1. Deus grego que chama, né?

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magnus

O ônibus estava muito lotado, como sempre. Magnus olhou para o chão das escadas da porta de saída, se sentindo tentado a sentar ali, mas ainda tinha um resto de dignidade. Poderia fazer isso quando voltasse, tarde da noite, ainda mais exausto. O pessoal gritou em protesto quando o motorista parou mais uma vez para mais passageiros entrarem. Magnus gemeu internamente. Aparentemente o professor de física do ensino médio estava muito errado. Dois corpos podem sim ocupar o mesmo espaço! A prova absoluta era o transporte público nesta cidade infernal.

- Vão para o fundo! - o motorista gritou, e as pessoas reagiram furiosas.

- O senhor pensa que está carregando porcos? - uma menina, de cabelos curtos avermelhados, gritou de volta e a multidão concordou, gritando contra o motorista.

Magnus se sentia exatamente como um porco sendo conduzido para o abate. Estava suando por todos os poros, e sendo apertado em lugares que julgava serem inalcançáveis. Precisava ir para o fundo do ônibus, ou morreria sufocado.

- Com licença- pediu para a menina ruiva que o encarou de volta com ódio, então ele emendou uma desculpa- Eu preciso descer.

Ela se apertou, a contragosto, e ele passou pedindo desculpas às pessoas pelas quais passava. Estava tentando não arrastar ninguém com sua mochila, mas era impossível. Fez um esforço enorme para passar entre uma moça e um rapaz, e tentou não se concentrar no fato de que em outras circunstâncias isso seria praticamente uma orgia. A única coisa que ele sentia era uma crescente vontade de sair dali o mais rápido possível.

Com um suspiro de alívio, conseguiu um lugar menos apertado e fechou os olhos, agradecido. O desgraçado do prefeito deveria ter a decência de providenciar mais ônibus para o transporte público. Segurou-se na barra de ferro e passou a mochila das costas para a frente do corpo.

Então o viu.

Magnus estava em pé no corredor e no banco, em frente a ele, uma senhora cochilava tranquilamente, ignorando o empurra-empurra dos passageiros. Ao lado dela, um anjo de óculos escuros ouvia música com a cabeça encostada na janela. Bane ficou boquiaberto. O rapaz era grande demais para o banco, portanto estava meio encolhido contra a janela, as pernas longas tocando o encosto da cadeira da frente. Os cabelos negros revoltos pareciam crescer em todas as direções.

Ele tinha a pele muito branca e mãos com dedos longos, que repousavam sobre uma bolsa de couro sintético, em seu colo. O nariz era afilado, a boca vermelha tão bem delineada e aparentemente macia, que Magnus mordeu seus próprios lábios, desejoso. A ossatura do rosto dele era perfeitamente marcada, dando um ar aristocrático. Era uma beleza calma e fria, como uma estátua perfeitamente desenhada em parâmetros estéticos só possíveis em obras de arte.

Ninguém nasce tão belo assim, Magnus pensou, e deu uma olhada melhor para ver se encontrava o defeito. O anjo continuava olhando pela janela, ouvindo o que quer que fosse em seus fones, também perfeitamente inabalável quanto à bagunça instaurada dentro do ônibus.

Ele abriu a boca em um bocejo e seus dentes muito brancos e língua vermelha ficaram aparentes... Magnus constatou então, que esse moço ou era uma alucinação visual dele, ou um deus grego perdido no transporte público dessa cidade... O pessoal voltou a empurrar e Magnus, de má vontade, tirou os olhos do rapaz perfeito para olhar à sua volta. Uma mulher grávida estava em pé ao seu lado, parecendo exausta.

- Ninguém te cedeu o lugar? - Magnus perguntou indignado e ela sacudiu a cabeça.

- Não tem lugar.

Magnus olhou ao redor e realmente constatou que todas as pessoas sentadas eram idosas, gestantes, mulheres com crianças de colo e uma moça com o pé engessado.

- Que pena - disse ele- Quer que eu leve sua bolsa?

- Nao precisa - ela disse, mas já estendeu a bolsa em sua direção.

Meu amor é cego || MalecOnde histórias criam vida. Descubra agora