Onze

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A primeira coisa que percebi foi o som constante de bipes. Familiar, de certa forma, mas não nesta situação. Abri os olhos, nem um pouco surpresa por ver um teto branco. Um monitor ao meu lado apitava suavemente, os sensores embutidos na cama captando todos os dados que precisavam. Respirei fundo, enquanto testava meus músculos. Apenas uma fisgada aguda na minha barriga, mas tudo parecia estar funcionando.

Engoli em seco, me lembrando da origem daquela dor. Alterei minha percepção imediatamente, vendo os fios que me envolviam. Eles ainda não estavam de volta ao normal, mas estavam recuperando sua força aos poucos. Outros fios, branco azulados, funcionavam como um suporte, se entrelaçando com meus fios onde estavam mais fracos. Segui aquela cor que não era parte de mim, apenas para encontrar a ligação. Com um suspiro, voltei minha percepção ao normal.

Um olhar para o lado me mostrou que Kai estava deitado em uma cama como a minha, absolutamente imóvel. Os monitores ao seu redor também apitavam suavemente em um ritmo constante. O que tinha acontecido? Minha última lembrança era do homem lutando contra Meahrande Ev.

O ruído suave de passos fez com que eu me virasse. Dois c’erit se aproximavam, um deles vestido de branco e o outro usando o uniforme dos guerreiros. Em silêncio, o que estava de branco observou os monitores por um instante, antes de se virar para mim.

– Não vou insultar suas habilidades pedindo para que se deite e deixe que eu a examine. – ele falou, de forma surpreendentemente direta. – Mas espero honestidade. Ainda existe algum dano resultante da luta?

– Minha barriga ainda está cicatrizando, vou precisar me poupar por alguns dias até ter certeza de algum esforço maior não vai romper nada. – respondi, depois de fechar os olhos por um instante e me monitorar para ter certeza. – Mas nada além disto. Quanto tempo fiquei desacordada?

– Quatro dias. – o homem respondeu, antes de fazer um gesto rápido para o guerreiro parado ao seu lado. – Diern pode responder suas perguntas melhor que eu. Está dispensada.

Com estas palavras ele nos deu as costas. O guerreiro o encarou por alguns instantes antes de se virar para mim, as sobrancelhas erguidas em algo que parecia uma mistura de surpresa e diversão.

– Nunca vi alguém ser dispensado do hospital com tanta facilidade. – ele murmurou.

Dei de ombros enquanto me levantava, precisando de alguns segundos para ter certeza de que minhas pernas me sustentariam. Era fato conhecido que os Guardiões sabiam monitorar seus corpos e reconhecer danos, era necessário para que funcionássemos bem em campo. Sem dizer nada, fui até a cama onde Kai estava. O homem parecia estar apenas dormindo, nenhum ferimento grave à vista. Com esforço, contive minha reação. Aquela preocupação que beirava a histeria não era algo que uma Guardiã sentiria. Não era algo que eu podia me permitir sentir, muito menos agora, depois do que ele tinha feito.

– O que aconteceu depois que desmaiei? – perguntei.

– Sou Diern Alen’her, capitão-mor dos c’erit. – ele se apresentou, como se estivesse apenas esperando que eu lhe desse permissão para falar. – Minhas ordens específicas eram para protegê-la e ajudá-la no que fosse possível. Você entrou em convulsões quando tirei a adaga...

– Não me lembro disto. – murmurei. Ou talvez ele estivesse falando de quando inverti o fluxo de poder. Mas, de qualquer forma, eu lhe devia um agradecimento. – Obrigada.

Ele assentiu de leve, antes de continuar.

– Meus oficiais me informaram que Kai conseguiu encurralar Ev, e a luta entre eles se estendeu por mais tempo do que esperavam. O aireni tinha a vantagem, e ninguém estava em condições de intervir. Kai pareceu ganhar forças do nada, sua espada brilhando de uma forma que nenhum de nós nunca viu antes.

Sentinela (Crônicas de Táiran #1) [Degustação]Onde histórias criam vida. Descubra agora