Cap 20- Fugitivos

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Ann não fazia ideia por quanto tempo cavalgou, que horas eram e a que distancia estava da cidade.

Ela se lembra de terem se afastado da estrada de terra em algum momento. Agora o alazão andava com cuidado por entre as árvores, com a boca espumando de tanto correr e o pêlo todo suado. Os primeiros raios do sol surgiam em algum lugar distante, clareando aonde eles estavam.

Lee respirava pesadamente contra seu pescoço. Ela só sabia que ele ainda estava consciente porque suas mãos apertavam com força ao redor de sua cintura.

- Ouviu isso? - ela sussurrou mais para o alazão, que levantou as orelhas com o som de sua voz, do que para o rapaz.

- Eles estão...? - havia apreensão em sua voz. Foi quando ela notou que ele falava baixo não para acompanha-la, mas porque estava doloroso falar.

- Não. Eu quis dizer água. Água correndo... Deve ser o rio que passa perto da cidade. - como se entendesse, o cavalo bufou e seguiu em frente, com o som que Ann ouvira se aproximando cada vez mais.

Eles pararam nas margens do que na verdade era um pequeno riacho, que mais pra frente se alongaria em um rio. Mas aqui era possível passar a pé com facilidade.

Ann segurou as mãos de Lee para que ele a soltasse.

Ela desceu do alazão poucos segundos antes de ele tombar e cair em cima dela. suas costas doeram com o baque no chão e o lugar de sua cintura que fora nocauteado a fez demorar a se levantar. A cabeca de Lee repousava em seu peito. Quente. Muito, muito quente.

Com muito esforco, ela o ergueu e se levantou. Ele suava frio e seus olhos estavam fechados.

- Ah não... - ela o segurou por debaixo dos braços e o arrastou ate um tronco caido a poucos metros de distância. Os lábios finos do garoto tremiam enquanto ele ardia em febre.

Ela correu ate o riacho e rasgou um pedaço de seu vestido. Molhou o pano e bebeu rapidamente alguns goles de água e lavava o rosto do sangue seco que escorreu de seu nariz. O alazão agora solto, bebia avidamente ao lado dela.

A primeira coisa que ela fez foi espremer o pano na boca de Lee. A água escorreu lentamente para dentro e ele engoliu. Seus olhos abriram um pouco.

Ela repetiu o processo mais algumas vezes e depois usou o tecido para limpar o sangue em volta de sua perna. A flecha ainda estava lá e o sangue ainda saia, mas em menor quantidade. Com alguma dificuldade, ela rasgou o tecido da calça de Lee e encostou o pano.

Ele estremeu ao seu toque e quando ela terminou, seus dedos envolveram o objeto pontudo e seus olhos vermelhos encontraram os dele.

- Não se preocupe comigo. Só tire isso logo... - a voz estava um pouco mais firme, mas ainda cheia de dor.

Ann colocou seu braço direito do lado de seu tórax e o outro empurrou para a direita. Ele era pesado quando tombou, de forma que ela se aproximou mais e mudou seu braço do tórax para ao redor dos ombros, encostando a cabeça de Lee em seu peito.

A mão esquerda segurou de novo o cano da flecha. A ponta afiada era visível do outro lado da coxa do rapaz.

Pelo menos não pegou no osso...

- Eu vou... Vou ter que enfiar a flecha mais para dentro, para quebrar a ponta - ela engoliu seco e ele murmurou algo como um "tudo bem".

Sua mão fez forca para baixo e ela sentiu os dentes cerrando de Lee. Empurrou mais um pouco e os dedos dele enfincaram no vestido dela que cobria sua perna. Quando foi possível ver a ponta de metal do outro lado, tanto ela quanto ele seguravam a respiração.

Ann o encostou novamente no tronco e se moveu para o lado. Tentou quebrar a ponta com as mãos, mas a madeira era muito firme.

Pensou em bater uma pedra ali, mas causaria ainda mais dor a ele. Ela tentou de novo e ele soltou um gemido.

- Desculpe... - Seus lábios tremiam. Saiu mais sangue do local. - Ah meu deus...

- Feche os olhos e fique com raiva. - Ann demorou perceber que ele falava com ela. Havia duvida no olhar que lançava ao rapaz, mas ela o fez.

Diferente de antes (quando envocou o calor para salvar Cierra), o poder veio mais forte e mais quente. Ela pensou nos olhos das pessoas que a olharam naquela noite. Nojo e desprezo... Não era nada comparado ao que ela guardava para ela sobre eles.

Sobre o que fizeram com sua mãe.

Seus dedos se aqueceram e ela abriu os olhos. Segurou o cano da flecha e, como se fosse feito de papel, ela o quebrou sem o minimo esforço.

Calmamente, o calor a deixou. O frio a atingiu de uma vez e ela olhou para Lee novamente enquanto segurava a flecha pelo outro lado.

Ele acenou com a cabeça para que continuasse.

Ann colocou a mão suada do rapaz em seu ombro e começou a puxar a flecha. Ele arfou de dor novamente.

Ela nao ousou olhar para ele. Se concentrava em retirar o objeto de sua perna... Mas mais sangue jorrava e sujava suas mãos pálidas.

Quando ela deu puxão mais rápido, a flecha saiu. Os dois soltaram o ar que prendiam.

Ela rasgou mais algumas tiras de seu vestido e correu para o riacho novamente. Molhou um dos pedaços e voltou para limpar o ferimento.

Os outros rasgos envolveram a perna do rapaz com forca, estancando o sangue.

- Nós... Temos... Que ir...

- Não ate você melhorar. - a voz falhou no final. Lágrimas encheram seus olhos enquanto ela ainda tentava não pensar na situação que estava.

Cierra ainda estava na cidade.

Seu pai estava longe.

Os dois corriam perigo e ela não podia voltar.

Lee estava ferido. Ela estava ferida. Não tinha como saber onde estavam nem quem estava e quantos estavam atrás dela e...

Lee encostou os dedos em seu rosto.

- Não chore... - ele engoliu seco. Seus olhos puxados a fitavam com tristeza - Isso tudo e minha culpa...

Ann riu. Um riso seco e sem sentido.

- Acho que você não entendeu a situação aqui Lee... Eu sou um monstro. Um monstro que fugiu, abandonou o pai e a irmã para o rei os matar e... E... Por que inferno você veio comigo?! Acabou se machucando desse jeito e se eles nos acharem... - Mais lágrimas sairam e ela começou a soluçar.

Meio desajeitado, ele ergueu o braço e a puxou para si. A testa dela se encostou embaixo de sua cabeça. O corpo dele estava extremamente quente.

- E minha culpa... Por que devia ter te protegido. - Ele passou os dedos no cabelo prateado da garota, se lembrando de algo. - Eu prometi isso.

- O quê? - ela se afastou. O rosto dos dois agora estavam a centímetros um do outro. - Prometeu a quem?

- A sua mãe... - Seus olhos puxados se fecharam de cansaço e não se abriram mais.

- Seraphine? Como você sabe sobre ela? - mas ele não respondeu - Lee? Lee!

Sua respiração pesada foi a deixa de que ele tinha apagado. Ann exasperou em frustração.

As trezentas perguntas teriam que esperar.

O alazão se aproximou deles e abaixou a cabeça atrás de Ann. Seus olhos equinos a fitavam com interesse. Ela se virou para o equino.

Foi só então que ela notou a mancha perto da boca e seu pêlo negro e reluzente.

-Pingo?

Ele bufou em reconhecimento e Ann se permitiu sorrir por alguns instantes.

- Acha que vamos conseguir escapar?

O silêncio fora sua resposta.

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