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Gerard havia ficado tão desesperado e desnorteado após a briga com a mãe, que nem pensou que teria que apresentar Frank para sua avó, Elena, logo em seguida. Enquanto Frank dirigia seu carro pelas poucas ruas que separavam as duas casas, Gerard pegou-se pensando sobre esse primeiro encontro entre a matriarca da família e seu ex psicólogo: o que ele deveria dizer? Que Frank era apenas um amigo? E como explicar que havia saído de casa em um impulso, após brigar com Donna por conta da sua sexualidade? Sexualidade essa que ele nem mesmo tinha definido! Além disso, o que garantiria que Elena não teria a mesma reação?

Talvez Gerard devesse ter pensado melhor antes de sair falando que estava indo embora, porque agora não tinha mais volta. Nem em um milhão de anos ele colocaria os pés naquela casa, não sem antes um pedido de desculpas por parte de sua mãe. Donna devia a ele desculpas, e o pedido não era só por conta das palavras homofóbicas, mas sim por tudo: por todos os anos desmotivando-o a agir sozinho, impedindo-o de ser dono do próprio nariz e de andar com as próprias pernas. Talvez Gerard tivesse feito muito mais se seus pais não o controlassem tanto. Talvez tivesse terminado a faculdade. Talvez tivesse um emprego... qualquer coisa além de passar os dias preso dentro de casa, ouvindo audiobooks e matando tempo pensando em tudo e em nada.

E matar o tempo era tão difícil! Assistir televisão, escrever, ler, sair com os amigos, passear... encontrar gente. Viver. Tudo parecia demandar aquele sentido que para muitos era corriqueiro e simples: a visão. Mas não para ele. E embora Gerard estivesse aprendendo que era possível fazer quase todas essas coisas - exceto assistir televisão, essa só dava pra ouvir mesmo - o fato de que vivia preso dentro de casa, como uma verdadeira princesa da Disney, não ajudava. Já havia passado da hora de romper o cordão umbilical e cortar aquela ligação sufocante que sua mãe insistia em manter.

Entretanto, nenhuma daquelas preocupações se fizeram presentes quando Gerard timidamente tocou a campainha da casa da avó, o rosto ainda inchado e com marcas do choro que há pouco estivera presente, e a senhora o recebeu com um abraço apertado, sem grandes perguntas. Elena era uma mulher forte, guerreira, uma pessoa que tinha servido de exemplo para Mikey e Gerard a vida toda. A senhora Lee Rush era a responsável pela paixão de Gerard pela pintura e pelo gosto que Mikey tinha por livros; ela os ensinou a cantar e os motivou a seguirem seus próprios sonhos. Elena era, certamente, uma senhora muito à frente de seu tempo, e Gerard esperava que ela continuasse sendo, principalmente no momento em que mais precisava.

― Vou preparar um bule de chá. Tudo bem se eu fizer de camomila? - A senhora ofereceu assim que Frank e Gerard acomodaram-se no sofá, um ao lado do outro. - Eu não sei ao certo o que aconteceu, mas pela sua carinha acho que vai ajudar.

Gerard assentiu e Frank ofereceu um sorriso acanhado, enquanto Elena se retirava para a cozinha, deixando os dois sozinhos. O psicólogo queria perguntar o que havia acontecido e como o mais velho estava se sentindo, mas o medo de parecer invasivo impediu que as palavras saíssem de sua boca, preocupado que o outro pudesse interpretar a preocupação como uma sessão não autorizada de terapia. Dessa forma, sem jeito pela situação e um tanto nervoso pela presença da avó de Gerard, tudo que ele fez foi juntar as mãos em cima do colo e brincar com os anéis dourados que enfeitavam os dedos, tentando distrair-se para que o mais velho tivesse seu momento sozinho. O silêncio não durou muito, entretanto, quando Gerard tateou o lado esquerdo e encontrou a coxa de Frank, subindo os dedos até que suas mãos estivessem entrelaçadas.

― Perdão por estragar nosso encontro. - Sua voz era suave, quase baixa demais, e o tom melancólico fez Frank sentir-se impotente. Ele havia se esforçado tanto para ajudar Gerard, para vê-lo feliz e realizado, mas tinha a sensação de que tudo sempre saía do seu controle. Nada parecia dar certo quando se tratava de Gerard, e por uma fração de segundo ele pôde entender o sentimento de Donna: o rapaz era tão precioso que Frank também o colocaria em um potinho, caso pudesse. O que separava seu sentimento carinhoso de proteção do sentimento obsessivo da mãe era o fato de que ele sabia essa era uma ideia apenas ilusória e tenra, algo natural e inerente ao amor, enquanto a mulher de fato insistia em colocar em prática.

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