Premonição

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Em algum canto do Katathorium, ouviu-se bater o coração de um menino.

Keiha encostava a mão em seu peito, acolhendo a si mesmo. Abrindo os olhos, viu-se liberto, em mais um novo cenário. Sentia-se mais leve. Sorrindo por um instante, não podia perder o foco. Devia seguir seu caminho para se tornar um verdadeiro Guardião Lacrimal.

O guardião em treinamento caminhava, indo em direção à penumbra.

Uma espessa e escura névoa envolveu o corpo do rapaz. Ele sentiu os pelos de seu corpo se arrepiarem. Com os olhos arregalados, suas pupilas dilatavam rapidamente, na tentativa desesperada de enxergar no profundo breu.

Em passos incertos, pisava, causando eco. Devagar, avançava em rumo ao desconhecido.

"Keiha..." ouvia-se uma voz, aos prantos, a reverberar à distância.

O garoto, assustado, em alerta, virou a cabeça em direção ao som, parando.

O mais imenso silêncio se instalou.

...

Mas não por muito tempo.

"Keiha!!"

Em gritos desesperados, em meio ao nevoeiro de sombras, vultos fantasmagóricos avançaram contra o garoto. O colapso da sociedade revelou-se.

Na Terra, incontáveis almas berravam ao ter sua Motus arrancada de seu controle pelo pai de toda maldade. Agarravam-se em Keiha, condenados a afogarem em seu próprio descontrole. Feito de cabo de guerra por todos aqueles que não podia salvar, o guardião em treinamento derramava lágrimas, com seu semblante grifado pelo mais catastrófico medo.

"Parem... Parem..!" implorava.

Sem controle do próprio corpo, manipulado pelo mar de vítimas do Kataklysmo, o simples estudante universitário puxou ar para seus pulmões, soluçando. Gritou:

"PAREM, POR FAVOR!!!"

E, chorando no mais profundo luto por todos aqueles que haviam caído na Terra, espremia os olhos em horror e injúria...

"Está tudo bem agora." uma nova voz masculina, muito reconfortante, reverberou.

Keiha abriu seus olhos, em lágrimas. Protegido por energia verde esmeralda, o viu:

Vestido em uma roupa preta ao mesmo estilo do resto dos Guardiões Lacrimais, suas peças brancas e de adereços verdes apresentavam-se na forma de placas de armadura. Seus cabelos cinzas eram médios e espetados; arrepiados. Seus olhos, verdes na cor da barreira que os envolvia.

Keiha, curvado e caído de joelhos, com as mãos em seus ouvidos, recompunha-se, observando a armadura do guardião que surgia para seu socorro.

"Bem-vindo à sua provação do medo."

Os rodeando, os fantasmas caóticos não podiam ultrapassar ou destruir a barreira de Motus Energia criada pelo protetor.

"Me chamo Aegeus. Essas são as Brumas do Desconhecido... Assustador, não?"

"Sim.." Keiha hesitou responder por um instante, mas viu-se obrigado a concordar.

Ele se levantou, devagar:

"Prazer, Aegeus. Eu sou Keiha Mishima."

O grisalho sorriu para o rapaz:

"Sim, é um prazer." O protetor derramou uma única lágrima, tingida pelo mais característico verde esmeralda que, por sua vez, revelou-se:

Um grande escudo feito de Motus, tão resistente quanto sua vontade.

"Sabe, Keiha... Muitos apontam para o medo como algo vil e cruel, de fácil instabilidade ou como uma possível ameaça.." Aegeus discursava. "No entanto.. O verdadeiro medo não promove o mal..."

"... Mas nos protege dele."

Aegeus estendeu a mão a Keiha.

"Está pronto para provar o seu medo?"

Keiha fechou seus olhos. De seu direito, empunhou sua lágrima.

O guardião do medo sorriu um pouco mais, antes de desfazer a barreira protetora que os envolvia.

Os espíritos desesperados imediatamente partiram para cima dos dois. Ao abrir os olhos, Keiha Mishima saltou, acompanhado por Aegeus, que avançava contra as assombrações com sua poderosa Gun Lacrimam.

Com seu corpo magro e flexível, Keiha manobrava-se pelas manifestações malignas, as desfazendo com cortes rápidos, sempre próximo ao outro guardião na linha de frente.

Em uma pose, Keiha saltava por cima de Aegeus, desferindo um corte horizontal à sua frente, preenchido por sua coragem. Era como se o tempo passasse em câmera lenta...

Após travarem seu caminho pelo nevoeiro, o escudeiro esmeralda sorria na direção de Keiha, o olhando com orgulho. Admirava suas habilidades com sua Lágrima de Motus...

...

E, de súbito, ouviram um rugido.

Das profundezas mais sombrias do desconhecido, a cabeça nebulosa de uma criatura diabólica emergiu. Acompanhado simultaneamente do mais estridente agudo e do mais poderoso grave:

Katastrophe manifestou-se.

Keiha entrou em catatonia. Aegeus gelou. Seus olhos arregalaram-se:

"Keiha!!" ele gritou, tomando a frente com seu grande escudo. "O que isso está fazendo aqui?!! Como..?!" o Guardião Lacrimal cravou sua Gun Lacrimam no chão. Ela ganhava ainda mais tamanho, em expansão. Ele exclamou:

MOTUS LIBERAÇÃO: MEU MEDO..!!

Com todo o ar que podia reunir em seus pulmões, canalizou sua Motus Energia, que explodia como uma sinistra névoa verde esmeralda de sua Motus Marcam, localizada em sua cervical, com seus desenhos feitos na horizontal, na forma de sinistras raízes.

SHUKUFUKU NO EKOU!!

Da Gun Lacrimam de Aegeus, uma poderosa vibração se iniciou, disparando incansavelmente ecos de Motus Energia contra a manifestação diabólica, como ondas sonoras num mesmo ritmo.

"Keiha!! Fuja!!" ele exclamou, lhe dando uma ordem.

Em um golpe desleal, a manifestação de Katastrophe avançou contra Aegeus, rugindo, incontrolável; implacável. Keiha não se movia.

Aos poucos, ainda que catatônico, o corpo de Keiha era tomado por uma incrível força. Seus punhos cerravam ao ponto de estremecerem. Ele encarou o pai de todos os Katharsis:

"Não..!!'

Keiha empunhou sua lágrima solitária mais uma vez, avançando em um único impulso.

"EU NÃO TENHO MEDO DE VOCÊ!!"

No mais intenso deslizar de seu dedo na diagonal, metendo-se entre o guerreiro em esmeralda e a manifestação daquele que traria o fim de tudo e todos, Keiha Mishima produziu uma enorme fenda ciano brilhante em plena névoa sombria, capaz de clarear toda a imensidão das brumas.

...

E assim, viu-se livre delas. 

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