Que seja amor

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          Olhei no relógio e constatei que já haviam se passado duas horas desde que me perdi de Igor na praia. Não parecia ter se passado tanto tempo. Mas passou.
         Eu não sabia nada de Pietro ainda, nem se ele recebera meu recado. Bom, pelo menos eu estava bem e não era intencional o que acontecera comigo, então deveria estar tranquila. Mas não estava. Estava nervosa porque não sabia como Pietro reagiria ao me ver depois de ter sumido.
        O grupo de pessoas do supermercado estavam mais tranquilas agora que viram que eu estava bem e que só precisaria ir ao hospital pra constatar que estava tudo em ordem mesmo. A maioria parecia ser da mesma família, os homens e as duas mulheres que me rodeavam.
       O jovem alto chamado Nicolas era o dono da moto que me atropelou e a mulher alta e magra era mãe dele, Joana o nome dela. O nome do supermercado era Orla de Ipanema e eu nunca tinha visto antes, mas, com certeza, jamais me esqueceria dele. Os caixas estavam trabalhando e o dono não estava presente, mas já sabia que haviam pessoas presas lá dentro por causa da chuva.
        Aos poucos a chuva foi cessando mas não parou totalmente. Muitos raios e trovões ainda se ouvia e eu me sentia tremer por dentro a cada som. Mas me mantinha em silêncio pra não assustar meus salvadores.
       Eu já sentia minha perna se mover aos poucos e a dor no braço só passou depois que Joana me deu um analgésico pra tomar. Eu nem senti, mas tinha um corte pequeno na testa fruto do atropelamento. Meus olhos já não ardiam mais, mas ficaram vermelhos e irritados. Joana me certificou que logo passaria a irritação, isso era consequência da areia muito tempo em meus olhos.
        Ela também limpou o sangue e fez um pequeno curativo no corte da testa na intenção de parar o sangramento que escorreu pelos meus cabelos. Fiquei me perguntando se não havia nada mais em mim que não doesse ou sangrasse. Certamente levaria esse dia pro resto da vida.

       Vinte minutos depois que liguei pro hotel, ouvi vozes na entrada do supermercado. Pensei ser o dono do local mas meu coração acelerou ao constatar que a pessoa falava meu nome e que a voz saía em italiano.
     - Pietro - falei assim que distingui a voz do interior da loja. Me levantei com dificuldade e fui me arrastando para a entrada, seguida pelas mulheres que ficaram preocupadas com minha reação.
      Ele se virou em minha direção quando apareci. Jamais me esquecerei desse momento que ele me olhou. Meu coração se encheu de alegria e ansiedade. Meu braço estava em uma tipóia e a toalha rodeava meus ombros nus. Eu estava descalça porque me esqueci de calçar os chinelos quando me levantei.
      Num segundo Pietro já estava à minha frente com o rosto preocupado e, ao mesmo tempo, nervoso sem saber o que fazer.
     - Dios mio! Petit! - ele me abraçou de uma só vez e senti lágrimas virem em meus olhos. Ele estava mesmo preocupado comigo pois não parava de me abraçar, me apertar em seu peito e beijar meus cabelos.
     - Ai - gemi alto quando ele apertou meu braço num gesto protetor. Ele me afastou de uma só vez, assustado com minha reação, como se somente agora visse que eu estava ferida e suja.
     - Oh meu Deus, você está bem? Onde você se machucou? Como foi? Igor te deixou sozinha? Porque ele fez isso? - Pietro disparou nas perguntas e as pessoas ao nosso redor sem entender nada. Ele falava em italiano e as perguntas saíam em disparada, quase que eu mesma não entendia o que ele falava.
      - Calma - eu sorri entre as lágrimas. - Eu estou bem, foi só um acidente, mas estou bem - eu respondi em italiano e pude perceber que ele se acalmou depois que me ouviu.
       Aquela reação dele era algo que eu não esperava, mas não podia ser outra. Jamais dei razão pra ele entender que eu fugiria ou algo assim. Não havia motivos pra fazer isso. Fiquei ainda mais atraída por Pietro depois disso.

       Contei a Pietro tudo que me aconteceu e ele ouviu em silêncio. Não ocultei nada e ele não me interrompeu. Não disse nada pra me acusar, nem me criticou. Apenas ouviu e depois de um tempo em silêncio, ele apenas disse que cuidaríamos do telefone e da bolsa depois e que o mais importante era eu estar bem. Concordei com a cabeça.
        - Você está com fome? - Pietro perguntou alguns minutos depois que me colocou sentada numa cadeira estofada que havia ali no interior da loja.
      Ninguém havia me oferecido aquela cadeira, certamente porque ela era muito cara e eu estava com meus jeans molhados, então não fazia sentido eu sentar ali pra não molhar nem sujar o móvel. Mas Pietro não se preocupou muito com isso.
     - Um pouco - eu disse em voz baixa e Pietro saiu, voltando segundos depois com um pão de forma amanteigado e uma garrafa de suco natural de laranja. Eu nem havia prestado atenção, mas ele achou pra mim. - Obrigada. - agradeci.
      Pietro me deu um beijo na testa e saiu de perto de mim pra que eu comesse e foi até a entrada da loja. A chuva ainda caía, se saíssemos corríamos o risco de ficar presos na rua alagada. O hotel não era tão longe, ao menos eu achava. Se continuássemos ali, provavelmente ficaríamos até tarde da noite, isso era fato.
       Pietro havia me coberto com seu blazer caríssimo antes de sair. Eu precisava tomar um banho e me trocar logo, senão me resfriaria.
       As pessoas ao nosso redor já ficaram mais relaxadas quando viram que Pietro realmente existia e que era alguém íntimo meu. Mesmo que fosse somente físico, mas era íntimo. Mas eu não diria isso a eles.
      - Que bom que seu namorado chegou! - Joana se aproximou de mim e me ajudou a recolher as migalhas do pão que caíra na poltrona. - Ele ficou preocupado com você, sinal de que gosta de você de verdade. - ela disse e eu apenas sorri concordando. Ela não sabia, mas aquelas palavras ficaram na minha mente. - Vocês formam um lindo casal. Parabéns!
       - Obrigada - agradeci sorrindo. A mulher saiu com o lixo numa sacola e eu fiquei com meus pensamentos. Por momentos me esqueci da dor e que ainda estávamos presos em um supermercado.
        Ouvir que Pietro podia gostar de mim me fez muito bem e me deixou ansiosa. Sim, ele podia gostar de mim também e assim podíamos realmente ser um casal de verdade! Pensar que isso poderia vir a acontecer me encheu de esperança. Seria possível que ele sentisse algo além de desejo por mim? Que loucura!, pensei balançando a cabeça.
       Eu não podia alimentar tanto meus sentimentos. Pietro não demonstrou nada além de preocupação porque tínhamos um contrato. Eu ainda era a acompanhante dele. Nada mais que isso.

A Acompanhante do Italiano ( Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora