Byron

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América


Faz alguns dias dede que comecei a trabalhar com o senhor Demarco. E assim como eu esperava, a rotina tem sido corrida. Mal tenho tempo para almoçar ou estudar, sempre que posso trago meus livros e um sanduíche para passar a tarde. 

Embora não tenha muita coisa para fazer aqui, só de estar no mesmo local que ele que deixa desconfortável. O silêncio que se instaurou no quarto desde o primeiro que dia que cheguei perpetua até hoje. Caso não seja uma tosse ou o barulho das máquinas, não ouço o Demarco dar uma palavra se quer, ele apenas se volta para a televisão e fica assistindo. As tentativas falhas que fiz em iniciar uma conversa foram recebidas com um olhar de desprezo e por mais que eu tentasse não me importar, isso me emudecia. 

Hoje eu trouxe um livro diferente dos habituais e comecei a lê-lo em silêncio. Levantei para ver se estava tudo certo com o medicamento dele e voltei para a minha poltrona, seu olhar não saiu da tevê. Foquei nas páginas que estavam a minha frente e parece que o meu riso o interessou. 

- Está louca se ri para essas páginas. - ele disse com uma voz áspera. 

Confesso que isso foi inesperado. Primeiro porque ele nunca falara por vontade própria, segundo, ele tinha desligado a tevê. 

- É um bom livro. - falei voltando a ler. 

Ele terá que fazer um esforço maior do que esse se quiser conversar comigo. 

- Um bom programa de tevê rende risadas, um bom livro, intelectualidade. 

- É amante da leitura, Demarco? 

- Prefiro assistir a ler. 

- Isso explica muita coisa. 

- O que disse? - ele perguntou me acusando. 

- Essa história tem mais de duzentos anos, impossível não render uma intelectualidade, mas ainda assim, é divertido. 

- A comédia existia nessa época? 

- Como não? - perguntei. 

- E você dá risada mesmo nesse estado de apatia. 

Dei de ombros. 

 - Deve ser um bom livro. - uma outra tentativa dele de puxar assunto. 

- Sim. Frankenstein. 

- Eu já vi filmes sobre, é daquele médico que cria um monstro com partes de pessoas mortas? História para criança. 

- Aí que está velhote, o monstro não era monstro, na verdade ele queria ser humano e é isso o que faz interessante. 

- Qual o seu ponto?

O fato de pela primeira vez estar tendo uma conversa com o Demarco era realmente inesperado. Hoje quando estava vindo o Christian disse que algo inusitado iria acontecer no meu dia e por mais que eu não acredite em coisas do tipo, parece que está acontecendo. Tentei não me convencer de isso era singular e formulei tudo o que eu penso a respeito da obra para conversar com esse velho. Talvez assim ele se abrisse e me contasse o que fez ele retornar a si. 

- O Victor, o cientista, toma o poder de um deus para si, sendo o criador da aberração, que em sua ínfima existência tenta entender o porquê de tudo aquilo. É uma criatura sem propósito, apenas para servir de estudo a um homem que prova de uma das virtudes do mundo. 

- Acredita de seja como nós? Estamos aqui sem saber o motivo de nossa existência? 

- Talvez? - questionei - O fato é que nós humanos tentamos nos livrar de emoções para tomar decisões de forma racional, mas esse ser, ele tenta ser humano a todo custo, ele quer sentir, quer saber o que é ser humano. 

- Essa criatura somos nós dois. - ele concluiu e colocou a mão na boca. 

Fiquei em silêncio diante da conclusão dele, não tinha chegado tão afundo disso, mas fazia sentido. 

- Na verdade, nesse momento, a criatura é você. - Demarco disse olhando para mim e eu engoli em seco. 

- Talvez eu seja. - respondi e fechei o livro. 

- O que levaria um homem a escrever tal obra? A natureza dela é perturbante. 

- Foi uma mulher que escreveu. - virei o livro e mostrei a foto da autora - Ela escreveu na mansão de um homem chamado Lord Byron e há muitas especulações sobre o que aconteceu na localidade em que ela escreveu. Desde rituais até aparições de fantasma. 

- Isso explica tudo. - ele disse e deu risada - Parece interessante, leia o livro para mim, América, também quero rir. 

- Não sabe ler? - perguntei. 

- Vou ligar a tevê. 

- Eu leio. - falei rapidamente e comecei a ler. 



Dei um beijo no Christian assim que o vi. Ele tinha razão. 

- Oi! - ele disse e me segurou pela cintura. 

- Você é um vidente? - perguntei. 

- Não, por quê?

- Algo inusitado aconteceu hoje. Você disse que aconteceria, lembra? 

- Lembro. - ele disse e pegou um papel no bolso - Eu li em um biscoito da sorte. 

Beijei-o novamente, mas fomos interrompidos pela minha irmã. 

- Querem fazer um bebê também? - ela perguntou - Primeiro temos que entregar uma surpresa, depois fazemos a de vocês. 

- Ei, é hoje? - perguntei a ela e ao Christian - Esqueci totalmente. 

- Vamos, irmã, vamos fazer algumas pessoas felizes. - Lana me puxou pelo braço e fomos andando - Aposto que eles vão amar. 

- Estão ganhando de graça, óbvio que irão. - falei e ela revirou os olhos. 

- Falo isso porque eu que decorei. 

- É, acho que eles irão achar razoável. - falei e ela me empurrou. 

- Trouxa! - Lana olhou para trás e gritou - Vocês vão vir? 

Olhei também e vi o Piter, Joana, Carla, Nick, Christian, Miles e Josh. 


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