Capítulo quarenta e seis

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  Mia não tinha mais lágrimas para derramar, mas seus olhos não pareciam entender isso. Nada a impedia de sentir culpa pela morte do lendário Colin, nada a impedia de sofrer pela perda de mais alguém que amava. A guerra havia acabado e levado junto suas forças e a de seus amigos, que estavam naquele momento reunidos no quarto do falecido, guardando os pertences dele.

- Esse casaco... - Cassandra soluçou alto, segurando com todo cuidado do mundo o item - Ele o usou quando me penteou. - sua voz soava ferida, mostrando o quão machucada estava. - Ele era tão bom para mim... Me lembro até hoje.. - sorriu secando uma lágrima. - Eu estava tentando trançar meu cabelo, do mesmo jeito que Mia costumava fazer por mim. Colin entrou para me dar boa noite e eu estava chorando por sentir saudades dela. Contei a ele que não conseguia fazer aquele penteado sem ela e ele simplesmente disse que fazia. E vocês sabem... Ele fez tudo errado.- eles já haviam parado seus afazeres e prestavam atenção em uma Cassandra toda chorosa, ela fungava e ria tentando conter a emoção que as lembranças traziam. Todos gargalharam ao imaginarem a cena de Colin tentando lidar com uma menina, um homem grande e de guerra feito ele.- Eu tentei disfarçar a risada e a careta para aqueles nós que ele achava que eram trança. - mais risadas e lágrimas. - Ficou péssimo. Mas não desfiz porque eu amei a tentativa dele, o quanto ele se empenhou e se esforçou para fazer algo que sai totalmente de seu padrão, só para me ver feliz.

- Fique com ele, Cass. - Mia tocou sobre a mão da melhor amiga e o casaco. Sorrindo para ela. - Colin ia querer que ficasse com você. - antes de falar mais alguma coisa, ela olhou para trás da garota e reconheceu uma luva de box, logo o momento voltou para sua mente e ela sorriu, se encaminhando até lá.- Sabe.... Uma vez, quando recém chegamos aqui, eu estava estressada, sobrecarregada. Mas eu sou a menina tranquila, calma e de luz. Ninguém nunca espera que eu surte. Ninguém acredita que eu também possa ficar furiosa. - sem olhá-los e com o pensamento longe, Mia brincava com o que segurava nas mãos. - Mas eu surtei. Eu entrei na sala de treinamentos e... Surtei. Comecei a esmurrar o saco de pancadas. - ela ergueu os olhos e encarou seus amigos todos banhados em lágrimas, depois de receber apoio por olhares compreensivos, continuou. - Colin entrou na sala e eu esperava que ele ficasse bravo e sabe... Brigasse comigo. Ou quem sabe, sei lá, fizesse um interrogatório insuportável. Mas não. Ele apenas me estendeu um par de luvas e colocou estas, então me disse que treinar ajudava extravasar, foi a única coisa que ele disse a tarde inteira e eu tenho certeza, que me deixou vencê-lo.

- Ele era um peixinho se fingindo de tubarão. - Austin riu e tentou conter as lágrimas. Mas não pode. Eles todos estavam sentimentais demais com a perda. O guardião abraçou sua melhor amiga por trás e ficou a consolando.

- Eu me lembro de uma vez em que Colin me ajudou.- A voz de Sebastian chamou a atenção do grupo para um canto do quarto, aonde o príncipe segurava uma garrafa de uísque, de cabeça baixa, ele estava em choque, não derrubara mais lágrimas desde a morte do elfo, era como se estivesse anestesiado e não conseguisse sentir nada. - Foi quando eu soube que Mia havia partido. Eu estava muito mal e ferrando com toda a evolução que eu tinha tido desde que conheci vocês. Eu já estivera naquele lugar obscuro um milhão de vezes, eu estava transtornado de novo, perdido, sem Mia...Tentei imaginar a mim mesmo sem ela, droga, tudo o que havia de bom em mim fora desperto por ela. Eu pensava que só era bom porque Mia me achava bom, porque vocês me achavam bons e sem isso, eu tive medo de decair de novo, de que sem ela só restasse o monstro em mim. Eu me autosabotei, eu sabia que uma hora ia chegar o momento em que eu seria de novo o vilão da história. Então voltei a velhos hábitos, em uma noite enquanto Cassandra e Austin dormiam, eu sai escondido e eu... Eu... Feri fadas. Não as machuquei fisicamente, mas sim, eu cedi ao mal. - Ele fungou baixinho, mas não derrubou nenhuma lágrima. Continuo olhando fixamente para o uísque que segurava. - Colin me encontrou e me convenceu a voltar para casa e eu lutei contra ele, eu o ataquei e do jeito dele, sem revidar a mim, ele conseguiu me trazer de volta para cá. - Ele deu um gole na bebida que até então apenas segurava. - Não sei como, mas de um jeito surreal ele me trouxe de volta para a realidade, sabe? Eu lutei contra tudo de bom que havia em mim até não aguentar mais, porque eu não era um cara bom sem ela. Eu estava convencido disso, mas ele não, Colin não desistiu de mim e não me deixou desistir também. E como se soubesse exatamente o que eu estava passando, ele me colocou sentando, me deu essa garrafa para beber e perguntou "Você acha que não é bom, não é? Tem medo de não poder ser a pessoa que Mia achava que era, não sem ela... Mas quer saber de uma coisa, príncipe? Mia não tornou você bom, ela só te ajudou a por para fora quem estava ai dentro. Não foi por ela, por eles, nem por mim, foi por você. FOI VOCÊ. Não existe isso de alguém te mudar, só muda quem quer, a lagarta não se transforma em borboleta porque alguém fez isso com ela, ela se transforma em borboleta porque é o que ela é, o que nasceu para ser."

(CONTINUAÇÃO) Encantada - O reino amaldiçoadoOnde histórias criam vida. Descubra agora