decisão

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Acordei com a minha mãe passando a mão pelo meu cabelo. Olhei depressa para a janela e vi que já tinha anoitecido. Eu havia caído no sono sem perceber.

"Que horas são?", perguntei me sentando. Eu tinha mandado um e-mail revoltado para a Heather mais ou menos às cinco da tarde. Em seguida, fiquei ouvindo músicas tristes. E devo ter adormecido logo depois.

"São oito e meia", minha mãe respondeu. "Vim ver se você estava bem e notei que seu sono estava muito agitado, acho que era um pesadelo."

Sim, um pesadelo que não tinha terminado depois que eu abri os olhos.

"Quer comer alguma coisa? Eu pedi uma pizza."

Seria ótimo... Se eu estivesse com um pingo de fome que fosse. Eu não estava com vontade de comer nem um farelo de pão. Meu apetite tinha ido embora junto com minha vontade de viver.

Ao ver minha expressão desanimada, minha mãe disse: "Will... Ficar aqui no quarto chorando não vai adiantar nada. Só vai piorar sua tristeza. Eu sei que você está arrasado pelo fato do Michael não ter ter entendido direito, mas por que você não liga para ele e esclarece? Converse mais uma vez. Duas, três, quantas vezes forem necessárias! Não adianta ele ficar de lá com raiva, você de cá triste, e os dois com vontade de estarem juntos, mas sem saberem disso."

"Ele não quer mais ficar comigo...", falei sentindo meus olhos começarem a lacrimejar mais uma vez. Será que aquilo não ia mais parar?? "Ele cortou qualquer elo, qualquer desculpa que eu teria para ligar pra ele."

"Quem disse que você precisa de desculpas?"

Eu não respondi, e ela então se levantou, fechou a porta e a trancou. E depois se sentou bem perto de mim.

"William, você e o Michael ficaram juntos por muito tempo. Vocês cresceram um ao lado do outro. No ano que vem vocês já não estão mais no colégio. Daqui a pouco completam 18! Não dá pra ficarem agindo como se ainda tivessem 13 anos de idade. Não tem que ter joguinho ou receios... Se está a fim de conversar com ele de novo, faça isso. Esclareça o que foi mal interpretado. Mas, antes, pense bem no que vai falar. Porque, pelo que eu estou vendo, você nem está certo do que quer."

"Eu só queria um tempo pra pensar, já disse!", falei meio impaciente. "E foi isso que eu falei pra ele. E também porque eu realmente achava que, se ficasse longe de mim um pouco, ele iria me valorizar mais. Mas não era pra ele desistir de mim assim tão fácil, ir embora... Eu estou confuso! Não quero ficar sem ele, mas estava com muito raiva por ele não me dar mais valor como fazia antigamente. Antes ele fazia de tudo pra me ver feliz... Ele ia comigo a todos os lugares, enfrentava qualquer festa chata de família, qualquer programa entediante, só pra estar ao meu lado. Agora ele não faz a menor questão, não está nem aí pra mim. Acho que, se não fosse pela escola, a gente nem se encontraria. Fora isso, tem muitas coisas que eu inclusive falei pra ele. Ele mudou... Eu queria o meu Mike de volta, aquele pelo qual eu me apaixonei."

"Filho... Tenho certeza de que você também mudou. Quem disse que você continua o mesmo William que encantou o Michael? Mas se afastar só vai servir para aumentar este estranhamento entre vocês. Acho que a chave para resolver isso é o diálago, e não se distanciar ainda mais. Se quiserem, é claro. O mais importante, que é o amor, vocês ainda têm, e eu tenho certeza disso. Mas não deixe o tempo passar muito, porque, por maior que seja, ele corre o risco de morrer se não for cultivado."

Eu fiquei pensando nas palavras dela. Era parecido com o que a Nancy tinha me falado no dia anterior, ela também havia me aconselhado a conversar mais. Mas, antes que eu chegasse a alguma conclusão, minha mãe completou: "E o Michael te dá muito valor, sim. Você não sabe do que está falando. Aliás, acho que vai ser difícil você encontrar na vida algum garoto que te dê tanto valor quanto ele..."

Eu ia retrucar, mas ela não deixou.

"No hospital você estava muito fragilizado, então não pude conversar com você direito. E depois que viemos pra cá, foi uma visita atrás da outra... Eu estava esperando um momento pra poder falar com você a sós."

No segundo em que ela disse isso, desviei os olhos do gesso do meu braço - onde eu estava enfiando uma caneta, pois ele já começava a coçar - e os fixei nela. Quando a minha mãe vinha com aquele tom, eu sabia que o assunto era sério.

"Até hoje eu não sei direito o que aconteceu antes do seu acidente. Todos os motivos que levaram você a sair correndo e tudo o que aconteceu na festa... Mas eu sei o que aconteceu depois."

Ela parou de falar, deu um suspiro sofrido, como se doesse recordar. Um pouco depois, continuou.

"O Michael me ligou ainda do local do acidente, antes mesmo do Samu chegar. Ele pareceu muito forte tentando me tranquilizar, dizendo que tudo ia ficar bem... E os médicos depois me falaram que ele não te deixou sozinho nem um segundo sequer, falou que era seu namorado e que fazia questão de ir com você na ambulância. Ele ainda estava segurando sua mão no momento em que eu cheguei no hospital e ficou assim até a hora em que te levaram para operar. E também ligou para o pai, implorando que acompanhasse a sua cirurgia, apesar de não ser a especialidade dele, pois queria ter certeza de que lá dentro teria alguém em quem ele confiava. Alguém que cuidasse de você com carinho."

Eu já sabia daquilo. Além de acompanhar a cirurgia, o pai de Mike tinha ido me visitar todos os outros dias no hospital.

"Mas o que eu queria te falar, Will", ela continuou, "é que depois que falaram que você teria que ser operado - pois estava com uma fratura exposta na tíbia - e te levaram para o bloco cirúrgico, Mike ficou olhando empurrarem sua maca até que você desaparecesse com os médicos. Foi quando ele desabou. Parecia que, até aquele momento, estava forçando a se controlar. Mas, no segundo em que te levaram, ele não resistiu. E caiu no choro..."

Um nó começou a se formar no meu peito. Eu não podia imaginá-lo chorando. Eu nunca tinha visto o Michael chorar na vida, ja havia até testemunhado lágrimas nos olhos dele algumas vezes, mas, chorar para valer, jamais. E aquela imagem me deixou angustiado. Mesmo com raiva, eu não queria que ele sofresse...

"Ele chorava tanto, William...", minha mãe continuou. "Ele se sentou ali mesmo, no chão do hospital, colou o rosto entre as pernas e ficava dizendo baixinho: 'Por favor, Deus, anjos, santos e todo mundo aí de cima que puder ajudar... sei que eu não costumo orar muito e que deveria fazer isso com mais frequência, mas meste momento eu estou orando por todos os momentos que não fiz isso. Não deixem que nada aconteça com o meu Will, voltem o tempo e façam com que eu corra e possa entrar na frente daquele carro no lugar dele... Porque se algo acontecer com o William, eu nunca vou me perdoar. Eu não sei viver sem ele...'."

A minha mãe chorava enquanto repetia as palavras dele, provavemente se lembrando, e então eu chorei também. Chorei por tudo. Pelo rumo que o nosso namoro tinha tomado. Pelo tanto que eu ainda o amava e por tudo o que a gente já tinha vivido. Chorei porque eu também queria voltar no tempo e mudar tudo.

Ela me abraçou por um tempo e em seguida me deixou sozinho.

Mas de repente percebi que o que eu menos queria era ficar só com a minha companhia. Eu não precisava mais descobrir nada. O meu coração já havia me dito tudo o que eu queria saber.

Eu não podia voltar no tempo... Mas podia mudar minha história a partir dali. E era exatamente isso o que eu iria fazer.

Drunk - BylerOnde histórias criam vida. Descubra agora