A Larva

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Ainda há muitos anos atrás...



Ela pensou estar em um pesadelo. O ar lhe faltava. Não havia lágrimas, havia pânico, medo e dor. Ela tremia como se estivesse congelando, mas não havia frio. A menina era dois anos mais velha que ela. Mal falava, mal olhava para Carolina sem tremer, sem começar a entrar em pânico como se estivesse vendo o próprio demônio. Não sabia quando tempo havia se passado com elas trancafiadas naquele cativeiro. A moça lhe contou que o pai do garoto havia posto ela ali, todos os dias era uma nova tortura para ela. Carolina forçou os olhos sobre os traços e reconheceu a menina de uma reportagem, ela havia desaparecido há alguns meses, e o mais surpreendente era que a garota era de uma região contrária da qual elas estavam agora.

-Quanto tempo está aqui?

Carolina arriscou perguntar a garota.

-As vezes parece um dia, as vezes uma eternidade.

Então ela se calou. Nenhum barulho vinha dos arredores até que um ranger de madeira chamou atenção. A menina de cabelos claros arregalou os olhos, o peito subia e descia descompassado, ela estava entrando em pânico e Carolina sentiu que devia ter medo, pois se ela estava apavorada, era porque coisa ruim viria. A porta foi escancarada com um baque surdo e o homem velho adentrou o ambiente com as botas raspando o chão. Ele observou as duas e então andou em sua direção. Ela se levantou com dificuldade raspando as mãos nas paredes, sentia medo, pavor! Ele estava claramente embriagado. Então ele parou e a olhou de cima a baixo antes de dar um sorriso extremamente cruel. Pela primeira vez desde à hora em que foi presa naquele ambiente, Carolina sentiu lágrimas lhe escorrerem a face e o medo mais perturbador que já havia sentindo em toda sua vida. Ela cogitou em correr para a porta, mas teria que ultrapassar a barreira humana que o homem causava. Como se adivinhasse o que ela pensava, ele assoviou e o filho entrou no cativeiro trancando a porta em seguida. Max caminhou até ela e não parou. Ela grudou os pés no chão e tentou se desvencilhar dele, mas a puxada em seu coro cabeludo a colocou de joelhos.

-Por favor, me deixe ir.

Implorou ela com os olhos embaçados.

-Não posso. Sinto muito.

Sussurrou ele.

Ela poderia ter sentido pena dele se não tivesse notado a falta de remorso em sua voz. Era fria e, o olhar tinha uma áurea violenta que fez os dedos dele apertarem mais seus cabelos e empurrá-la mais para o chão. Ela tentou baixar os olhos focando na madeira abaixo de si, mas ele não deixou. Tentou fechar as pálpebras, mas ele deu um solavanco em sua cabeça e forçou ela olhar enquanto o homem velho, bêbado e cheirando a fumo batia os braços da outra menina no assoalho. Forçava o corpo sobre ela, apertava as coxas magras e finas da menina ao lado com violência. Carolina chorou não pela dor em seu corpo ou em sua cabeça, chorou por não poder ajudá-la. Por não poder salvar a garota enquanto aquele monstro arrancava a alma da menina.

Os espasmos no corpo da garota eram sentidos no fundo de sua alma, a raiva reverberou por todo seu corpo. Ela queria salvá-la! Precisava fazer isso por elas. Carolina se debateu no chão e a sola do pé do rapaz foi parar em suas costas. Ela rosnou como um animal em resposta e ele sorriu, o pai havia sorrido. Eles se divertiam com a sua ira. O garoto a levantou do chão sem nenhuma delicadeza e a jogou contra a parede antes de sair do quarto seguindo ao pai. Ela esperou ouvir os estalos das trancas antes de correr até a menina. Levou as mãos ao ombro da garota que se afastou em desespero. Ela estava fora de si. Como se sua mente fugisse para um lugar bem longe enquanto aquele monstro a violentava.

-Eu vou tirar você daqui.

Sussurrou ela para a garota sem nem saber como, mas precisava dizer. Se elas não fugissem com vida, ela tiraria a vida das duas, mas não deixaria aqueles monstros arrancarem tudo delas. O olhar da menina continuou perdido quando se deitou no colchonete. Continuou perdido quando Carolina a limpou com um pedaço do lençol. Continuou totalmente perdida quando Carolina segurou sua mão e jurou que salvaria ela e todas as outras que tivessem de enfrentar este mesmo destino. Ela jurou e selou sua promessa limpando as lágrimas de seu rosto em um pedaço de lençol limpo, o molhando para poder limpar as partes com sangue já seco espalhados pelo corpo da menina.


~

As pálpebras pesavam, mas ela não conseguira dormir. Sabia que a noite havia chegado e logo o dia também, pois o quarto se tornara totalmente escuro e agora luz entrava pelas frestas da janela. Ela se perguntou se seu pai estaria lhe procurando. Perguntou se a amiga ligaria um fato ao outro para achá-la. Deixou que as lágrimas queimassem suas bochechas naqueles ínfimos minutos. A garota de cabelos claros havia reagido algumas vezes, e Carolina tentou falar com ela, mas mal obterá um olhar. E naquele instante Carolina tinha ouvido da menina que era impossível fugir, não haveria chance para elas. Então suas únicas esperanças era seu pai e sua amiga. A porta se abriu o suficiente apenas para alguém enfiar uma bandeja dentro do cômodo.

Seu olhar desconfiado estudou a bandeja e a menina do outro lado, pensou se haveria alguma coisa para deixá-las moles e eles se aproveitarem. Ignorou o ronco no estômago e não comeu mas a fome começava a doer. Chegou próxima a bandeja e escrutinou o pão fresco e o café fumegante. Cheirou, abriu vendo o que tinha dentro e mordeu. Estava com uma fome enorme, mas suspeitava que sua fome não era de comida, mas de liberdade. "Coma" ordenou com o olhar para a garota do outro lado, mas a menina continuava sua busca pela morte.

-Nós vamos sair daqui. Preciso que coma.

Disse ela em uma última tentativa. Vendo que a garota não iria mexer um músculo, pegara pedaços pequenos do pão e fora ao encontro da menina alimentando-a não só seu corpo como também sua fome pela liberdade.



Continua em breve...

Carolina Reaper "Pequena, meiga e fatal" •Vol 3 (EM ANDAMENTO)Onde histórias criam vida. Descubra agora