O único som que quebrava o silêncio da noite era o de passos lentos esmagando a grama seca, o estalar das folhas quebrando sob o peso das botas, e o eco sinistro do vento que serpenteava pela floresta. A luz fraca das tochas iluminava o caminho, tremeluzente e inquieta, como se até o fogo sentisse o que estava por vir. Uma jovem, pálida e tremendo, era arrastada por duas figuras encapuzadas. Seus olhos arregalados refletiam o terror; o corpo lutava contra as amarras invisíveis do destino.
— Não... por favor... — A voz dela era um sussurro, uma oração quebrada. — Não façam isso... não...
Cada palavra sua era ignorada enquanto a empurravam, forçando-a a subir os três degraus que levavam à estaca de madeira, onde suas mãos foram presas com cordas ásperas. Sua respiração era rápida, o peito arfando até que seus olhos encontraram a mulher à sua frente — uma figura de capa preta, o brilho loiro de cabelos escapando pelo capuz.
A mulher encarava a jovem com algo entre o desprezo e o medo.
— Agatha Harkness — a mulher disse, sua voz fria cortando o ar como uma lâmina —, você é uma bruxa?
O ar parecia congelar ao redor de Agatha. Seus olhos varreram as outras figuras ao redor. Todos os rostos, ocultos por sombras, estavam cravados nela, julgando-a, condenando-a. Ela sempre soube que aquele dia chegaria. Sempre soube que essa pergunta seria feita. E agora, depois de tanto tempo, a verdade seria finalmente liberada.
Agatha ergueu o queixo, os olhos brilhando com algo que se assemelhava a desdém, e respondeu, ainda ofegante:
— Sim. Eu sou uma bruxa.
Essa não era uma confissão. Era uma proclamação. Uma que carregava séculos de poder e segredos.
Ela sabia que sua mãe, a mulher que agora a encarava, havia planejado isso. A mulher que nunca a amou, nunca a viu como mais do que uma ferramenta — uma arma. O vazio no coração de Agatha havia sido preenchido por um poder muito maior do que qualquer uma dessas bruxas ao seu redor poderia compreender. Por dentro, Agatha riu da ironia daquilo tudo.
"Como se vocês pudessem me deter."
Mas, por enquanto, ela precisava manter as aparências. O medo que sentia por fora era uma máscara; por dentro, ela já sabia o fim desse espetáculo patético. O que a feria não era a iminência de sua morte, mas a amarga verdade que conhecia: ninguém ali se importava. Nem mesmo sua mãe.
— Ainda assim, você traiu o seu coven — disse a mulher, suas palavras pesadas de acusação.
O círculo de bruxas ao redor removeu os capuzes. Rostos duros, inexpressivos, refletiam a fria indiferença do julgamento. Agatha fixou o olhar na mulher à sua frente — sua mãe — e um fogo sombrio acendeu-se em seu coração.
— Eu não traí ninguém! — A voz de Agatha tremeu, mas não era medo. Era raiva, fervendo sob a superfície. Mas ela manteve o rosto composto, fingindo o desespero que sabia que todos esperavam ver.
— Roubou conhecimento além da sua idade e posição. Praticou as magias mais malignas — continuou a mãe, sem qualquer hesitação.
— Eu... eu juro que não sei de nada! — Agatha quase zombou de si mesma, com o teatro que fazia.
— Chega de mentiras! — gritou sua mãe.
E então, como uma serpente que trocava de pele, Agatha revelou sua verdadeira face. A postura vacilante desapareceu, substituída por um leve sorriso cruel. Ela ergueu os olhos, e sua voz carregou a verdade:
— Eu não violei suas regras. Elas se curvaram ao meu poder.
O círculo murmurou inquieto, mas sua mãe não vacilou. Ela era implacável. As bruxas ao redor começaram a recitar palavras de um feitiço antigo, suas vozes formando um coro sinistro que preenchia o ar. Não era um feitiço para remover os poderes de Agatha. Não. Era algo muito mais final. Elas pretendiam matá-la.
Por um breve momento, Agatha esperou. Esperou que sua mãe parasse aquilo. Que ela, de alguma forma, percebesse o erro de suas ações. Mas ao ver o brilho de determinação no olhar da mulher, Agatha percebeu a dolorosa verdade: sua mãe não a amava. Nunca amou. Estava disposta a matá-la.
— Esperem! Eu... eu não consigo controlar...! — A voz de Agatha quebrou, um tremor de pânico surgindo. Mas logo, a raiva prevaleceu, queimando dentro dela como uma chama que não podia ser apagada.
— SE AO MENOS VOCÊS TIVESSEM ME ENSINADO! — O grito rasgou o ar, mas as palavras caíram em ouvidos surdos. O feitiço avançava, e Agatha, pela primeira vez, sentiu o medo real de sua própria destruição. — AJUDEM-ME! POR FAVOR!
Mas as mãos das bruxas estavam agora cheias de magia. E em um último ato de desespero, Agatha olhou para sua mãe.
— Mãe... — As lágrimas escorriam pelo rosto de Agatha, seus olhos imploravam. — Mãe... por favor...
Nada. Apenas o olhar frio da mulher que um dia a trouxe ao mundo. E o feitiço continuava.
"Sua maldita do inferno." Agatha pensou. "Você me mataria. Mas você vai aprender o que é o verdadeiro poder."
Quando o feitiço foi lançado, a dor que atravessou o corpo de Agatha foi insuportável. Ela gritou, um som que era mais animal do que humano, enquanto a magia arrancava sua vida. Mas o que era segundos para as outras, para Agatha, parecia uma eternidade.
Então algo mudou. A dor deu lugar a algo mais profundo, mais sombrio. O medo se transformou em ódio, e em meio ao seu grito, o poder dentro dela se revelou. Os raios azuis que a matavam começaram a se tornar roxos. Sua verdadeira cor. Seu verdadeiro poder.
Agatha não estava apenas sobrevivendo. Ela estava vencendo.
O feitiço virou contra as bruxas, e seus gritos preencheram o ar. O poder delas foi arrancado delas, uma por uma, enquanto Agatha sentia sua força crescer. Sua mãe olhou para ela, horrorizada, incapaz de aceitar o que sua filha se tornara.
Agatha flutuou, libertando-se das correntes, e com um único gesto, lançou uma explosão de energia roxa. O chão ao seu redor tremeu, e quando a poeira assentou, todas as bruxas estavam mortas.
Ela pousou, respirando com dificuldade, olhando para o corpo inerte de sua mãe.
— Por favor, eu posso ser boa... — Agatha sorriu, um último resquício de ironia.
— Não pode — foi a resposta fria.
E com um simples movimento, Agatha roubou o poder da mãe. A última bruxa caiu, e o círculo estava completo.
Agatha respirou fundo. Olhou ao redor, observando os corpos no chão, e deu uma risada sombria. Desceu os degraus com passos firmes até sua mãe, inclinando-se para pegar o broche da mulher morta.
— Que você apodreça onde merece, velha maldita.
Um cavalo de chamas roxas surgiu das sombras, trotando até Agatha. Ele abaixou a cabeça, encostando o focinho em seu ombro. Um gesto de carinho que ela não sentia há anos. Agatha sorriu, subiu no cavalo, e sem olhar para trás, partiu pela Estrada Mãe — uma estrada que levaria para onde ela quisesse.
Ela não olhou para trás. Ela não precisava.
Era 1693. E Agatha Harkness estava apenas começando a se tornar a bruxa mais poderosa do mundo.
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Birth Of Violence
FanficAgatha Harkness, a lider e a última das Bruxas de Salem que ainda resta viva. Vagando pelo mundo por mais de 325 anos, Harkness presenciou começos e finais de guerras, impérios se erguendo e caindo e fim de eras. Ela tem o conhecimento do mundo em s...