O rancho da família

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América

- Para! Você não pode colocar ela de castigo! - gritei em vão para o papai. 

Todas as tentativas de remissão foram ignoradas, a Lana se ajoelhou, trouxe flores, chocolate e mesmo assim papai e mamãe estavam bravos com ela. Sabia que a Lana tinha desobedecido, mas não sabia a proporção de que isso iria tomar. 

- Posso e irei! - ele gritou de volta trancando a Lana no celeiro.

O cadeado grande segurando as correntes era pesado na ponta dos meus dedos. Do outro lado, eu ouvia os gritos agudos da minha irmã. Gritos que cessaram à noite. E eu sei disso porque fiquei acordada a noite toda do lado de fora com um pedaço de madeira na mão para tentar afastar qualquer monstro. 

Acordei no susto e derrubei o café na roupa. 

- Merda! - exclamei e comecei a limpar, mas não estava saindo - Que ódio!

- Noite mal dormida? - Lana perguntou enquanto dirigia. 

- É, você e o Piter foram embora, mas o resto de nós dormiu lá, amontoado. Parecia festa do pijama infantil, sabe? Ninguém queria dormir mesmo estando cansado. 

- Não acredito que perdi isso! - ela disse dando risada. 

- É, foi um caos. - continuei limpando o café da roupa. 

Olhei pela janela do carro e vi a entrada da nossa cidade. Sempre a mesma, o prefeito nunca a arruma ou enfeita. A mesma visão de cidade esquecida sempre que venho para cá. 

- Sonhou comigo? Você ficava toda hora "Lana", "Lana". 

- Eu não falo dormindo. 

- Claro que fala, como foi?

- Lembra de quando você saiu com a gangue de motoqueiros? Tinha o quê? Oito anos? 

- Nossa!!!!! Eu lembro!! Foi a aventura mais incrível da minha vida. - ela falou toda empolgada trazendo as lembranças à tona - Mas aí tentaram me molestar, papai apareceu bem na hora. 

- Deu uma surra nos motoqueiros e levou outra. O velho sabia se divertir. 

- Ele e o tio Half foram sensacionais naquele dia. Aliás, nunca mais o vi. 

- Dizem que ele sofreu um derrame. 

- Sério? - Lana saiu da faixa e eu mexi no volante - Temos que visitá-lo, Ame.

- Um dia, quem sabe. - falei olhando para a entrada do racho que estava cheia de carros - Agora, precisamos saber o que rolou aqui. 



Três dos meus locais favoritos podem ser listados atualmente e dois deles ficam nesse rancho: a minha cama de infância e o campo. Moramos aqui desde que eu me entendo por gente. De acordo com os meus pais, eles venderam os escritórios no centro da cidade e vieram para cá. Sempre se empolgavam contando as histórias de como fizeram tudo para nos dar o melhor conforto. 

De um tempo para cá, mais precisamente após o meu acidente, o rancho parou e toda a nossa economia foi usada para bancar meus remédios e tratamentos. Insisti inúmeras vezes para que deixassem isso de lado, mas não conseguiam. E eu entendo, nenhum pai mediria esforços para manter a saúde dos filhos. 

Agora o caso era mais sério, o prefeito estava cobrando de uma vez todos os impostos e empréstimos que foram ignorados esses anos. Foi dito por ele que não podia mais sustentar as famílias carentes daqui sem que lhe entregassem nenhum real. 

- Mas não tem nada que possamos fazer? - questionei - Nós podemos pagar a dívida. 

- Receio que não, senhorita Harrel, a dívida é uma quantia enorme que a sua família não tem e precisa ser paga em espécie. - o advogado respondeu pelo prefeito, ele nem sequer olhava na nossa cara. 

- Então vão tirar o rancho de nós? Onde diabos iremos morar? 

- Calma, filha. - minha mãe acarinhava meu ombro - Tentamos de todo o possível. 

- Pai? - Lana olhou para o meu pai que lia os papeis. 

Enquanto nós estávamos conversando dentro de casa, do lado de fora alguns homens faziam a medição da propriedade. Pelo visto, o prefeito tinha planos para ela. 

- Bem, parece que é isso. - ele disse e entregou os papeis ao outro advogado - Não há nada de errado nesses papeis e quando eu assinei o contrato, estava ciente disso. 

Lana fungou e Josh mexeu nos cabelos dela. 

- Bem. - o prefeito levantou do sofá - É isso, temos tudo já. 

- Quanto tempo? - meu pai perguntou. 

- Dez dias, pela amizade. - ele disse e saiu pela porta. 

De repente, a sala ficou vazia. Todos os desconhecidos seguiram o prefeito, entraram em seus carros e foram embora. Nenhuma palavra foi dita enquanto isso acontecia. Nós que ficamos estávamos absorvendo o que foi despejado. Despejado, é como estou me sentindo agora. Expulsa da minha própria casa. Não é um sentimento bom. 

- Quanto?

- Cento e cinquenta mil. - meu pai disse e Lana cuspiu a água que estava bebendo. 

- Tudo isso?!!

- Não é muito. - falei. 

- Então pague. - minha mãe disse e eu olhei para ela com a cara feia, me soltei e sentei no sofá, de frente para o meu pai. 

- Podemos pagar isso? 

- Se tivesse como, já o teria feito. - ele respondeu.  

- Estou trabalhando, posso conseguir um empréstimo. 

- E criar outra dívida? 

- Ao menos não é com o prefeito escroto. - Josh e disse e todos olhamos para ele - Desculpem-me. 

- Ele tem razão. - Lana falou. 

- Podemos desalugar os quartos na fraternidade e pegar os do campus, vender a loja da mamãe no centro e o meu carro. De resto, conseguimos empréstimo. 

- Já estimei isso, a conta não fecha. 

- E quanto ficaria faltando? - perguntei

- Cinquenta mil. 

- Temos dez dias, podemos tentar resolver, se abaixarmos a cabeça, vamos perder o lugar onde sempre moramos. 

Meu pai estava com a cabeça abaixada, mas mesmo assim dava para ver as lágrimas molhando sua calça. 

- Vamos conseguir o dinheiro, eu prometo. - falei. 


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⏰ Última atualização: Mar 04, 2021 ⏰

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