O carro deslizava pela estrada sob o sol forte daquela manhã de domingo. As reclamações de Roberta já haviam cessado há algum tempo, assim como os suplícios de Alma e as tentativas de apaziguamento que Pepa fazia. Todas estavam rendidas pelo cansaço. Desde que Antonio sentenciara sua filha para concluir seus estudos no internato mais prestigiado do país, a casa dos Pardo-Rey vivia em pé de guerra. "Não é justo! Por que eu tenho que escolher entre ir morar do outro lado do oceano ou perder a minha juventude trancafiada nesse reformatório, cheio de riquinhos esnobes? Eu não sou responsável pelo divórcio de vocês, por quê se esforçam para estragar a minha vida?!", Roberta aproveitava todas as oportunidades que surgiam para se rebelar contra a situação que lhe estava sendo imposta. "Minha filha, é a ordem do seu pai. Se você não aceitar ir para este colégio, ele ganhará a sua guarda na justiça e te levará para morar com ele na nova casa, na Espanha...", Alma tinha que segurar o choro toda vez que as duas entravam nesta discussão. Pepa, amiga e assistente de Alma, sempre intervia tentando fazer uma redução de danos.
O divórcio da famosa cantora Alma Rey era manchete em todas as revistas de fofoca do México. Havia muita especulação sobre a razão para a separação e o assédio constante da mídia estressava mais ainda a relação mãe e filha. Roberta conseguiu adiar até o último dia sua mudança para sua mais nova casa, o Elite Way School, mas não pôde evitar o fato em si. Fervendo de raiva por dentro, decidiu fechar-se em um casulo de indiferença e hostilidade. Ela não conseguia aceitar a impotência de sua mãe; para ela, a mãe não havia lutado o suficiente por sua liberdade. Mas, sem poderes para contornar a situação, Roberta seguiu seu destino como um animal que vai ao matadouro.
Na entrada do colégio, o clima já era de volta às aulas. A maioria dos alunos já estava instalada no Elite Way, visto que o ano letivo começava em menos de vinte e quatro horas, mas ainda havia uma quantidade excepcional de carros caros e limusines despachando regressantes de malas na mão. Que asco, pensou Roberta. Podem me enfiar nesse convento, mas eu nunca vou virar um deles. O motorista de Alma, Maurice, parou o carro em frente ao portão do colégio e abriu as portas para que Alma, Roberta e Pepa pudessem descer. Nesse instante, alguns alunos, percebendo a presença de Alma Rey, se amontoaram do lado de fora do colégio para admirá-la, iniciando um burburinho que irritou Roberta até a espinha. Antes que pudesse ajudar a filha a descarregar suas malas do carro, Alma já estava distribuindo autógrafos aos fãs de plantão.
-Tá bom, mãezinha. Já me deixou no colégio, agora pode ir. -Roberta falou após pegar as malas com Maurice e se despedir dele e de Pepa com um beijo no rosto.
-Mas já? Poxa, minha filha, eu estou louca de vontade de conhecer onde você vai dormir, seus colegas, o colégio...
-Então vai na secretaria e preenche uma ficha de matrícula pra você. -Roberta tinha um sorriso irônico no rosto. -Se quiser fazer algo por mim, vá embora.
-Roberta...
-É sério, mamãe. Não estou com cabeça.
Alma sentiu os olhos marejarem, mas resolveu não insistir. Sabia que sua filha tinha um gênio forte e que a matava por dentro ter de estar naquele colégio contra sua vontade. Só espero que um dia você possa me compreender e me perdoar, minha filha, Alma disse em pensamentos, sabendo que não poderia usar sua voz. Ela deu um beijo na testa da filha e ficou parada observando-a entrar no colégio sozinha e desequilibrada por suas malas. Pepa abraçou Alma de lado e a encaminhou de volta ao carro.
-Não fica assim, Alma. Roberta ainda é só uma adolescente, está aprendendo a lidar com as coisas da vida. No fim das contas, esse colégio vai fazer bem pra ela, você vai ver...
***
-Conta, amiga! E aí vocês ficaram?!
-Ai, você nem imagina, Vick...
-Conta logo, Mía!
-A gente ficou! -A loira deixou-se cair para trás de braços abertos sobre a cama, enquanto sua amiga soltava gritinhos estridentes e pulava de joelhos ao seu lado. -Foi perfeito, amiga! A gente se encontrava todas as noites pelo resort depois que meu pai já tinha ido dormir, é claro. E íamos ver as estrelas, nadar na piscina, namorar... -Mía sorriu saudosa.
-Nossa, um amor de verão... -Suspirou Vick. -Que coisa de cinema!
-Pena que durou tão pouco, só a última semana das férias. Mas quer saber? Acho que foi melhor assim. Curtimos o que tínhamos para curtir e, agora, bola pra frente.
-Então vocês nunca mais vão se ver? -A loira de cabelos curtos indagou sua amiga, que se sentou na cama do quarto onde as duas conversavam sozinhas para olhá-la de frente.
-Não, nós combinamos de não trocar telefones. Foi só uma aventura. Apesar de ter sido tão gostosa, acho melhor mesmo que tenha acabado assim. Afinal, você sabe mais do que ninguém a quantidade de problema que eu ia ter se soubessem por aí que Mía Colucci também anda ficando com mulheres...
Mía revirou os olhos e Vick balançou a cabeça em concordância. Vick sabia que os questionamentos acerca da sexualidade de Mía eram um segredo de Estado que devia ser guardado pelas duas e ninguém mais. Nem ao menos Celina, a segunda melhor amiga de Mía, tinha ideia das questões que atormentavam a cabeça da loira.
Mía era uma garota muito atraente, capaz de encantar o colégio inteiro com seu charme e seus olhos claros. Deu seu primeiro beijo com treze anos e, desde então, sempre ficou com todos os meninos que quis. Ficava esporadicamente com meninas, mas, dentro do colégio, as meninas usavam sempre os mesmos pretextos: "É só entre amigas", "um beijo não faz mal" ou ainda "é treino para quando o menino certo chegar". Mía detestava cada uma dessas frases, mas, com medo do preconceito que poderia sofrer caso assumisse sua bissexualidade iminente, entrava na personagem. Para todos naquele colégio, exceto Victoria Paz, Mía era uma garota heterossexual de dezesseis anos que fazia todos os garotos comerem na palma de sua mão. No entanto, apesar de seu sucesso com os meninos, ela nunca havia se apaixonado por nenhum deles e, por consequência, nunca havia estado em um relacionamento sério. Mía sabia que, por dentro, seu coração escondia uma enorme insatisfação e ele não ficaria em paz para se apaixonar por ninguém enquanto ela precisasse tolher metade de seu ser por medo. Não sei o que devo fazer, ela vivia pensando. Não sei se estou pronta, não sei se estou certa... Eu preciso de um sinal se a hora chegar.
A conversa entre Mía e Vick foi abruptamente cortada pelo estrondo que a porta fez ao se abrir, fazendo-as pular da cama com susto.
-Celina! -Mía gritou, botando a mão sobre o coração. -Tá maluca de sair abrindo a porta assim?
-Ai, desculpa, meninas. -A ruiva sorria de orelha à orelha enquanto caminhava apressada em direção às amigas. -Vocês pre-ci-sam vir comigo ao hall. -Vick e Mía se entreolharam com uma interrogação no rosto. -Tem vários alunos novos gatinhos chegando lá! Nós precisamos puxar assunto com eles e eu tô morrendo de vergonha de fazer isso sozinha.
Mía e Vick riram da animação de Celina, mas esta não diminuiu seu pique. Pegou as amigas pelas mãos, suplicando "por favor" repetidamente.
-Ai, tá bom, Celina. Não acredito que você vai nos fazer passar por essa vergonha. -Vick disse entre risos. -Mas vamos. E eu só vou olhar, tá? Tô achando que agora eu e o Diego finalmente vamos engatar em uma relação séria.
-Tomara que sim, amiga. -Celina respondeu. -Imagina como seria incrível nós três começarmos o ano com namorados!
-Vai com calma, Celina. -Mía deu um sorriso amarelo tentando conter a animação da ruiva. -A gente nem conhece essas pessoas, vai que ninguém ali presta...
-Você precisa pensar mais positivo, Mía! Sempre te vejo sabotar a oportunidade de gostar de alguém. -Celina mandou um olhar incisivo à amiga. -Vai que nesse ano você conhece o menino que vai mexer o seu mundo e mudar o resto da sua vida! -A ruiva tinha uma expressão caricata e fez Mía querer sorrir com ironia.
Duvido muito, ela pensou, mas levantou-se obediente e, num suspiro, acompanhou as amigas para fora do quarto. Mesmo não acreditando que magicamente cruzaria o olhar com o grande amor da sua vida no corredor do colégio, Mía estava decidida a não esperar a vida acontecer de braços cruzados naquele ano. Ela sabia que era hora de entender seus desejos e batalhar por eles.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Quiéreme a Rabiar
Fiksi PenggemarContrariada pela decisão de seus pais, Roberta Pardo, uma adolescente de dezesseis anos, é mandada para o internato Elite Way School, onde deve sobreviver seus últimos três anos de escola em meio ao que mais detesta: ricos esnobes e autoridades pres...