Sentia o sangue gelar, um arrepio percorreu todo o meu corpo, enquanto tinha um nó gigante na garganta que me impedia de falar.
Lentamente, acabei de fechar a porta, não sabia o que fazer, estava completamente imóvel. Eu queria profundamente acreditar que tudo tinha sido um mal-entendido e que eu estava enganada, pela primeira vez na vida quis estar completamente errada. A mudez, já me incomodava, a sala parecia mais branca, mais escura, mais triste. A minha mãe estava cheia de olheiras, os olhos estavam inchados de certeza que esteve a chorar. Estava encostada num canto da sala, completamente acabada, aquele silêncio incomodava-me, não era capaz de olhar para ela, então olhei para a janela, onde se vai toda a cidade de Lisboa. Com isso, todas as minhas emoções e recordações vieram átona, todos os bons momentos que passei com ela nesta casa, nesta cidade. Desde os aniversários, àqueles dias em que me ia buscar à escola e almoçávamos só as duas, a todas as viagens.... Tudo!
As minhas mãos não paravam de tremer, estavam completamente gélidas, assim como todo o meu corpo. Eu sinto que tudo vai mudar, que a minha vida vai mudar drasticamente daqui para a frente.- Senta-te e, por favor, deixa-me explicar aquilo que viste.
- E se eu não quiser explicações? E se o que eu vi já foi bastante? Aliás como é que sabes que eu vi?
- Quando tu saíste eu ouvi a porta a fechar e vi, pela janela, um rapaz levar-te ao colo. Agora, ouve-me. - simplesmente, anui. O meu coração batia freneticamente, arrepios frios passavam por todo o meu corpo, o meu lábio tremia de forma a tentar impedir um soluço. Com os meus olhos postos no chão ouvi uma coisa, que nesta altura, para mim, era completamente mentira. - Eu nunca traí o meu marido. - Como assim não? Eu literalmente vi ela enrolada com um gajo qualquer, neste mesmo sofá. Agora, até sentir o meu estômago a revirar, só de me lembrar daquela imagem. - Amanhã quando o pai chegasse da viagem íamos falar contigo, mas já que tu viste aquilo que viste e quero que saibas que nunca mais me irei perdoar, vou contar-te. Eu e o teu pai estamos divorciados.
Tudo parou. Como assim estavam divorciados? Não podia ser. Porque é que eles não me contaram? Acham que eu sou demasiado fraca? Que não mereço e aguento lidar com a mentira, então mentem? Não, não. Estão a ser demasiadas coisas ao mesmo tempo. Preciso que tudo pare que tudo pare por uns segundos.
Está tudo tão frio, tudo tão escuro, tenho saudades dos braços do Gui, do calor do seu aperto. A minha mãe tentou passar a mão pelo meu cabelo e rapidamente afastei-me, não queria sentir o seu toque. Aquele que outrora me fizera sentir segura agora só me causa nojo.
Ela percebeu, afastou-se ligeiramente e continuou:- Eu sempre amei o teu pai desde que o conheci, casámos e tivemos o nosso maior orgulho. Desde que o teu pai foi para a sede da empresa e eu passei a trabalhar lá, já não temos nenhum tempo, para nós os dois, e tu reparaste que pouco temos, também, para ti. Então, a chama que havia dentro de nós foi diminuindo, já não me via feliz ao pé do teu pai e acho que se tivesses estado com um bocadinho de atenção tinhas reparado. Sabes que tanto eu como o teu pai nunca gostamos de discutir nem de ficar mal com ninguém. Então antes que chegássemos ao ponto de nos odiarmos profundamente decidimos que era melhor divorciarmo-nos. Nós não te contamos logo porque queríamos ter a certeza de estávamos a fazer a coisa correta e também porque queríamos ganhar coragem para te contar. No dia dos teus anos, tentamos reconciliarmos-mos, mas não funcionou. Quando foste para o porto eu e o teu pai assinamos os papeis de divórcio e ele escolheu uma casa, não muito longe daqui, para ficar. Eu sei que tu não entraste no nosso quarto, mas as coisas dele já estão todas encaixotadas e amanhã de manhã vem um caminhão recolher todos os seus pertences. - Enquanto ela fala ouvi-a atentamente, isto ainda era tudo demasiado recente para mim. - Sobre o que viste hoje, quando assinámos os papeis decidimos que cada um podia seguir com a sua vida amorosa e que ficaríamos sempre amigos, especialmente porque não queríamos de nenhuma forma estragar a tua relação com um de nós. Na passagem de ano, saí com umas amigas, estava completamente acabada, bebi muito e conheci o Tom. Não aconteceu nada naquela altura, por muito mais que nós ficássemos amigos, tinha acabado de perder o único amor da minha vida. O Tom, foi um bom amigo e saímos mais uma ou duas vezes, mas como amigos. Ontem, tive de vir mais cedo para casa porque o outro voo tinha sido cancelado. Então quando soube que ias dormi na casa da Joana convidei-o para vir jantar, só com a intenção de lhe contar como estavam as coisas, nada mais. De repente ele beijou-me e eu até que o afastei, mas era tão bom, parecia tão correto. E, pronto! Nem sei como é que te hei de explicar, só sei que aconteceu! Aconteceu e não há nada que eu possa fazer para retirar o que fiz e o que viste. Honestamente, não podia estar mais arrependida por teres presenciado aquela cena. Eu sei que estás muito chateada comigo e que provavelmente vais ficar assim durante algum tempo e eu percebo, até eu estou chateada comigo mesma. Mais honesta dos eu isto não posso ser.
Ela olhou para mim como se precisasse de um sinal meu, uma palavras minha. As cordas vocais estavam enroladas não me queriam deixar falar, a mente com demasiada informação misturada com sentimentos não conseguia definir um pensamento correto e o coração quase parou de bombardear sangue, de tal forma que estava pálida que nem cal, as mãos não paravam de tremer. Não consigo sentir nada parece que nada me pertence. A único pensamento que consegui expulsar do meu cérebro, do meu coração da minha boca, foi:
- Ainda amas o pai?
- Sim eu ainda amo muito o teu pai, mas prefiro ser amiga dele do que odiá-lo. - Assim, com isto dito, lágrimas, involuntárias, desceram-me pela face e num segundo ela agarrou-me com tanta força, como se não me quisesse perder, como se precisasse que mim para sobreviver. Ficamos naquela posição por muito tempo, enquanto as lágrimas levavam toda a nossa angústia embora. Lentamente, ela foi-se descolando de mim e passando as mãos pelas minhas lágrimas, tentando secá-las e eu deixei. Eu deixei, porque talvez não estivesse agora tão chateada, talvez porque precisava que ela me transmitisse todo aquele amor, que me mostrasse que não se tinha esquecido de mim. Não sei ao certo qual a razão, mas sei que precisava daquilo, deixou-me mais calma, só havia uma coisa que precisava ainda mais naquele momento e ela não mo poderia dar.
Talvez não fosse tão mau assim, aliás eu sempre defendi que as pessoas devem de estar juntas enquanto felizes e com bastante amor, quando isso não acontecer se calhar o melhor é mesmo deixarem de estar juntas.- Se quiseres falar sobre isto depois estás à vontade, mas fica a saber que vamos ter de falar sobre isto: Quem é que era o rapaz de hoje de manhã? - Bolas ela viu-o! Ahhh agora vou ter de lhe contar. Afinal nós somos mesmo o quê? Amantes, namorados, amigos? Só tenho uma solução, fazer das palavras do Gui as minhas.
- Era o Guilherme, o meu namorado.
- O quê? Como assim tu tens um namorado? Porque é que não me contaste? Conta-me tudo.
- Então nós conhecemo-nos quando... - E assim contei-lhe quase tudo sobre nós, exceto a parte dos meus anos e das vezes em que dormimos juntos. Ela não tinha de saber disso para já, era só uns ínfimos detalhes. Entretanto ligaram-lhe da escola a perguntar se estava tudo bem e o porquê de eu ter faltado e enquanto ela justificava foi tomar um banho, estava mesmo a precisar.
Avisei que ia sair e fui dar uma volta por aí. Quando me apercebi, estava sentada no baloiço enfrente ao penhasco e tinha acabado de mandar mensagem ao Gui para ele ir lá ter comigo. Passado uns quinze minutos ele chegou e agarrei-me a ele com tanta força. Precisava de sentir tanto aquele aperto, aquele cheiro. Ele não perguntou nada e fiávamos assim, eu sentada no colo dele e com o seu braço à volta da minha cintura fazendo-me carinho, até vermos o pôr do sol. No final já estávamos mais descontraídos e a falar dos trabalhos que tínhamos, até que ele parou olhou-me nos olhos e beijou-me. Beijou-me com tanta necessidade, com tanto amor, cuidado e força que ficámos rapidamente sem ar. Precisava tanto, mas tanto dele. De testas encostadas, dei um suspiro e uma lágrima rolou-me pela cara abaixo.
- Eles divorciaram-se...
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Why me?
RomanceBecause I love you. Uma história de amor diferente? Uma rapariga demasiado embaraçada no seu mundo. Um rapaz perdido, sem rumo, levado pela maré da vida. Porquê ela? O que é que será que ele esconde para ser tão misterioso? Dizem que o amor enfre...