𝑰𝑵𝑺𝑶𝑵𝑰𝑪𝑶 | Shinso Hitoshi

23 - Vocês eram tão felizes naquele retrato.

Os últimos dias vinham sendo o inferno para você. Rapidamente as notícias sobre a queimada que havia acontecido em Hosu espalharam-se por todo o país, e é claro que sua mãe estava morrendo de preocupação por você, junto com basicamente todos que você conhecia. O rebuliço havia sido tão grande, que no dia seguinte você já estava retornando para Musutafu – e olha que você ainda tinha pelo menos três dias em Hosu.

Seus ferimentos não eram graves, você apenas baixou sua pressão muito rapidamente, as tonturas te causando náuseas crônicas pelo curto período que você esteve no hospital. Se não fosse pela antiga facada (na qual o médico lhe alertou para não fazer nenhum movimento brusco, pois não estava curada por dentro) ter sido aberta com toda a tensão e a dificuldade do dia, você teria sido liberada muito mais rápido do que foi. Seus amigos haviam quebrado vários ossos do corpo, então você definitivamente foi a que teve a maior sorte no meio dos estudantes.

Vários heróis eram encaminhados no hospital pelo tempo em que você vagava pelos corredores, esperando que Midnight a levasse de volta para casa. Era deprimente vê-los, seus rostos queimados, contorcidos em agonia, seus puros corações que apenas desejavam proteger agora ardendo em dores. Por um momento, você até desejou que tivesse uma individualidade de cura, para ser um pouco mais útil.

"Mas não, estou presa com a individualidade de um ser que nunca sequer participou na minha vida". E aqui estava você, pensando novamente no seu pai. É engraçado, porque toda vez que pensa nele, o imagina de um jeito diferente. Afinal, como você poderia saber com o que ele se parece? Todas as fotos ficam no sótão, a única cópia da chave estando sempre com sua mãe, e é claro que você não poderia simplesmente dizer "oh então, gostaria de ver as fotos do pai que nos abandonou, sim aquele mesmo que você nunca se recuperou do sumiço". Toda vez que você ousou falar do seu pai, você via sua mãe num extremo estado de tristeza. Quase como ela propositalmente se forçasse a esquecer de sua existência, e você estourasse essa bolha protetiva.

Você deixa seus devaneios assim que seu celular vibra:

Olheiras duplas, às 19:07:

Tá tudo bem? Você tá encarando aquela senhora de idade faz um tempo.

Ela já está ficando com medo.

Olhando em volta pelo metrô — que você tinha entrado sem sequer prestar atenção, acompanhada de Midnight — você percebe que, realmente, estava encarando uma senhora de idade, encolhida em um canto. De todos os lugares do vazio metrô, você justamente encara a única pessoa que não é nem você, Midnight, Shinso ou Aizawa. Você rapidamente se desculpa, completamente envergonhada. Você escuta algumas risadas baixas absurdamente perto da sua orelha direita, arrepiando sua espinha.

— Está atrás de mim, mas ainda me faz ter o trabalho de checar a mensagem? — você pergunta, cruzando os braços. O metrô balança, tentando passar pelos escombros da cidade.

— Achei que fosse ser divertido. — Shinso apenas dá de ombros, fechando os olhos. — E também... É a perfeita hora para conversarmos. — você continua o olhando, ele toma isso como uma chance para continuar. Nezumi se afasta, começando a cochichar com Aizawa. — É só que... Como eu digo isso... — suas mãos nervosamente brincavam uma com a outra, evitando seu olhar penetrante e curioso. — Bom, dado tudo que aconteceu, acho que não é uma boa hora. Talvez você precise de um tempo para assimilar as coisas. — as madeixas escuras caíam levemente sobre seu rosto, sua mão fazendo pequenos redemoinhos nos cabelos curtos de seu pescoço, como de costume. Ele parecia muito mais tenso do que o normal.

— Bom, você começou, então agora vai terminar. Por favor, continue. — você diz, não quebrando o contato visual por um segundo. Shinso pareceu ficar ainda mais tenso, olhando para tudo, menos você. — Anda, o que foi? Não está parecendo a mesma pessoa que estava zoando com a minha cara quando encarei aquela senhorinha. Eu preciso assimilar as coisas, ou você?