- Pré Temporada: Londres -

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Quando entrou no prédio que ocupava uma quadra inteira, Daniel Ricciardo era um misto de muitas expectativas e uma dose um tanto menor de receio. Aos 31 anos de idade, ele não tinha mais tempo a perder. Certas oportunidades eram únicas na vida, e correr pela McLaren, naquele momento, era uma delas.

Deparar-se com o hall dedicado aos campeões lendários da escuderia lançou arrepios por todo o corpo do piloto: Lauda, Hunt, Hamilton, Fittipaldi, Prost, Senna. O que sentiu ao se imaginar ali, ao lado deles, fez com que se recordasse de quando não passava um moleque cheio de sonhos e uma ideia fixa: ser campeão mundial da Fórmula 1. O garoto havia crescido – um punhado de músculos a mais, vários centímetros de altura e os dentes alinhados com auxílio de aparelho ortodôntico não deixavam negar. O sonho, contudo, permanecia intacto.

E era este o motivo para ter deixado a Red Bull, anos atrás, e também a razão pela qual abandonara o projeto falido da Renault. Para Ricciardo, ser campeão era tudo o que importava. E era para isso que ele estava ali, sendo apresentado ao mundo como a nova contratação da escuderia inglesa: a McLaren havia lhe prometido o título, e ele estava ali para conquistá-lo.

Victoria era uma pessoa organizada – ou ao menos gostava de imaginar que sim. No mínimo, encontrava-se bem na própria bagunça. Naquela tarde, contudo, a mulher se via perdida em um mar de planilhas e desenhos de modelagem, procurando suas anotações acerca dos últimos testes no motor do esportivo que a equipe havia desenvolvido para aquela temporada, apenas para conferir pela décima vez os números que sabia de cor.

Como uma das únicas mulheres da escuderia e, principalmente, por trabalhar diretamente com mecânicos que haviam sido subordinados a homens por uma vida inteira, ela sentia que precisava se provar todos os dias. Era exaustivo – e frustrante, e absurdo, e lhe deixava puta da vida vezes demais para que fosse saudável, é verdade – mas também fizera dela quem era: a primeira mulher a ocupar o cargo de engenheira de corridas de uma das maiores equipes da Fórmula 1. Quebrar paradigmas não era algo tão estranho a sua família, afinal.

Na agitação da busca pelos papéis, esbarrou no porta-retrato que, solitário em meio à bagunça, adornava sua mesa de trabalho. Ergueu o objeto, tomando um segundo afetuoso para olhar a fotografia tirada ao lado do pai em dos poucos domingos de manhã que tivera na sua companhia. Só então se deu conta de que o documento que procurava estava bem ali.

— Obrigada, pai. – agradeceu baixinho em sua língua natal, um sorriso melancólico cortando os lábios e sendo absorvido rápido o suficiente para que não se transformasse em uma emoção maior.

Era um grande dia, afinal, e ela tinha trabalho a fazer.

A mulher checou mais uma vez os números sobre os quais perdera algumas noites: eram dados que cruzavam o desempenho do carro e seu novo piloto – estimativas gloriosas que, ela não podia negar, davam-lhe um frio na barriga e grandes expectativas com as quais não era nem mesmo familiarizada. Victoria não era uma otimista por natureza, mas uma fiel fervorosa de análises racionais: e ali, entre seus dedos, ela via uma fórmula de sucesso.

— Ei, Jarvis! – o grito naquela voz de garoto mal saído da adolescência talvez pudesse causar sobressaltos em outras pessoas, mas as aparições de Lando Norris em seu escritório eram tão frequentes que a mulher nem mesmo ergueu os olhos do trabalho, sentando-se novamente na cadeira de couro e abrindo seus e-mails mais uma vez – Você não devia estar lá embaixo dando boas vindas pro cara novo? Sendo simpática? – ele continuou, e Vic não precisava olhar para saber que ele sorria. Sempre sorrindo, Lando.

— Eu acho que esse era o seu papel, como bom companheiro de equipe. - ela continuou a digitar o e-mail em que trabalhava antes da interrupção – E não ouse se sentar aí. – completou, mirando a tela do computador e interrompendo o movimento do garoto que já se empoleirava sobre a mesa, e parou no meio do gesto, sem ter ideia de como ela tinha visto aquilo sendo que tinha os olhos no computador. Cada dia tinha mais certeza de que ela era um robô, honestamente.

Grand Prix • Daniel RicciardoOnde histórias criam vida. Descubra agora