CAPÍTULO 4

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Noto ao longe algumas crianças felizes na brinquedoteca do hospital. Meu peito irradia um calor de emoção e um sorriso se expande em minha face.

Penso em como seria o meu pequeno. Volto-me para o quarto, pronta para me restabelecer fora daqui. Passei três dias seguidos nesse lugar e sinto mais aliviada por permanecer longe do homem que me destruiu todos os dias em que estive com ele.

Pela primeira vez tenho a consciência que posso realmente morrer nas mãos daquele animal, mas chegou o momento de partir. Coloco a mão sobre minha barriga, deslizando meus dedos por ela.

Minha garganta se fecha ao pensar que Victor tinha razão. Sempre estive escondida atrás de Leonardo vivendo em um relacionamento abominável, onde era consumida em silêncio por um abismo profundo, mas agora sinto a transformação invadir meu corpo e a leveza revigorar minha alma ao saber que ele ficará longe por um longo tempo.

A partir de agora tenho certeza que as coisas mudarão e não irei permitir que Leonardo me machuque mais. Coloco minha mão sobre a barriga e meu peito se aperta por um instante, mas me empenho em apagar da memória o sentimento de perda e enfim reestabelecer minhas forças.

O desconhecido é o que mais tememos, porque com ele vem grandes mudanças destinadas à nossa vida. Transformações como essa nos faz sentir desconfortáveis, mas há momentos em nosso caminho que precisamos cortar o mal pela raiz.

— Está na hora... — Victor entra no quarto sem aviso prévio e me observa. — Sei que será difícil superar, mas saiba que sempre estarei ao seu lado.
— Obrigada... A polícia está lá fora? — Questiono-o.
— Sim, como você me pediu. — Ele apanha a mala e saímos dali.

Caminho pelos corredores e me despeço das enfermeiras e do doutor, que me acolheram e trataram dos meus ferimentos, sem eles não conseguiria me manter em pé. Cruzo a recepção e observo os dois policiais que me aguardam e suspiro aliviada por não encontrar o meu pior pesadelo.

— Senhora Mendes, vamos acompanhá-la até a delegacia para você prestar queixa. — Um homem alto e moreno com os dentes branquíssimos coloca sua mão nas minhas costas, levando-me para fora.

Saio pela porta de vidro e encaro tudo atentamente. Ainda sinto grande receio em encontrar o meu marido. Acredito que ele deve estar furioso porque não o deixei entrar no momento das visitas, mas depois do que soube não poderia ficar mais perto dele.

Ter um filho nunca esteve em meus planos, porém quando descobri que sofri um aborto por conta das agressões, senti que uma parte minha foi embora e que deixou um buraco vazio.

Pensar nisso faz as lágrimas se formarem mais uma vez em meus olhos, porque fico imaginando aquele corpinho frágil crescendo aqui dentro. Observo meu reflexo nos vidros da porta da viatura e noto o meu rosto pálido. Os hematomas de três dias atrás agora não são perceptíveis, apenas alguns arranhões ainda estão visíveis.

Entro no carro acompanhada pelo meu amigo de todas as horas. Sinto sua mão esguia agarrar a minha e seu olhar de preocupação é visível. Lembro-me da nossa conversa anterior quando ele me questionou se realmente estava disposta a pedir ao juiz uma ordem de restrição e garanti a ele que o meu maior desejo agora é manter distância do meu marido.

— Estamos quase chegando. — O policial nos avisa e balanço a cabeça em positiva, respirando fundo.
— Calma, Sá, a lei está ao seu lado e você conseguirá reconstruir sua vida longe dele.

O carro finalmente estaciona rente ao meio fio e encaro a fachada que diz “Delegacia da Mulher”. Abro a porta e me aproximo da entrada com o coração saltando pela boca. Esse é o momento de mostrar a todos quem é o verdadeiro marido doce e gentil que tenho.

Perdida em seu toque ( DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora