Capítulo 12

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Hugo

— Droga, droga — isso não podia ter acontecido. Que espécie de terapeuta você pensa que é? Não consegue sequer enxergar as reservas de uma paciente? Você é um idiota, Hugo! Que merda pensou em fazer? Ela demonstrou uma repulsa traumática, eu diria até que foi exagerada, caso não suspeitasse que haja algo por trás disso.

Eu não consegui me conter ao vê-la em um pranto sofrido. Acompanhar tudo que a Sarah vem passando é doloroso para mim também. Foi impulsivo, eu sei. Deveria ter agido como profissional que sou. É nisso que tem que estar a minha cabeça. Profissional e cliente. É isso que somos. Alguém avisa, por favor, esse meu corpo, para não dizer coração, babaca que não precisa ficar se desmanchando por qualquer mulher linda e despedaçada como eu.

Volto a analisar as informações dela para encontrar saídas. Verificando o seu histórico em meu notebook vejo que não havia informação de sua paternidade anterior até que fosse adotada por Andrei. Ela tem 25 anos e está desde os 10 como filha do Andrei. Concluiu a faculdade de arte no ano passado, pinta desde criança. As pinturas espalhadas pela casa com certeza também são dela. Decido sair para percorrer a casa e conhecer melhor suas pinturas. Talvez me falem alguma coisa. A casa não é tão grande quanto a de Curitiba, mesmo assim é impressionante. No espaço principal da casa há algumas suítes, biblioteca, sala de tv, sala de estar, jantar e cozinha. Na área externa todos os atrativos para lazer e esporte com piscina, salão de jogos, sala de ginástica Ao lado da sala de jogos há outra sala, abro a porta e finalmente encontro seu refúgio. Muitos quadros empilhados e vários cavaletes. A sala é bem iluminada com portas e janelas de vidro bem grandes. Possui poucos móveis, apenas uma mesa grande em um canto, alguns bancos e uma estante com tintas, pincéis e outros materiais que ela usa. Em um cavalete há um desenho de um homem com traços perfeitos e um sorriso divertido. Eu me perguntaria quem seria se já não tivesse visto fotos e percebido a sua proximidade ao irmão, Eduardo Schmidt. Com certeza se amavam. Não imagino como deve ser devastador perder toda família. Eu não sobreviveria. Lá vou eu novamente me deixar envolver com o caso da Sarah. Várias imagens preenchem as paredes do salão, com diversos temas. Há paisagens, rostos, pessoas, animais, mas há algo comum em todos os quadros, eles são permeados por sombras. É uma característica, tendência ou estilo da Sarah. Em todos permanecem a mesma inclinação.

Surge uma ideia. Talvez eu consiga uma comunicação com a minha cliente com a ajuda da tela.

Depois de organizar, na varanda, os materiais pelos quais eu entendo como necessários para a pintura. Começo a observar ao redor da casa. A piscina é grande — perfeita para meus treinos — Mais à diante depois de uma cerca de proteção, vejo um campo aberto com vários alvos ao fundo. Lembro-me de ter visto o arco, flechas e pistolas no salão de jogos. A casa com certeza foi o local de descanso e lazer dessa família. Além de tudo que oferece dentro da propriedade, ao redor ainda possui um bosque com lagos e caminhos para trilha.

Começo a retornar e percebo a porta da varanda se abrir. Lá está a Sarah. Seus olhos ainda vermelhos me observam. Ela percebe o cavalete ao lado e com passos indecisos se aproxima lentamente dele. Não peguei a tela com a imagem do seu irmão. Preferi trazer uma em branco para deixar a sua mente livre.

Quando chego mais perto, vejo sua mão estender até o pincel. Ela o apanha e toca os dedos sobre a cerda macia. Sua mão é tão delicada quanto os fios que tateia. Parece haver uma comunicação entre eles. Eu sinto quase ciúme por uma carícia tão sensível e afetuosa. Ela levanta novamente os olhos e encontra os meus. Ainda tentando me conter para não ser muito expressivo em meu envolvimento com o momento e com ela. Ela é a responsável por tornar tudo tão notável.

Pela primeira vez, vejo uma fisionomia mais comedida. Ela chupa o lábio inferior e o choque que isso me causa não é muito justo com minha tentativa de controle.

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