Mavis Demiurgo: Nervos de Gelo

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Na Academia de Ciências Físicas somos ensinados a olhar com um certo orgulho para toda a diversidade cultural sobre a qual o Reino Profundo foi erguido. Um país é tão diverso quanto o seu povo se propõe a ser, ao menos no papel, essa sempre pareceu a visão mais adequada para aceitar que um lugar com centenas de raças incluídas sobre três termos guarda-chuva prospere por tanto tempo. Fossem tribos dos primeiros mermans, os fiminis que vieram aproveitar as riquezas do grande arquipélago ou os humanos que trouxeram escravizados, a necessidade de incorporar e aceitar as diferenças de alguém sempre surgiram. A divergência trouxe consigo o complemento para a sociedade, a completou de alguma forma.

-Você pode me explicar de novo sobre esse acorrido, mestre ? -O Rei do Reino Profundo pedia.

O dia que seguiu após a minha pequena aula particular com Págo, fomos chamados para uma audiência com a coorte real. Todos nós. O lado bom era que a sala do trono ficava a uns dez minutos de distância do dormitório, o ruim era que todos os olhares recaíam sobre mim. Estava sendo julgada. Conseguia sentir os olhares acusadores das poucas pessoas dispostas a acordar antes das oito da manhã num domingo, transportando o peso extra nas minhas costas.

Nos puseram em fila reta, exatamente como da última vez. 

Ludroc verificava uma anotação recém escrita na palma das mãos, Purehito roía as unhas freneticamente até alguns minutos atrás quando as afastei de sua boca, vê-lo assim me deixou mais nervosa do que já estava. Págo suava como de costume em seu lugar, parado feito uma estátua, salvo nas vezes que precisava tirar o cabelo da frente dos olhos. Gehena mantinha os olhos fechados, pensei por algum tempo que estivesse meditando, entretanto ela definitivamente estava dormindo, dominou a arte de dormir em pé, uma que Jonetsu almejava naquele momento, e principalmente quando acordava em meio a uma possível queda.

A nossa frente, o rei não parecia mais tão...real em seu pijama, ainda que estivesse sentado ao trono e com cetro em mãos e de coroa, ele seria facilmente confundido com o rei dos colchões. Pedra D'Água observava a tudo como de costume ao lado do trono, talvez ela também fosse capaz de dormir ali onde estava de tamanho o costume. Do outro lado, o mestre Damuzai limpava as cordas vocais para responder ao rei.

-Como eu o disse mais cedo, vossa majestade, ontem, tarde da noite, encontrei Mavis e Págo na Sala da Mente treinando escondidos técnicas de uso d autoridade sobre a água que ensinei à menina mais cedo.

-Mestre...-O rei massageava a testa em sua primeira angústia matinal -As crianças tem permissão de transitar pelo castelo como bem entenderem.

-Não é essa a questão. Noite passada eu fiz questão de deixar explícito que não ensinaria o garoto do Reino de Gelo. Treinar os dois do fogo é aceitável, as nossas nações são aliadas. Eu até abri exceções para as garotas, mas não para esse...desordeiro ! Ele e a companhia quase congelaram a cidade no outro dia, se bem se lembra, e é do conhecimento de todos  a falta de capacidade desses tolos em aprender.

O rei coçava a cabeça e fazia uma careta antes de falar.

-Isso é verdade, Mavis ?

-Eu não nego -Tentei responder calmamente, apesar das diversas explosões internas.

-Ela admite -O rei dizia -Mestre, o senhor como tutor deles, deveria sugerir a pena que considera adequada para eles.

-Eu quero que Mavis -Ele juntava as mãos atrás das costas -Me peça desculpas por manchar a técnica assim.

Cerrei os punhos.

-Eu...eu sinto...-Por mais que me forçasse, as palavras ficavam presas na minha garganta, elas não passavam porque não eram verdadeiras, não foram feitas para, e se o fizesse, o seu teor mancharia tudo o que eu acreditei até agora. Impedir o Págo daquele jeito não só nos atrasaria, não era esse o problema real, aquilo era pura discriminação com o lugar de onde veio.

O Conto dos Exilados:Reflexos de uma utopia opacaOnde histórias criam vida. Descubra agora