1º Capítulo - Para Dançar Com a Morte

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Existe uma lenda na Grécia antiga sobre  um homem chamado Dâmocles. Um cortesão bastante invejoso da corte do tirano Dionísio. Certo dia, o rei ofereceu-se para trocar de lugar com Dâmocles, com o objetivo de puni-lo pelas bajulações, mas disse que queria dá-lo um dia para sentir o prazer de todo aquele luxo e autoridade. No meio da glória de Dâmocles o rei ordenou que uma espada fosse pendurada sobre sua cabeça, presa por um único fio de crina de cavalo. Ao ver a espada ele se desesperou, perdeu o interesse pela fortuna do rei e abdicou de seu cargo.

A Espada de Dâmocles simboliza algo que pode nos ser tirado de repente. Como por exemplo: A vida. É difícil para algumas pessoas pensar sobre o quão curta pode ser a existência humana e ouso dizer que a maioria delas não gosta de cogitar sobre o próprio fim. O que é enigmático, na minha opinião, já que provavelmente a morte é nossa única e grande certeza.

Não posso dizer que não estou incluída nesse grupo de pessoas, mas de certa forma não sinto medo. Todos os dias eu descubro coisas novas sobre mim mesma, coisas que me deixam curiosa e inquieta, mas que também fazem eu me sentir segura e mais forte.

Seria mórbido dizer que eu e a morte temos uma ligação?

Termino de preencher o prontuário e entrego para uma das enfermeiras com um sorriso educado no rosto. Solto uma respiração longa assim que ela se afasta e faço movimento circulares com o pescoço. Eu definitivamente estou um caco, o que era de se esperar depois de um plantão de trinta e seis horas, mas não posso reclamar. Estar dentro das paredes desse hospital, pulando de cirurgia em cirurgia, me deixa motivada e me ajuda a ocupar a mente com coisas produtivas.

— Precisando de meia hora na sala de descanso? — Calleb pergunta bem próximo ao meu ouvido e colado atrás de mim mais do que deveria.

— Isso é um convite doutor? — Respondo com um sorriso animado.

— Acabei de sair de um procedimento de nove horas. — Faz uma pausa ao consertar o estetoscópio no pescoço me dando espaço para ficarmos de frente e assim evitar os comentários. — Então sim. É um convite. — Conclui piscando seus olhos azuis claríssimos.

—Eu realmente estou precisando de uma massagem. Com a língua. — Minha resposta o faz abrir um sorriso branco e satisfeito.

Calleb e eu nos conhecemos durante a residência. Gosto de pensar que usamos um ao outro mutuamente. Algumas vezes para um conselho, em outras para uma cerveja depois de um plantão cansativo. Algumas vezes para surtar quando algum paciente não progride conforme nossas expectativas e em outras para trepar loucamente. Ele gosta de pensar que existe algo não rotulado entre nós e até se sente no direito de ter uma daquelas famosas crises de ciúmes. O que geralmente termina comigo o ignorando por dias já que não tenho tempo e nem emocional para lidar com algo assim.

Confiro as horas em meu relógio de pulso e depois encaro seu rosto proporcional. A barba loira fechada e bem feita o deixa sexy, mas também passa certa seriedade e confiança. Na maioria das vezes eu acho seu rosto reconfortante. Digo depois de alguns segundos:

— Preciso verificar as sínteses de um paciente. Nos encontramos em vinte minutos?

Antes que ele possa responder Lexie se aproxima liberando os cachos negros da touca. Está com uma expressão cansada no rosto, mas continua impecavelmente bonita.

— Como foi o procedimento da Sra. Palmer? — Pergunta.

—Tive que interromper duas vezes, mas ela aguentou firme. Recomendei observação no pós-operatório por mais alguns dias até estabilizar.

— Isso não é justo. Você sempre fica com as melhores cirurgias.  — Não expresso nenhuma opinião, já que provavelmente é verdade.

— Quem eu tenho que chupar para sair do desvio de septo? — Dou um sorriso divertido ao ouvir, então Calleb responde:

Filhos das Trevas - A Última NecromanteOnde histórias criam vida. Descubra agora