois da frase da garota de Maria-Chiquinha. Todas elas iam abandonar seus namorados para curtir praia juntas, mas Mônica não! Ela era a única que não podia deixar o bobão do Cebola para trás ou ele faria um chilique.
Quando a aula do Licurgo terminou e consequentemente todas as aulas do dia, Denise não disse tchau pra ninguém. Carregando Sofia quase arrastada, a menina foi embora sem mais nem menos. Magali não sabia o que tinha deixado a garota tão irritada, mas tinha suas suspeitas.
Mônica e Cebola estavam nesse chove-não-molha há tanto tempo. E sempre que eles deixavam os sentimentos rolarem, um dos dois fazia besteira e estragava o sentimento. Eles eram tóxicos e abusivos, só brigavam e queriam sempre ser um melhor que o outro. Havia mesmo algum amor ali? Desejo sabia que existia, mas amor? Magali pensava sobre isso enquanto Mônica colocava a mesa.
As duas iam pra casa uma da outra sem motivo desde a infância. Elas gostavam de ficar juntas, ver um filme e as vezes até ajudavam uma a outra nos estudos. Mas dessa vez, Magali tinha ido pra lá meio a contra vontade da dona da casa. Elas precisavam conversar e o único lugar onde Magali podia prender Mônica, era na casa dela.
O almoço era um momento muito sagrado para brigarem, então Magali esperou que Mônica comesse até as últimas migalhas antes de tentar iniciar uma conversa.
- Amiga. - Magali chamou uma forma apreensiva. - Eu queria falar com você sobre uma coisa séria. - Mônica a encarava curiosa com um pouco de comida ainda na boca. - É que… - como ela poderia falar que o relacionamento dela com o Cebola era nojento, abusivo e péssimo? - Eu e as meninas estávamos falando sobre uma coisa recentemente… é que a gente acha que você não percebeu, mas - Magali tomou um fôlego, tentando unir seu ar a toda a coragem que havia para berrar “VOCÊ TÁ NUM RELACIONAMENTO ABUSIVO”, mas o celular de ambas vibrou sobre a mesa com uma mensagem da mesma pessoa.
“DENISE: Minha casa já, morecos!”
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Coisas de Meninas
Hayran KurguMônica e Cebola estão destinados um para o outro. Como uma variável universal, todos sabem que no fim da história eles estão destinados a ficarem juntos, seja por muito amor ou por um erro de cálculo. Mas depois de tantos erros e brigas, não só a Mô...