Capítulo 14

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Atravesso a casa a passos rápidos e precisos até a garagem/oficina de Tony. Sei que ele costuma treinar aqui, só tenho que achar onde. Ele é adepto ao Wing Chun e está sempre dizendo o quão bom é, mas nunca o vi praticar. Sei que é uma arte marcial do tipo de defesa pessoal mas só sei isso mesmo. Ele já tentou me ensinar mas desistiu depois que fiquei rindo do quão ridículo ele ficava com aquela roupa.

Depois de um tempo passando por toda aquela tecnologia e coisas estranhas acho sua academia. Vou em direção ao ringue que tem um boneco de pancada no meio. Estranhamente coincidente e propício. Reparo numas luvas no banco, que suponho ser do Happy, e as visto. Não sei o que estou fazendo exatamente pois nunca fui do tipo atlético, mas suponho que isso me ajude a lidar com a raiva.

Em frente ao boneco não sei como começar. Dou um soco desajeitado aqui, outro ali. As lembranças de todos esses dias que passei aqui começam a passar pela minha mente e começo a descontar a raiva. 

Em certo momento, vejo o rosto de Virgínia no lugar do boneco. Sinto raiva por ela ter me convidado e me convencido a vir. Dou apenas um soco e logo o rosto se transforma no meu, como se eu estivesse me vendo no espelho. Sinto raiva por ser quem sou e como sou. Raiva por ser fraca e não resistir ao convite e acabar aqui, agora. O próximo rosto é o de Tony. Sinto raiva por ele ter me visto daquela maneira tão frágil e ter me dado esperanças. 

Quando penso que o próximo rosto será o de Robert me surpreendo com o meu novamente. Talvez, eu não esteja com raiva de nenhum deles. Só estou tentando culpa-los. A realidade é que sinto raiva de mim mesma. Nunca fui uma pessoa que se arrisca, sempre fiquei na minha zona de conforto. O que eu imaginei que aconteceria se eu mudasse assim do nada? 

Talvez eu nem esteja com raiva. Talvez seja desapontamento. Talvez tristeza. Na realidade, eu não sinto nada e ao mesmo tempo sinto tudo. Tenho uma energia inquieta dentro de mim que me perturba. Ao mesmo tempo que tenho vontade de gritar por aí, quero me isolar num canto e chorar. Vejo meu peito descendo e subindo rapidamente e percebo que estou hiperventilando.

Retiro as luvas e as jogo ali no meio e saio do ringue. Me sento com uma perna de cada lado do banco e me deito. Talvez eu esteja sendo muito dura comigo e com ele, mas me senti enganada com tudo isso. Tenho que parar de agir como uma adolescente e ser racional. Mesmo que tenha sido uma situação completamente diferente, a última vez que me zanguei e afastei dele do nada a conversa foi a solução. Talvez eu deva relaxar um pouco e depois tentar ter uma conversa madura com ele. 

• - •

- Bom dia, Soph. 

- Dia. - tiro momentaneamente os olhos do celular para lhe responder.

- Tudo bem? - Tony me olha com receio.

Abaixo o aparelho e o encaro. Talvez eu realmente tenha batido a porta forte. 

- Está sim. Só um pouco cansada.

- Imagino o John então. 

- John?

- É, o boneco de pancadas. John Doe.

- Como sabe que estive lá?

- Ora, você achou mesmo que eu não saberia se alguém entrasse na minha oficina? - Enfia um donnut na boca.

- Eu só precisava relaxar um pouco.

- Aconteceu alguma coisa pra isso? 

- Bom, amanhã é o dia que vou embora. Voltar pra minha rotina louca. - Rio fraco

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