12: Ao amanhecer

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Lotus e Eco, que andavam sob o auxílio da luz exalada pelo lampião carregado pela jovem de sardas, seguiam vagando sem um rumo exato pelo interior da floresta, não muito próximas uma da outra, por desconfiança e repugnância vinda de ambas as partes.

Algumas raízes vultosas e grossas, das árvores tortas, se encontravam expostas na superfície, saindo da grama e percorrendo o chão da floresta, por não mais do que um metro.

- Porra! – Eco reclamou, após esbarrar seu pé, pela terceira vez, em uma raiz desenterrada. – Dá pra garota nova andar mais ligeiro? Eu não enxergo nada aqui na frente.

- Não tô muito afim não – Lotus, que se localizava alguns passos atrás de Eco, respondeu. – Vai que a senhora sexta série decide me apunhalar com essa faca aí.

- Não sabia que além de estressadinha você também era paranoica.

- Não sabia que além de irritante você também era insuportável. Consigo usar dezenas de sinônimos de chata pra caralho pra te descrever.

- É o seguinte, – Eco parou, se virando, e seu rosto foi iluminado, discretamente, pelo lampião de Lotus, que também não deu mais nenhum passo, mantendo seu afastamento da delinquente que falara. – como você mesma disse, eu tenho a faca, – disse, ao puxar o cutelo de sua calça. – e você a lanterninha. Se me irritar mais uma vez, eu juro que corto a porra da tua língua. Eu já fiz isso antes. Quer ouvir uma história? Uma mais legal que a do Orion? Então vamo lá: desde que eu era criança, antes mesmo da sexta série, o meu tio me olhava de um jeito diferente. Aquele filho da puta, que eu não considero um homem, era a porra de um pedófilo, e começou a passar a mão em mim quando fiz meus 12 anos. Um dia, no mês passado, o desgraçado chegou em casa, bêbado, numa noite que nem meu pai nem minha mãe estavam, e viu a oportunidade perfeita pra fazer o que sempre quis. Colocou alguma droga num copo de água, me deu, e me levou pro porão, onde... ele... ele passou muito mais do que a merda do limite. Semanas depois, ainda sem ter certeza do que tinha acontecido, e do motivo de eu tá com tanta dor pelo corpo, passei mal, vomitando pra cacete. Fiz um teste de gravidez, que consegui ilegalmente, e descobri que uma parte daquele... daquele merda estava crescendo dentro de mim, e isso me enojava de uma forma indescritível. Eu podia denunciá-lo, e fazer com que fosse executado pelo o que fez, mas ainda assim seria enviada pra essa droga de Absolvição por gravidez sem preparação, então porque não fazer justiça eu mesma? Droguei o miserável, o levei pro porão, e... eu... eu me libertei. Nunca senti tanto prazer na vida. Um prazer que sabia que nunca sentiria com qualquer outra coisa. Quando concluí a minha obra de arte, ele não conseguia nem mais implorar para eu parar, ou para matá-lo de uma vez. Meu pai encontrou nós dois no porão, e me denunciou, sem nem pensar duas vezes. Ele nem ao menos me ouviu, apenas me trancou, correu para o telefone, e a polícia chegou poucos minutos depois. Levaram o que restou do meu tio embora, e eu parei aqui. Ainda assim gostaria de ter visto o rosto dele quando foi executado pelo o que fez.

O desabafo de Eco saiu como uma rajada de tiros, e o alívio que a delinquente sentiu, ao expor o que havia feito, a agradou profundamente de forma prazerosa, mas nem perto do que sentiu durante a tortura de seu tio. Lotus não soltou sequer uma palavra, absorvendo tudo como uma ameaça, mas, ao refletir sobre o que ouvira, se questionou se não teria feito igual, ou parecido. Sabia o quão fácil era tomada pela raiva, por qualquer besteira, então ser vítima de um abuso sexual por um membro da própria família, ou a quebraria por inteiro, ou a faria tomar uma atitude pior da que tomara da última vez que deixou a ira controlar seu corpo.

- Sinto muito – foi a única coisa capaz de ser dita por Lotus.

- Eu não – terminou Eco, dando as costas, e continuando o caminho que seguira.

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