9. Corvo Ígneo

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Godofredo não sabia explicar o barulho que tinha acabado de ouvir.

Era como se o ar tivesse se rompido na sua frente. E bem onde essa rachadura teria acontecido, entre ele e o monstro, estava parado o mestre Corvo com Aurélio ao seu lado.

Com a mão nua ele segurava o rosto do monstro que havia investido na direção de Godofredo.

— Tudo bem, crianças? – perguntou sorrindo. Ele ainda segurava o monstro como se não fosse nada. – Que sorte que cheguei a tempo, né?

Podiam ser apenas seis meses de convivência entre Godofredo e seu mestre, mas Godofredo tinha uma certeza: aquele senhor à sua frente, com um sorriso de cerrar os olhos, estava mergulhado em fúria. Não era algo que Godofredo pudesse provar, porém seu instinto de sobrevivência gritava para que se afastasse do seu mestre.

Com o sorriso sumindo lentamente, os olhos dele se abriram e a raiva que emanava deles era tamanha que Godofredo por reflexo estendeu os braços para se proteger se ele o atacasse, mesmo sem ser o alvo de todo esse ódio.

O monstro, que também mostrava sinais de medo, conseguiu se soltar e saltou para longe. Mostrava os dentes em desafio, mas seus olhos procuravam a todo momento uma rota para escapar daquele que havia aparecido para proteger as crianças, aquele que do seu ponto de vista era o verdadeiro monstro, o Corvo.

Se virando para encarar a criatura, o Corvo ficou de costas para Godofredo, que sentiu uma onda de calor o atingir, como se estivesse muito perto de uma fogueira enorme.

— Garota, você é a Stella do segundo ano, correto? – perguntou para a menina que tentava se aproximar de Godofredo. Ela parecia que enfrentava uma maré invisível enquanto andava na direção dos dois, com o cabelo sendo empurrado violentamente para trás.

Mas que vento todo era esse? Se perguntou Godofredo. De onde vinha essa energia quente e tão forte que era possível sentir?

— Sim, Professor Corvo! Stella Dunkelheit, maga de duas estrelas do segundo ano!

— Eu preciso da Estrela Negra aqui. Qual é o nome do "escudo absoluto" dela? Absooo...

— Absoluter Schild, senhor! Mas a Estrela Negra é só...

— Eu sei, Stella – disse o Corvo se virando para olhá-la. Seu rosto revelava que ele parecia estar fazendo força para conter algo, talvez não quisesse que toda aquela raiva que Godofredo sentira na própria pele momentos antes transbordasse neste momento. – Eu sei, mas preciso de uma ajuda que só ela pode me dar.

Stella havia chegado ao lado de Godofredo, que ao se levantar apoiando-se nela finalmente entendeu de onde vinha o vento que ela estava enfrentando.

Uma onda absurda de calor emanava do Corvo.

Godofredo, que lutava para permanecer consciente depois de ter usado o pouco de energia mágica que restava dentro de si, agora tinha que se esforçar para apenas respirar na presença deste poder tão esmagador.

Mexendo com a mão livre em uma bolsinha que levava consigo, Stella pegou uma sombrinha da cor preta com bordados brancos e, com dificuldade, a abriu voltando-a contra o Corvo, como um escudo para proteger ela, Godofredo e Aurélio, que havia silenciosamente se aproximado deles.

— Prepara-te, Estrela Negra – ordenou o Corvo.

Olhando para baixo, ela via Godofredo quase inconsciente agarrado nela. Respirando fundo, ela se concentrou. Essa era a hora que alguém mais precisava dela, e ela não falharia. Seu poder era o de salvar pessoas e esse garoto havia dado tudo de si – ainda que de forma muito atrapalhada – para mantê-la segura.

O Aprendiz do Corvo - Volume 1 (versão web)Onde histórias criam vida. Descubra agora