Jogo minha mochila no sofá me assustando com uma figura familiar gritando da cozinha e vindo na minha direção.
— Cadê minha pedrinha preciosa?! — tia Rubi me agarrou em um abraço de urso que me faltou o ar.
— Você só viajou por cinco dias, tia. Não foi um ano. — nos jogamos no sofá.
— Meu amor, entenda. Eu sinto sua falta quando você vai ao mercado por cinco minutos. — dramatizou me fazendo rir — Novidades?
É a hora.
Lhe conto sobre a viajem do acampamento até a tal ilha do medo. Sobre a recusa do meu pai, e como tudo se organizaria e seria super seguro. Eu preciso ter tia Rubi do meu lado nessa, será a minha chance de sair como uma adolescente normal, e me aventurar pela primeira vez.
— É claro que você vai nessa viajem. — afirmou, como se já estivesse tudo resolvido. Isso me animou — Eu e sua mãe já fomos lá quando estávamos no último ano, e sabe porque seu pai não quer que você vá? Foi lá que sua mãe e ele se beijaram pela primeira vez.
Arregalo os olhos.
— Está falando sério? — assente — Então é isso? Ele tem medo que eu vá me pegar com alguém? — começamos a rir — Tia, eu mal beijei, quem dirá outra coisa.
Por um momento, penso em lhe contar sobre Luna e Luca e o que eles planejam fazer na viajem, mas mudo de idéia. Será apenas uma viajem divertida e segura entre amigos. Eu não iria fazer nada precipitado mesmo. Assim está bom.
— Você disse que vai com a turma do terceiro ano e alguns da sua turma. Quem vai com você? — perguntou, curiosa.
— Poucos. Acho que apenas eu, a Maylla, o Gustavo e o seu grupinho com o Miguel. Aqueles caras do basquete. — digo, sem dar importância.
— O Miguel, hein. — lançou, sugestivamente, como Maylla faz sempre que conversamos sobre Miguel ou qualquer garoto que eu tenha amizade.
— Nem começa. — escondo meu rosto nas almofadas.
— Você sabe que eu e sua mãe amávamos a amizade de vocês quando tinham cinco anos. Era uma graça!
— Já faz anos. Nem nos falamos mais como antes. Ele tem namorada e eu quero ficar longe de garotos por enquanto. Você sabe que a minha prioridade é—
— Estudaaar, ble ble ble. — fez uma arma com os dedos e "atirou" na cabeça. Tia Rubi costuma ser uma adolescente rebelde e louca, as vezes — Precisamos ser adolescente só um pouquinho.
— Vou aproveitar pra ser adolescente nessa viajem. Prometo. Bom, se eu for. — comentei a fazendo sorrir.
— Você vai! Deixe com a titia aqui. — me abraçou outra vez, me enchendo de beijos.
Tia Rubi trabalha representando lojas e precisa viajar pra outros estados alguns dias da semana. Como única irmã do meu pai, e melhor amiga da minha mãe, ela vem se dando o trabalho de sempre estar comigo e viver a vida que minha mãe sempre sonhou que eu vivesse, mesmo com as hesitações do meu pai que costumam ser quase sempre. E mesmo eu preferindo não viver tão intensamente como minha mãe viveu.
Ela era artista plástica, e muitos dos trabalhos dela ficaram conhecidos pela cidade inteira na época. Até hoje, em alguns pontos específicos da ilha, pode se ver algumas das artes da tão adorada Esmeralda. É incrível. Todos a conhecem. Tipo, todos mesmo.
Eu costumo ser notada algumas vezes por ter os olhos dela, ou um pouco da covinha na bochecha esquerda, até mesmo pelo jeito de andar saltitando pelos lugares. Mas nunca pela personalidade.
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Pedras E Sardas
Short StoryAgatha tem uma pequena quedinha por Luca Delfin, o veterano da escola São Martim, e quando tem a oportunidade de passar à noite em uma ilha conhecida por suas festas proibidas e lendas urbanas, arrisca a própria relação com o pai em participar dessa...