Capítulo 15 - QUE TIPO DE SURPRESA?

341 38 4
                                    

J: Ufff... daqui a pouco não consigo mais carregar esse garoto. - suspirou Juliana colocando Miguel na cama, enquanto Valentina esperava de pé na porta do quarto.

Depois de cobrir o afilhado e carinhosamente depositar um beijo na sua testa, Juliana seguiu em direção a Valentina e fechou delicadamente a porta, mesmo sabendo que dificilmente algum barulho despertaria o menino daquele sono tão profundo.

V: Então... vamos ao banquete?

J: Simmmm, por favor! Tô morrendo de fome! - respondeu Juliana abraçando Valentina pela cintura e seguindo em direção a sala.

As duas se sentaram no tapete, e começaram a comer sem compartilhar muitas palavras. Os primeiros quinze minutos foram de completo silêncio. Algumas poucas trocas de olhares apenas.

V: Tava com fome mesmo né? - Valentina quebrou o silêncio primeiro, como de costume.

J: Muita! - respondeu ainda com a boca cheia e tentando segurar o riso. - E você não vai comer nada não? - completou percebendo que Valentina praticamente não encostou em nenhum prato.

V: Eu não aguentei esperar tanto tempo de barriga vazia né? Belisquei umas coisinhas aqui e ali... Se tu não tivesse demorado tanto...

J: Aliás... como foi que vocês chegaram nisso heim? - Juliana perguntou finalmente deixando o hashi um pouco de lado.

V: Miguel que me contou...

J: Mas assim? Do nada? Acho que ele não ia falar assim de repente...

V: Ah... o assunto surgiu...e ele acabou explicando como funcionava nos outros anos.

J: O assunto surgiu? - Juliana soltou um risinho debochado e foi se aproximando de Valentina, ainda sentada no tapete. - Então vocês têm conversado bastante né?

V: Sim. Altos papos... - Valentina soltou um risinho frouxo enquanto fingia procurar algo na mesinha para comer.

J: Vai... fala a verdade. - ainda sorrindo, Juliana colocou os cotovelos na mesinha de centro e apoiou o rosto nas mãos cruzadas enquanto esperava uma resposta.

V: Tá bom... - Valentina tentou disfarçar o sorriso inevitável - Digamos que... eu tava querendo planejar uma surpresinha pra você, e coincidiu de ser hoje, e então Miguel não se mostrou muito..... entusiasmado. Daí me contou dessa "famigerada data". E aí o assunto da noite do sushi realmente surgiu. E foi isso. - completou meio encabulada, voltando a pegar outro sushi só para tentar encerrar o assunto.

J: Uma surpresinha? Mas que tipo de surpresa?

V: Não vem ao caso, ué. Surpresa é surpresa.

J: Mas porque você tava preparando uma surpresa se nem sabia que era meu aniversário? É alguma data especial, por acaso? É aniversário de namoro é? Olha, eu não sou nem um pouco ligada em datas, acho que deu pra perceber né?

V: Sim. Super deu pra perceber! - Valentina soltou um risinho - Mas não. Não era nenhuma data especial. Também não sou muito ligada em datas. Quer dizer... sou ligada sim, mas... não preciso de uma data pra fazer alguma coisa... acho que surpresas em dias comuns são muito mais especiais. - soltou o já conhecido sorrisinho de canto que derretia completamente Juliana.

J: Concordo. Por isso mesmo, acho que eu merecia receber essa surpresa agora, não acha? Já que hoje é um dia qualquer. - Juliana foi se aproximando mais e mais de Valentina que estava do outro lado da mesinha de centro.

V: Oxe, mas claro que não! Eu não preparei tudo ainda. Sinto lhe informar, mas você vai ter que esperar outro momento.

J: Bom, então deve ser muito em breve né? Não tem tantos dias assim pela frente... - Juliana deixou escapar aquilo naturalmente, quebrando um pouco o clima descontraído que se mantinha naquela conversa, e tocando pela primeira vez no assunto até então "proibido".

Inevitavelmente o sorriso super iluminado de Valentina sumiu, dando espaço a um longo e lamentador suspiro. E o silêncio, que na maioria das vezes era apenas um belo momento de contemplação e desfrute da companhia uma da outra, naquele momento era incômodo e desconfortável, como justificavelmente deveria ser.

V: Ok. Você venceu. Mas... que fique bem claro que vou ter que improvisar um pouco tá? - Valentina quebrou o silêncio, mais uma vez, e se preparou para levantar do tapete.

Apoiou um dos joelhos no chão, e segurou a mão de Juliana que, àquela altura, já estava coladinha do seu lado.

J: Valentina... O que você vai fazer pelo amor de Deus? - Juliana arregalou os olhos totalmente surpresa enquanto segurava a mão direita de Valentina e olhava para ela ajoelhada na sua frente.

V: Eu só tô me apoiando pra me levantar mulher, calma. - Valentina caiu na risada enquanto completou o movimento e se levantou de vez até ficar totalmente de pé. - Mas também, bom saber né? Porque se essa fosse a surpresa eu já desistia de fazer agora mesmo. - continuou rindo e olhando para Juliana que não conseguia se mover ainda sentada no chão.

J: Idiota! - Juliana soltou um riso um pouco acanhado e deu uns tapinhas na perna de Valentina. Ainda estava internamente se recuperando do susto repentino de imaginar um possível pedido de casamento àquela altura do campeonato.

V: Se bem que... Se a gente passou a dividir o mesmo lar em menos de uma semana, meu amor... casamento em três meses seria até atrasado, né? - Valentina abriu aquele sorriso que só ela tinha, e quebrou toda tensão que tinha começado a surgir na conversa.

Ambas caíram na risada naturalmente, e Valentina estendeu as mãos para ajudar sua namorada, ainda um pouco perplexa, a se levantar do tapete. E num movimento só, puxou ela para perto de si, envolvendo seus braços ao redor da cintura.

V: Agora pensando direitinho... já não sei mais se é uma boa surpresa. Pode ser que seja um pouco idiota, ok? Eu costumo ter ideias bem idiotas às vezes - Valentina falou rindo e tocando pausadamente com o dedo indicador no nariz de Juliana, enquanto seus braços continuavam abraçando-a pela cintura.

J: Mais idiota que um pedido de casamento agora? Acho difícil. - Juliana riu com muito mais leveza e sem nenhum constrangimento, completando a fala com um selinho.

V: Ok... Então, espera aqui, tá? Esse não era nem o lugar, nem o figurino que eu tinha planejado. Me dá dez minutinhos... - Valentina devolveu o selinho e seguiu em direção ao quarto.

J: Figurino? Val... que é que você tá aprontando heim?

Cinco, dez, quinze minutos se passaram, e nenhuma das duas falaram nada. Valentina continuava no quarto, e Juliana ficou esperando no sofá.

V: Juls? Cadê tu? - Valentina chamou do quarto, esperando que Juliana aparecesse. Não obtendo resposta. - Ô mulher, depois de dez minutos tu já podia vir, entendesse não, foi? - saiu do quarto falando, em direção a sala.

Juliana tinha adormecido no sofá.

V: Ah, não acredito! - Valentina riu e colocou uma duas mãos na cintura em sinal de indignação.

Ficou parada ali em pé, por mais uns dez minutos, apenas observando Juliana adormecida toda torta no sofá. Um misto de coisas passava pela sua cabeça naquele momento. Ainda estava impressionada com o quanto aquela mulher deitada na sua frente podia significar tanto na sua vida em tão pouco tempo. Nunca havia sentido algo assim.

Tudo aconteceu tão rápido, que ela não tinha parado para pensar ainda na excepcionalidade daquele sentimento. Se entregou rapidamente àquilo sem nem se dar um momento para pensar que nunca tinha se sentido assim antes. Em um verdadeiro estado de plenitude.

Nem mesmo o fato de saber que em poucos dias tudo poderia sucumbir, diante da necessidade que tinha de retornar para Recife, conseguia desestabilizá-la de alguma forma. O que estava sentindo era tão gigante, tão intenso e tão real, que transformava o medo de perder tudo rapidamente em uma certeza inexplicável de que teria aquilo para sempre. Não sabia exatamente como. Nem em quanto tempo. Mas sabia e sentia que tudo ia ficar bem. E queria poder externar tudo isso para Juliana, porque sabia que essa certeza não era tão recíproca.

Seguiu em direção ao sofá, e com os pensamentos ainda meio tumultuados tropeçou na poltrona, acordando Juliana do sono que já parecia profundo.

É mais que um poemaOnde histórias criam vida. Descubra agora