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𝗖𝗵𝗮𝗽𝘁𝗲𝗿 1

— Sei que você odeia surpresas, Scarlett. Para alinhar nossas expectativas a um cronograma aceitável para você, saiba que já estamos prontos para ser avós.

O olhar de Scarlett Johansson saltou da mesa do café da manhã para o rosto de sua mãe, que envelhecia da forma mais graciosa possível. A maquiagem sutil chamava a atenção para os olhos cor de café, prontos para a batalha. Aquela não era uma boa notícia para Scarlett quando sua mãe punha alguma coisa na cabeça, era impossível fazer com que mudasse de ideia.

— Recado dado — Scarlett respondeu.

O choque deu lugar a questionamentos acelerados, motivados pelo pânico. Netos significavam bebês. E fraldas. Montanhas de fraldas. Uma explosão de fraldas. E bebês choravam, dando gritos agudos como criaturas mitológicas que nem os melhores fones de ouvido eram capazes de abafar. Como conseguiam berrar tanto e por tanto tempo sendo tão pequenos? Além disso, bebês implicavam maridos. Maridos eram precedidos por namorados. Namorados eram precedidos por encontros. Encontros levavam a sexo. Ela estremeceu.

— Você tem trinta anos e ainda está solteira, Scarlett. Estamos preocupados com você. Já experimentou usar o Tinder?

Scarlett deu um gole enorme de água e engoliu acidentalmente um cubo de gelo junto. Depois de limpar a garganta, respondeu:

— Não. Nunca experimentei.

Só de pensar no Tinder — e no encontro decorrente do uso do aplicativo — já começou a suar. Scarlett detestava qualquer coisa relacionada a um encontro: a quebra da rotina confortável, as conversas rasas e constrangedoras, e, de novo, o sexo...

— Me ofereceram uma promoção no trabalho — ela disse, na esperança de distrair a mãe.
— De novo? — questionou seu pai, baixando o Wall Street Journal e revelando seus óculos de aros finos — Faz uns quatro meses desde a última promoção, não? Isso é incrível. — Scarlett se acomodou na beirada do assento.
— Um novo cliente, um grande varejista da internet que não podemos divulgar, tem um banco de dados incrível. Me deixaram brincar à vontade com os números, então criei um algoritmo para ajudar a sugerir compras. Pelo jeito, está funcionando bem.
— E qual é seu cargo novo? — seu pai quis saber.
— Bom... — O molho e a gema do ovo dos bolinhos beneditinos de siri tinham se misturado, e Scarlett tentava separar as duas texturas viscosas com o garfo — Não aceitei a promoção. Era para econometrista sênior, com cinco subordinados e muito mais interação com o cliente. Prefiro trabalhar só com dados.

A mãe recebeu a informação com um gesto de reprovação.

— Você está ficando acomodada, Scarlett. Se não aceitar novos desafios, não vai evoluir no seu traquejo social. Por falar nisso, tem algum colega na empresa com quem aceitaria sair? — o pai baixou o jornal e cruzou as mãos sobre a barriga saliente — E aquele rapaz, Robert? Ele me pareceu um bom sujeito na festa de confraternização da empresa — as mãos da mãe voaram para a boca — Ah, por que eu não pensei nele antes? Um moço tão educado. E bonito também.
— Ele é legal, acho — Scarlett passou os dedos nas gotículas de água condensadas do lado de fora do copo. Se fosse sincera, precisaria assumir que até daria uma chance a Robert. Ele era convencido e desagradável, mas pelo menos era direto, algo que ela apreciava nas pessoas — Acho que Robert tem vários transtornos de personalidade.

A mãe deu um tapinha na mão de Scarlett e em seguida a segurou.

— Então ele pode ser uma boa opção para você. Talvez entenda melhor a questão do Asperger se também tiver suas dificuldades.

𝐃𝐈𝐒𝐂𝐎𝐕𝐄𝐑𝐈𝐍𝐆 𝐋𝐎𝐕𝐄 | ✓ Onde histórias criam vida. Descubra agora