Quando eu tinha 10 anos descobri o amor. Ele tinha os cabelos loiros e uma bicicleta bem legal, além de ser conhecido por todos no meu bairro ele tinha um charme que fazia meu estômago revirar de nervoso. Eu costumava vê-lo quando voltava do balé e tinha que ficar na casa do meu irmão mais velho, lá havia uma janela grande no andar superior que eu quase conseguia ver sua casa. Fantasiava que um dia ele falaria comigo, pediria pra pegar na minha mão, diria que gostou da minha pulseira nova... Esse tipo de coisa que quando somos crianças esperamos de quem gostamos.
Minhas aulas logo começaram em uma escola nova que por sorte minhas amigas todas estavam lá, não vou entrar em detalhes sobre elas porque é irrelevante para o objetivo dessa história, exceto por Sarah. Ela com certeza não era a garota mais inteligente da nossa turma, na verdade ela era meio lerdinha, mas era linda. Morena dos cabelos compridos, rostinho de boneca, uma verdadeira princesa. E eu? Não passava de uma menina baixinha, magrinha, quatro olhos e com franja... Pois é, não tinha nem chance.
No primeiro dia de aula deixei minhas coisas na sala e correndo fui ao banquinho onde minhas amigas já se encontravam para comentar sobre os alunos que chegavam, até que eu o vi. Elas logo perceberam porque eu automaticamente sorri, era involuntário mesmo eu nunca tendo trocado uma palavra com ele ainda assim ele mexia comigo. Era meu amor platônico de infância então você não pode me julgar, o que uma menina de 10 anos sabe sobre amor?
Não fazia constantemente mas vez ou outra no recreio eu saia do clubinho da luluzinha ia até o outro pátio, intitulado "lado dos meninos", olha-lo jogar futebol com uma garrafinha de refrigerante como bola. Lembro de sua dancinha da vitória e também de como ficava vermelho ao correr tanto. Meu amor foi segredo até o meio do ano quando voltamos das férias, eu o vi de mãos dadas com ninguém menos que Sarah e foi aí que tive meu primeiro coração partido.
Passei a odiá-lo tanto que nem ficar perto não conseguia como se o coitado tivesse culpa ou até mesmo conhecimento da minha secreta paixão, claro que minhas amigas notaram meu afastamento da pobre Sarah mas eu acreditava que não estava errada. Poxa Sarah, logo ele?Algum tempo se passou e já era o inicio do ano letivo novamente, mesmo o odiando ainda ficava pensando "será que ele vai estar lá esse ano de novo? será que ainda está com ela?". Esse seria um ano diferente pois meu primo havia se transferido para minha escola, éramos muito amigos e ele estaria na mesma sala que o meu loirinho. Bom, meu não, da Sarah...
Foi bem rápido para eles virarem amigos, o que eu posso dizer, são homens né?! E não demorou muito pra que eu ficasse sabendo que ele e a menina mais bonita da escola não estavam mais juntos, o que reascendeu tudo o que eu sentia por ele. Que pra ser sincera não estava lá muito apagado. Com meu primo por perto as coisas ficaram mais fáceis pois era incluída nas brincadeiras e conseguia incluir as meninas também, tudo estava em paz na escola até o dia que me esqueceram. Quem me esqueceu? meus pais.
Como não me deixavam ir sozinha pra casa apesar de morar perto da escola, eu tinha que esperar alguém ir me buscar. Isso me irritava constantemente porque meus pais eram desligados quanto à isso, em um desses dias eu sentei no banquinho de sempre e comecei a resmungar até que alguém sentou ao meu lado. Você sabe quem foi. Me virei lentamente incrédula pensando "a escola está vazia, o que ele ta fazendo aqui?", consegui ver cada detalhe seu bem de pertinho, os tons do seu cabelo...
"O que você ta olhando?" Ele perguntou assustado, "nada" respondi abaixando a cabeça desconcertada.
"Esqueceram de você também?"
"Sim, mas você não vai de bicicleta?"
"Hoje não, era pra eu ir almoçar com meu pai mas acho que ele não vai aparecer. Qual seu nome mesmo?"
"Alice. Você é o Paulo né? Meu primo estuda com você."
"Isso, eu sei quem é, o Marcos."
"Esse mesmo."
"A gente volta de bicicleta juntos, você devia ir também."
"Não sei se meus pais vão deixar... Ah o meu irmão chegou, quer que a gente te deixe em casa?"
"Quero, meu pai não vem mesmo."
E foi assim que tudo começou. Não criem expectativas sobre nossos diálogos porque éramos duas crianças, falávamos sobre as brincadeiras na escola, sobre os professores, sobre os alunos, nada sobre nós dois. Éramos amigos. Comecei a voltar com ele todos os dias de bicicleta, no caminho ele sempre me comprava um doce mesmo sabendo que eu não podia comer antes do almoço. Nos finais de semana combinávamos de ir ao parque junto, meu irmão me levava e nos acompanhava. Na escola, quando ele fazia um gol apontava pra mim e eu fazia um coração.Todo ano acontecia um festival de comida local que meus pais adoravam ir, eu ia por obrigação, até conhecer o Paulo. Ele me falou por horas de uma barraquinha que vendia a melhor tapioca que ele ja comeu, e eu queria muito provar. No dia marcamos de nos encontrar em frente à um carrinho de algodão doce, é claro que eu eu fui a mais produzida que eu podia pra minha idade: gloss de uva e botas cor-de-rosa.
No horário que marcamos eu estava lá, vale a pena ressaltar que eu sempre me atraso pra tudo, mas era ele. Depois de 15 minutos esperando meu primo apareceu.
"Ei, o Paulo falou que quer te beijar."
Assim, na lata, acredita?
"O que? Como assim? Ele quer namorar comigo?"
"Sim. Vai ser ali atrás perto do hot dog."
Vamos lembrar de um detalhe: eu tinha 10 anos! Eu entrei em pânico! Eu nunca havia beijado alguém, como faz isso? Eu fico parada e ele vem? Se meus pais souberem eu to ferrada. Eu pensei tanta coisa...
"Iai? Você vai querer?"
Respirei fundo e disse sim.Quando o vi se aproximar juro que quis vomitar, minhas mãos suavam e meu coração faltou parar de tanto bater. Ele veio me abraçando, ao mesmo tempo que foi muito bom sentir seu abraço foi muito ruim sentir todo esse reboliço dentro de mim.
"É verdade que você quer namorar comigo Paulo?"
"É sim, eu gosto de você."
"Eu não sei fazer isso."
"Feche os olhos..."
Eu me senti segura no seu abraço, conseguia ouvir sua respiração, o atrito de seu rosto com o meu se aproximando vagarosamente até nossos narizes se encontrarem fazia meu óculos sair do lugar. Meu coração acelerava cada vez mais, sentia o ar quente de sua respiração mais próximo até que senti seus lábios tocarem os meus. Macios e húmidos. Doces como melado, gelados como sorvete, eu sentia dentro de mim uma explosão de sentimentos que eu nem sabia que existiam.
Voltar para a realidade foi como viver em um mundo totalmente diferente do que eu acabara de conhecer, pouco a pouco o medo tomou conta de mim. "Eu acabei de receber o meu primeiro beijo! Meu Deus, meus pais estão por aqui e se alguém viu? Ah cara, eu beijei o garoto que eu amo! Minha nossa, a mãe vai me matar se souber disso". Mas eu não consegui conter a alegria estampada no meu rosto ao andar de mão dadas com ele pelo local depois do que tinha acontecido.
Se aconteceu mais beijos depois daquele? Sinto muito mas não. O que aconteceu foi que ele faltou na escola alguns dias depois daquele e eu fui à sua casa depois da aula, ele me disse que ia embora pra outra cidade por conta do emprego do pai. Eu não acreditei. Se pudesse eu teria me despedido, teria beijado-o mais, teria abraçado-o mais, teria grifado seus detalhes em minha memória. Mas não pude nem dizer adeus. Nem estava pronta para isso.
Foi a primeira vez que alguém me deixou, sem mais nem menos, sem se despedir. Simplesmente sumiu. Eu só tinha 10 anos e nem sabia o que eu sentia, muito menos conseguia nomear as coisas que se passavam dentro de mim. Pouco a pouco seu nome foi saindo da minha boca, do meu diário, do meu dia, do meu pensamento e por fim, da minha vida.
Eu lembro da sensação que foi beijar pela primeira vez alguém que eu tanto amava. Eu lembro de como me sentia em ama-lo em segredo. Eu lembro de como me fez feliz todos os dias que ele esteve comigo e lembro de como chorei com sua ausência. Mas passou. Isso aconteceu há muitos anos, todos os dias eu tento me lembrar de quem ele era mas ele só existe em minha memória. Temos a mania de querer preservar algo que já se foi por medo de uma dor que já sentimos.
Foi assim que eu superei você, meu primeiro amor.
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Eternizando Estrelas
RomanceNão se iluda com o título. Se está procurando desilusões amorosas e corações partidos está no lugar certo. Vou te contar como minha vida foi cheia de traições e ainda assim sobrevivi, que ninguém morre de amor (por mais doloroso que seja) e que semp...