CINCO

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Eu queria poder dizer que passei mais tempo sozinha. Eu curti uma vida de solteira muito bem vivida mas sempre com uma enorme incógnita dentro de mim, esperando o mais simples sinal de afeto para começar tudo de novo.
Faziam apenas dois meses que tudo tinha acontecido e eu tentava ser forte. Cortei o cabelo, pintei, fiz mais tatuagens porque esse é meu jeito de lidar com minhas dores. Acho que se eu mudar um pouco deixo todo o peso com aquela pessoa que eu era.
Numa manhã fui chamada pra gravar um comercial de uma loja. No dia das gravações eu estava bem nervosa pois havia outros atores, pessoas muito bonitas e talentosas, dentre todos só conhecia Luana, uma garota da mesma cia que eu fazia parte. Foi o dia inteiro gravando e confesso que não foi fácil me enturmar, nos bastidores íamos pra uma salinha com comida e água, a bagunça rolava solta. Ao final da quinta ou sexta tomada você apareceu, Ben. Atrasado e irresistivelmente bronzeado.

Benjamin era um Deus grego, alto, forte, olhos verdes, cabelo loiro de sol, pele bronzeada como de quem surfa. Logo as meninas começaram se atiçar na salinha, eu o observava de longe. Ele tinha olhos selvagens como de um lobo, e me intimidou algumas vezes quando me pegou olhando-o do outro lado da sala.
Fomos chamados pra mais uma cena, o diretor de arte posicionou cada um em pares nas mesinhas do restaurante da loja. Eu fiquei ao lado de Luana até ela se levantar ao ser chamada pelo ditetor avisando-a que não precisaria mais de sua participação naquela cena. Ele também pediu pra que eu sentasse na mesa ao lado, com quem? Você sabe.

"Oi, sou Ben. Adorei suas tatuagens."
"Muito prazer. Alice. Gostei da sua também."

Foi assim que começou. Era tão bom conversar com ele, o assunto fluía com tanta naturalidade que parecia que nos conhecíamos há muito tempo. Ele me fazia rir e me deixava corada de timidez, nem notamos quando trocamos de cena pois não paramos de conversar nem por um segundo. E quando nos demos conta já era noite, a gravação tinha acabado.
"Você podia me dar seu número..." ele disse meio sem jeito, e assim eu fiz. Antes de chegar em casa recebi uma mensagem:
"Quer sair amanhã? Gostei de conversar com você."

Ele me buscou na caminhonete de seu pai, me levou à praia e lá conversamos por horas até ele me beijar. As coisas esquentaram tão rápido que esqueci que estavamos em um carro na orla da praia, por sorte era bem tarde. Alguns dias depois nos encontramos de novo. Um encontro normal? Cinema? Jantar? Não, praia de madrugada. Isso se repetiu várias vezes. Sua desculpa era "eu estudo pela manhã e trabalho até tarde todos os dias, esse é o único horário que eu tenho e quero gastar com você", eu acreditava nele e achava fofo. Não tinha porquê ele mentir pra mim, só estávamos ficando sem compromisso.
Só que essa ficada durou mais tempo que eu imaginava que duraria, eu gostava dele e queria vê-lo a luz do dia em outro lugar sem ser a praia ou um motel. Resolvi então que queria conversar sobre o que nós tínhamos. Foi uma longa conversa sobre tempo e interesse, me disse que gostava mesmo de mim, que me contara coisas que não contou pra mais ninguém mas que não tinha tempo pra namorar por conta de sua rotina. Eu, trouxa, disse que daríamos um jeito.
Não me lembro ao certo se esse "namoro" chegou a dois meses pois numa tarde de quarta-feira ele me disse "isso não vai dar certo, não quero te atrasar, você gosta mais de mim do que eu de você", eu fiquei arrasada. Minhas amigas marcaram uma saidinha das garotas pra me animar no fim de semana, no meio da noite advinha quem apareceu com uma morena, alta, corpão? Isso mesmo. Eu queria matar ele, como pode fazer isso comigo? Nunca me levou à lugar algum mas aparece numa festa acompanhado. Eu fui confronta-lo mas ele fingiu que não me conhecia.

Algumas semanas se passaram quando ele decidiu me procurar novamente. Dizia que sentia minha falta e que eu era diferente de todas que ele havia conhecido, então voltamos a ficar sem compromisso. E mais uma vez fomos nos envolvendo intensamente, mas quando tocava no assunto "algo mais sério" ele recuava.
Eu aprendi a lidar com isso por um tempo até você me mostrar seu lado sentimental, Ben. Aquele que o lobo solitário nunca mostrou à ninguém. Fez de mim sua confidente, seu porto seguro. Então eu quis te amar mas você sempre me vinha com isso de que seu sentimento era menor que o meu. O que eu nunca te contei era que isso me machuva, que cada noite maravilhosa que tínhamos era apenas isso: uma noite. Que aquele dia chuvoso que deixou uma carta na porta da minha casa dizendo o quanto eu era especial pra você, deixando transparecer tudo o que sentia por mim foi único. E que se eu guardo até hoje o broche de cavalo que você me deu é porque eu não acredito que o que tivemos foi apenas ficadas sem compromisso, quando eu guardei tantos segredos e sussurros.
Nosso último dia foi em um pré-carnaval, o convidei pra ir comigo mas ele me disse que ia viajar à trabalho. Só que seu trabalho era uma loira com quem eu o peguei aos beijos na festa de pré-carnaval que eu o convidei. Eu segurei o choro, me senti uma idiota, meu coração se partiu em vários pedacinhos e eu nunca mais quis vê-lo.
Falar de você me faz lembrar de quem eu fui nesse tempo, de toda falta de amor, de todas as coisas que suportei e todos os machucados que eu tive que curar sozinha. Mas se posso falar disso, é porque não dói mais.
Você ficou no meu passado, e quem eu era também.

Eternizando EstrelasOnde histórias criam vida. Descubra agora