Nos olhos de Liz.

Namorando o tempo

Namorando o tempo

Meu relacionamento começou a décadas, uma historia de amor vivida aos trancos e barrancos. Ele sempre me diz com uma cara de tédio que não temos um segundo a perder e caso o percamos não conseguiremos recuperar. Eu dou risada, faço pouco e danço despreocupada quando ele começa seus sermões de domingo, pois sei que não importa o que aconteça ele estará lá. Tem dias que ele acorda exitado e me dá o melhor dia da minha vida cheio de pegadas fortes, sussurros roucos e corpos suados. Em outros a raiva é irracional e os palavrões são aos montes e nesses dias brigamos, choramos e nos afastamos. Ele me deixa de molho e tudo o que faço é me trancar no quarto e vê-lo passar irrequieto pela minha janela. Quando a saudade é demais ele abre a porta afoito e me puxa para seus braços. Diz para não perder mais tempo pra ser feliz. Eu aceito. É meu vicio. E em meio a minhas crises, meus mimos e reclamações ele só me olha nos olhos com paciência e carinho e diz: “espere”, “tenha calma”, “vai dá tudo certo.”… Quando insisto, grito como uma criança e me desespero com os problemas ele me sacode frustrado e grita: “inferno, você não sabe esperar?” “então vá miserá quebre a cara de novo”. Eu choro magoada, mas sei que quando acontecer é a ele que vou recorrer. Ele não desiste de me e eu não sei viver sem ele. Por vezes andamos de mãos dadas como um casal normal. Ele não gosta quando me desequilibro, mas acho que justamente por isso que está comigo. É ele quem cura minhas feridas, e não é soprando com carinho, não, é banhando com sal e me fazendo gritar de dor. Quando meu vazio é intenso e o abismo enorme ele se afasta… Diz que é para o meu bem, que me moldando com o sofrimento me fará forte. Não sei o que dizer, fico muda e muitos estranham meu patético fascínio, mas meu relacionamento começou a décadas, uma historia vivida aos trancos e barrancos, pois é assim que vive quem insiste em namorar o tempo.