Capítulo 1 - FEIXE DE LUZ

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Era a primeira manhã de sábado, em muito tempo, que o sol resolveu aparecer entre as carregadas nuvens que já tinham virado rotina nas últimas semanas no céu carioca. O que com certeza causava bastante estranheza na maioria dos moradores, que não estavam acostumados com tantos dias nublados seguidos na cidade maravilhosa. Sentiam falta do sol.

Mas apesar dos raios de luz que passavam pela janela principal daquele apartamento de pouco mais de cinquenta metros quadrados incidirem diretamente no seu rosto recém adormecido no sofá - que na verdade já tinha se transformado em cama há muito tempo - Juliana ainda parecia imersa demais na nebulosidade das últimas semanas para despertar com um pequeno feixe de luz. Aquela luz pode não ter consigo, mas a energia particular e inabalável daquele serzinho cabeludinho de pouco mais de um metro definitivamente era um despertador e tanto.

Miguel: Madrinha Juh!! Acorda!! A gente vai se atrasar!! - gritava o garoto enquanto sacudia os ombros de Juliana.

Juliana: Oi meu amor...calma...ainda... ainda é cedo.. - parecia tão difícil montar uma frase completa quanto abrir os olhos com aquela luz vinda da janela.

Miguel: Não!! Já são 8h!! O campeonato começa de 9h!

Juliana levantou num pulo do sofá e despertou tão rápido como se tivesse levado um choque. E com os olhos já despertos conseguiu levar um choque maior ainda ao ver o furacão que parecia ter passado na sua sala. Parecia uma casa de um adolescente após ter dado a maior festa de todos os tempos com centenas de jovens, que na verdade talvez tivessem deixado a sala em melhor estado. Mas não era nada nem próximo a isso.

Na noite anterior era só ela, encarando a madrugada. Ela, suas garrafas de vinho, e sua profunda solidão. A nova rotina que tinha tomado conta da sua agenda no último mês. Se via tão só, que custava a perceber que na verdade tinha companhia, dividindo aqueles mesmos metros quadrados, e que precisava dela mais do que nunca.

Os últimos dias nublados do Rio pareciam ensolarados - na verdade - perto da tempestade que tinha tomado conta da vida de Juliana sem aviso prévio. Mas talvez aquela luz discreta que insistia em iluminar aquela sala, que tentou - sem sucesso - despertá-la, pudesse significar alguma coisa.

Juliana: Meu amor, me desculpe! Eu tava completamente esquecida do campeonato! Vamos! Temos que correr! - disse agitada enquanto beijava suavemente a testa do seu afilhado e planejava como ia conseguir atravessar a cidade em pouco menos de uma hora.

Miguel: Eu já tô pronto! Minha mochila também! - disse o garoto todo orgulhoso

Juliana: Ah meu anjo... - suspirou em meio a um abraço fraterno no garotinho - às vezes eu esqueço o quanto você cresceu. Vamos lá! Vamos ter que bater o recorde hoje ok? - disse enquanto trocava de roupa rapidamente e pegava a bolsa para sair enquanto desviava de toda bagunça.

Com um pouco de sorte - que deve ter vindo junto com o dia ensolarado - eles conseguiram atravessar a cidade e chegar ao centro aquático com apenas dez minutos de atraso.

Juliana: Vamos meu anjo! Vai dar tempo! Estamos quase lá! Esse recorde vai ser nosso heim! - disse enquanto corriam de mãos dadas entrando no complexo esportivo.

Ela deixou que o garotinho guiasse o restante do caminho, não tinha ido quantidade de vezes suficientes aos treinos para saber de cor onde ficava a concentração dos pequenos atletas. Passaram pelo último portão, com a ajuda dos crachás que, felizmente, Miguel lembrou de levar, e quando já estavam dentro do local de competição, mas ainda correndo ofegantes - embora já não precisasse mais de pressa - ouviram alguém adverti-los.

Valentina: Ei, vocês dois! Cuidado! Essa área já tá muito molhada, correndo assim vocês podem se machucar!

Os dois pararam imediatamente e viraram encabulados com a advertência.

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