Cães e Psicólogos

1.5K 212 164
                                    

Gelei ainda na garagem

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Gelei ainda na garagem.

Alexia falava com a vizinha em frente ao portão. O Dobermann estava com elas. E ele me olhava.

Voltei para dentro correndo.

Meu Deus, eu só queria comprar leite condensado pra fazer brigadeiro!

Inferno.

Já na sala, me joguei no sofá, irritado. Por que eu tinha que ficar assim só com um cachorro que ficou me olhando? Por que eu tinha que ser tão idiota e me prestar a um papel tão ridículo?

Senti um beliscão no tornozelo e me sentei, afastando esses pensamentos.

"Você comprou o leite condensado?" — minha mãe perguntou.

Hesitei.

Merda.

"Tava fechado."

Ela uniu as sobrancelhas sem acreditar. Encolhi os ombros sem jeito. Sabia que eu estava mentindo, era muito cedo para já estar fechado. Minha mãe me olhou um instante antes de sair e eu sabia que iria tentar ver se estava fechado mesmo. A padaria era no fim da rua, dava para ver do portão... E quando chegasse a garagem, ela veria o cachorro e saberia o que realmente aconteceu.

Corri e me tranquei no quarto. Não queria ver quando ela voltasse sabendo o porquê de eu ter entrado novamente...

Me deitei na minha cama, apertei meu travesseiro entre os braços e respirei fundo, meus pulmões apertaram. Era loucura, pensei, era loucura surtar por apenas isso... Mas, minha casa devia ser um lugar seguro, a calçada também devia. E me assustava pensar que não era.

Fechei os olhos e meus abraços se arrepiaram enquanto seguia me lembrando daquele dia.

Tinha sido uma volta de escola normal como todas. Eu tinha treze anos e o Fabiano quinze.

Lembro que não parava de olhá-lo enquanto conversávamos e de como ele escondeu nossas mãos dadas com a mochila. Conversar com uma mão só não era muito fácil, mas valia à pena. Eu gostava de como segurava minha mão apertando meus dedos contra sua palma de maneira afetuosa.

Lembro da sensação das grades frias do portão durante o beijo que foi tão rápido que mal dava para recordar.

Lembro da cara vermelha furiosa do vizinho gritando quando nos afastamos e de como me atrapalhei com a chave enquanto tentava abrir o portão, assustado demais porque nunca tinha me acontecido algo assim.

Lembro dos cachorros e do Dobermann pulando em cima de mim.

Lembro que levantei um braço para proteger o rosto e que tudo apagou um instante.

Lembro que quando recobrei a consciência, Alexia me puxava para dentro e ameaçava o cachorro com a vassoura velha e que nunca vou entender como ela conseguiu afastar dois Dobermanns furiosos apenas com um pedaço velho de madeira.

SinaisOnde histórias criam vida. Descubra agora