O3 - quando o vento frio sopra do norte (o que devo fazer)

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! ! ATENÇÃO ! !

O capítulo a seguir tem os seguintes possíveis gatilhos, você foi avisado.

— Ataques de pânico.

capa feita por @/Fire_Venus101 no twitter

Tommy sabia uma coisa ou duas sobre segredos.

Ele tinha cinco anos de idade quando ouviu a palavra pela primeira vez, sussurrada de pai para filho.

"Vamos manter isso em segredo, certo, Wil?" Pai tinha dito em um gentil silêncio da meia-noite, inconsciente de que Tommy estava bem do lado de fora da porta da biblioteca, agarrando-se a cada palavra. Mesmo então, Tommy deveria saber que Wilbur era especial, se Pai estava falando com ele daquele jeito: não como que ele era uma criança chata, mas como eles fossem iguais, carregando os mesmos fardos e cicatrizes de batalha.

"Mas e se elas nunca forem embora?" Wilbur sussurrou de volta. Tommy nunca ouviu seu irmão mais velho tão assustado.

Tommy foi embora antes de conseguir ouvir o resto da conversa que obviamente não conhecia. Olhando para trás, talvez uma parte dele queria preservar a dourada imagem de seu irmão mais velho—como um fóssil morto cristalizado em âmbar. Porque irmãos mais velhos nunca tinham medo. Irmãos mais velhos nunca sangravam. Irmãos mais velhos nunca se encolhiam. Irmãos mais velhos eram imortais. Ele manteria essa crença até que fosse tarde demais.

Ele tinha seis anos de idade quando conseguiu um segredo para guardar, e verdadeiramente entendeu seu peso.

Um ano depois, e seu irmão foi coroado.

Tommy orgulhosamente estava de pé na multidão enquanto Wilbur se ajoelhava na frente de um homem de túnica branca. A luz do Sol das janelas presas nas joias da coroa acima da cabeça de Wilbur—uma coroa que um dia foi de seu pai, mas não mais. Wilbur recitou juramentos de proteção e generosidade, bondade e justiça, justiça justa e inabalável fidelidade para o reino, e o homem de túnica o proclamou Rei Wilbur, Protetor e Governante do Reino. Por muito tempo ele reine. Tommy foi o que comemorou mais alto, o suficiente para tremer as vigas acima, e quando Wilbur sorriu, ele sabia que era só para ele.

Dois anos depois, na cúspide de seu décimo aniversário, Tommy perguntou a Technoblade a mesma pergunta que ele vem perguntando desde o dia que se conheceram. Você irá me treinar? Desta vez, Technoblade disse sim.

Tempo desenrolou como pergaminho desamarrado, rolando para longe sem o aviso de Tommy. Eles cresceram juntos, ele e seu irmão rei. Mais altos e amplos, mais fortes e espertos—mais Wilbur no último, se Tommy fosse honesto. Os deveres de Wilbur o tiravam de Tommy mais frequentemente do que não, mas estava tudo bem, também, porque Tommy tinha Techno. Eles duelavam e conversavam até Techno inevitavelmente ser chamado de volta para o lado do rei, mas até aí Tommy estava satisfeito. Os dias que ele estava sozinho eram os piores, mas a maioria das vezes indistinguível com seu monótono silêncio.

Em um desses dias, ele se achou caminhando sem destino pelo castelo. No meio de um corredor vagamente familiar, ele ouviu algo que fazia muita falta desde a morte de sua mãe. Música.

Ele seguiu o som até uma porta que estava entreaberta. Tommy segurou sua respiração enquanto olhava entre a brecha, e então perdeu o fôlego ao mesmo tempo quando descobriu a fonte da lúgubre melodia: Wilbur, cansaço gravado na inclinação de seus ombros e na pele embaixo de seus olhos, tocando seu violão, dizendo palavrões sempre que errava uma nota ou duas, mas ainda continuando, ainda tocando, ainda soldando. E com ele estava Technoblade em um docemente desejoso violino, suas mãos com cicatrizes movendo-se suavemente sobre as cordas, seu braço do arco movendo-se com fluidez pelo ar. Ambos tinham seus olhos fechados, tão completamente perdidos em sua própria música, e Tommy sabia—dentro de si—que esse era um mundo que nunca conseguiria romper. E então ele fechou a porta e retrocedeu para seu silêncio.

Aos quinze anos de idade, Tommy era o mais velho que já esteve, mas ele nunca se sentiu tão jovem.

⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀________________

A câmara oficial de Wilbur não foi feita para aqueles de fora de seu conselho, mas Tommy nunca foi de regras. O guarda do lado de fora das esculpidas portas duplas (verdadeiramente pretenciosas, na correta opinião de Tommy) meramente suspirou ao ver Tommy descendo o corredor, e se moveu para o lado para deixá-lo passar.

"Sua Majestade tem muita papelada para fazer," o guarda disse, tentando—e falhando—ser duro.

"Nesse caso, então Sua Majestade certamente acolheria a minha estimada companhia," Tommy respondeu, dando ao guarda um sorriso e uma continência enquanto adentrava o escritório do rei.

Através da porta havia uma grande, escassamente decorada sala. Costumava haver pinturas nas paredes de reis passados—seus antecessores com cabelos dourados e brilhantes olhos azuis—mas a primeira coisa que Wilbur fez como rei foi tirá-las. Tommy lembrou sentar no chão do escritório, encarando Wilbur enquanto subia em uma escada, arregaçou suas mangas até seus cotovelos e começou a arrancar as pinturas de seus ganchos. Havia tanta violência em seus movimentos, como se a tarefa fosse a própria ruína de sua existência. Quando estava tudo pronto, Wilbur ficou no centro de sua devastação, observando as vazias paredes, e acenou com a cabeça uma vez para si mesmo, satisfeito. Tommy ainda não sabia se Wilbur até notava que ele estava lá, também.

As únicas pinturas na parede agora eram as paisagens que Mamãe costumava pintar. A favorita de Tommy era a de uma cordilheira envolta em névoa azul, pois ele podia ver no canto onde Mamãe havia lhe dado o pincel por alguns segundos—três errantes pinceladas em uma perfeita pintura que servia como um lembrete de que, em um tempo, Tommy havia existido no mesmo universo que sua mãe.

Estantes de livros ficavam contra uma parede, com as outras duas com janelas do chão ao teto com vista para os jardins lá fora. No centro de tudo havia uma escrivaninha, e um rei.Wilbur sentava rabiscando em um rolo de pergaminho. Sua coroa descartada ao lado de seu tinteiro e um copo de chá gelado.

"O que você 'tá fazendo?" Tommy respondeu, fechando a porta atrás dele.

Wilbur não respondeu. Ele nem deu indício de até estar ouvindo ele.

Tommy revirou seus olhos e apresentou duas maçãs de seus bolsos. Ele caminhou até a escrivaninha, moveu uma pilha de pesados livros de aparência importante e içou-se para uma posição sentada, com as pernas penduradas na beirada.

"Você esteve aqui o dia inteiro, sabe," Tommy disse futilmente, balanceando uma das maçãs na ponta de seu dedo. "Perdeu o café da manhã e almoço."

Wilbur somente grunhiu em resposta.

"O reino está em chamas," Tommy continuou. "Se rebelando nas ruas. Os guardas estão encenando um golpe. Techno está os guiando."

"Com certeza, Tommy," Wilbur disse evasivamente, alcançando para mergulhar sua pena no tinteiro.

Tommy casualmente moveu o tinteiro para longe de seu alcance. Wilbur o olhou, finalmente o reconhecendo, embora com aborrecimento.

"O que você quer, Tommy?" Wilbur perguntou, irritável.

Tommy pegou uma das maçãs e a plantou bem na frente de seu irmão. "Fome é um jeito bem merda de ir," Tommy disse. "Ache um jeito menos idiota de morrer."

Wilbur encarou a fruta como se nunca tivesse visto uma antes. "Não estou com fome," ele disse, nesse exato momento seu estômago começou a roncar.

Tommy bufou. "Que vergonha para você."

"Cala a boca." Mas Wilbur estava soltando sua pena e alcançando a maçã. Tommy mordeu a sua para esconder seu sorriso satisfeito com si mesmo.

Tommy se inclinou para dar uma olhada em o que Wilbur estava escrevendo. O familiar roteiro curvado de seu irmão já havia coberto a maioria da página com palavras como intenções e fortificações e recrutamento.

"Recrutamento?" Tommy repetiu através de uma boca cheia de maçã. "O que isso significa?"

"Engula antes de falar," Wilbur disse suavemente.

"Engula antes de falar," Tommy zombou. "Você soa como nossa velha governanta. Tão rabugenta—ack!"

Ele inalou rápido demais; maçã não mastigada deslizou de repente por sua garganta e se alojou lá. Tommy ofegou por ar, cegamente alcançando algo para beber. Wilbur precipitadamente colocou sua xícara de chá na mão de Tommy, e ele bebeu com gosto até que suas vias respiratórias estivessem limpas mais uma vez. Quando ele olhou para seu irmão através de um borrão de lágrimas, Wilbur estava desesperadamente franzindo seus lábios em uma valente luta para manter seu riso baixo.

"Você é um... imbecil," Tommy chiou. "E seu chá é uma merda."

Wilbur passou um polegar por sua própria boca para limpar seu sorriso. "Techno fez esse chá."

"Oh." Tommy olhou para a pequena xícara com curiosidade; ele não pôde imaginar seu duro tutor pacientemente preparando chá para qualquer um, até Wilbur. "É bom, então."

"Deuses, Tommy." Wilbur colocou seu cotovelo em sua escrivaninha e descansou sua bochecha contra a palma de sua mão. O olhar que ele deu a Tommy foi de extrema afeição, apesar da óbvia exaustão gravada em cada centímetro de seu rosto. "Uma dia você superará sua adoração por ele?"

Tommy deu mais uma, consideradamente menor mordida de sua maçã. Ele mastigou a polpa doce, pensando o tempo todo no tutor de cabelo rosa que havia ensinado a ele e a Wilbur tudo o que sabiam sobre sobrevivência—e não somente por lutas.

Techno podia ter ido embora. Ele deveria ter ido embora, depois dessas noites longas de Tommy acordando chorando, os humores sombrios de Wilbur, dias onde ambos se sentiam tão desgastados que desemaranhar uns aos outros parecia a única maneira de consertar, de frustração e raiva com nenhuma outra saída além de gritar. Mas ele ficou. Ele ficou para assistir Wilbur ser coroado, ficou para ser seu conselheiro mais confiável, ficou e o manteve junto quando todos esperavam o menino-rei se despedaçar sob a pressão. Ele ficou e marcou a altura de Tommy em uma das estátuas do pavilhão de treinamento apesar de sua insistência de que Tommy não cresceu um centímetro. Ele ficou mesmo após Wilbur o forçar a comparecer a bailes e galas, e suportou cada uma das zombarias de Tommy sobre os ternos pomposos que ele foi feito usar.

Como diabos Tommy poderia deixar de adorar alguém assim?

Tommy engoliu, encolheu os ombros. "Talvez se você fosse incrível, eu o adoraria, também."

Wilbur zombou. "Eu sou incrível."

"Wilbur, se você tem que dizer 'Eu sou incrível' para provar que é incrível, você não é incrível."

"Você lembra," Wilbur disse repentinamente, endireitando-se na cadeira e olhando para a fruta vermelho-sangue em sua mão, "quando costumávamos colher essas com a Mãe?"

E Papai, Tommy quase adicionou, mas se conteve. "Descíamos aos pomares com grandes cestos de vime," Tommy lembrou. "Você costumava me levantar e me colocar nos seus ombros para que eu pudesse pegar as que estavam em galhos mais altos."

Um sorriso melancólico acomodado nos lábios de Wilbur. "Eu provavelmente não consigo lhe levantar agora."

"Eu não sou tão pesado—"

Wilbur balançou sua cabeça. "Não é uma questão de eu conseguir, é uma questão se você deixaria."Tommy abriu sua boca para replicar, então rapidamente a fechou quando percebeu que era verdade. Ele provavelmente não gostaria de estar nos ombros de Wilbur, nem mesmo precisaria. Ele atingiu seu surto de crescimento em algum momento no ano passado, irritando muito Techno quando ficou claro que Tommy seria mais alto do que ele se mantivesse o ritmo. Isso significava que ele logo seria mais alto do que Wilbur, também.

"Nós podemos simplesmente tentar atirar em maçãs com flechas," Tommy ofereceu gentilmente.

"Eu irei tentar não atirar no seu olho dessa vez," Wilbur respondeu com uma risada.

"Eu não lembro muito dela," Tommy assumiu enquanto rolava sua maçã entre suas palmas, como se isso pudesse de alguma forma deixar a distante risada dela mais clara em sua cabeça. "Mas eu lembro o quanto ela amava os dias de colheita. Nós ficávamos lá até meia-noite, se ela conseguisse o que queria. Ela costumava colher as flores de maçã e jogá-las em nós só para nos fazer rir sempre que reclamávamos que estávamos ficando entediados."

"Não," Wilbur quietamente disse. "Quem fazia isso era o Pai."

Tommy queria se chutar. "Oh. Bem. Desculpa, eu acho, eu lhe disse que eu não me lembro—"

"'Tá tudo bem, Tommy, não precisa se desculpar." Wilbur jogou sua maçã para o alto e a pegou graciosamente com uma mão. "Ele lhe abandonou, também."

Eles comeram o resto de suas maçãs em silêncio, nenhum dos dois dizendo outra palavra sobre os fantasmas que pairavam sobre eles por quase uma década. Tommy achava que as pessoas eram assombradas por dois tipos de fantasmas: os fantasmas daqueles que morreram e daqueles que partiram. Foi apenas sua sorte de ter os dois.

Quando ambos acabaram, Wilbur silenciosamente embrulhou os núcleos em uma folha extra de pergaminho e os colocou na borda de sua mesa para posterior descarte. Ao fazer isso, a atenção de Tommy foi atraída de volta para a carta em que Wilbur estava trabalhando quando entrou.

"Você não respondeu minha pergunta," Tommy disse, ociosamente chutando seus calcanhares contra a escrivaninha de Wilbur. "O que recrutamento significa?"

Wilbur suspirou enquanto pegava sua pena novamente. "Você não precisa saber, Tommy."

Tommy se irritou com a dispensa descuidada. "Eu sou um príncipe desse reino, Wilbur. Eu mereço saber."

Wilbur arqueou uma sobrancelha à ele. "Oh, de repente você está interessado nos assuntos do reino?"

"Eu sempre fui interessado."

"Qual é o nosso produto exportado mais lucrativo, então?"

"Uh." Tommy escaneou a mesa. "Maçãs. Chá? Pergaminho."

Wilbur revirou seus olhos. "Você é uma criança ridícula." Ele começou a rabiscar na carta mais uma vez.

"Eu não sou uma criança," Tommy murmurou.

"Você é. Olhe para si mesmo. É para você ser um príncipe, e ainda assim você passa seus dias lutando com Techno, ou irritando os guardas, ou me irritando. Qual parte de seu comportamento não é infantil?"

A pena de Wilbur parou no meio de uma frase enquanto suas palavras pairavam sobre eles. Tommy sentiu calor subir em suas bochechas e levantou-se apressadamente antes que Wilbur pudesse ver. Seu estômago se agitou com o insulto, e o sabor persistente de maçã em sua língua se tornou râncido e amargo.

"Tommy—" Wilbur chamou, mas Tommy já estava caminhando até a porta. "Tommy, espera."

"Você não é a porra do meu chefe," Tommy cuspiu as palavras sem se virar, enlaçando suas palavras com uma venenosa raiva.

"Eu sou, na verdade, mas isso está além do ponto." Tommy ouviu o assento de Wilbur arranhar contra o chão, mas nenhum passo correndo atrás dele. "Tommy! Deuses. Você estará provando meu ponto se você passar por essa porta."

"Eu não me importo. Foda-se você, Wilbur, foda-se você!" Tommy abriu as portas, assustando o guarda do lado de fora. Ele marchou além da soleira, batendo em suas bochechas como se isso pudesse de alguma forma dissipar a vergonha acumulada lá.

Ele não deveria estar tão bravo assim. Os três—Techno, Wilbur e o próprio Tommy—disseram coisas piores no passado, para e sobre uns aos outros, mas raramente doía assim. Talvez porque veio no acordar da memória de seu pai sendo evocada entre eles. Talvez porque foi a sua primeira conversa adequada em uma semana. Talvez porque Wilbur estava certo. Wilbur sempre estava certo.

As portas se fecharam atrás dele, ecoando por o vazio corredor.

Vamos, Tommy rezou, corra atrás de mim.

Mas as portas permaneceram fechadas, e aquela resposta foi o suficiente.

⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀________________

Tommy achou Techno no pavilhão de treinamento, praticando suas estocadas com o tridente de prata Wilbur o tinha presenteado alguns anos atrás. Technoblade deu uma olhada na expressão no rosto de Tommy e o jogou uma lança que estava encostada contra uma das estátuas. Sem nenhuma palavra, eles ficaram em posição no meio do pavilhão, avaliando-se por um momento antes de entrarem em ação.

Depois de seis anos sob a tutoria de Techno, Tommy conseguia se defender contra cavaleiros com o dobro de sua idade e tamanho. Ele até venceu Wilbur uma vez, embora o irmão mais velho afirmasse profusamente que ele pegou leve com Tommy. Mas ele nunca venceu Techno.

Tommy tinha certeza que até Wilbur, que treinava com Techno há mais tempo, nunca venceu seu tutor. Em um momento verdadeiramente desolador, quando ele tinha treze anos, Tommy eventualmente percebeu que o homem que eles estavam lutando contra talvez nem estivesse usando toda a sua força.

Mas isso não importava agora. Não era sobre vencer desta vez.

Tommy correu até Techno com um grito visceral, um som que veio do fundo de seu peito. Techno o desviou facilmente, mas Tommy continuou o ataque, desferindo golpe após golpe de estilhaçar os dentes. Ele continuou gritando por tudo isso, gritando sem sentido, gritando com seu irmão, com seu pai, com seu reino, com os próprios deuses. Ele sentiu como sua garganta pudesse rasgar ao meio.

Tommy conseguiu empurrar Techno de volta para uma das estátuas, aquela que carregava marcas da altura de Tommy ao longo dos anos. Techno grunhiu enquanto Tommy empurrava a ponta de sua lança contra o peito de Techno, e então retaliou prendendo sua flecha nas pontas de seu tridente. Com um único empurrão de seu braço, Techno arrancou a lança das mãos de Tommy. Ela caiu no chão em algum lugar atrás de Tommy, mas isso não o impediu. Ele cerrou os punhos e bateu indiscriminadamente em Techno, suas juntas dos dedos encontrando um braço, uma costela, uma clavícula.

E Techno simplesmente ficou lá, levando tudo isso. Ele deixou Tommy queimar sua raiva para exaustão, sem nenhuma palavra de protesto. Quando Tommy caiu no chão, uma bagunça suada e pesada, Techno silenciosamente afastou sua própria arma e deitou ao seu lado.

Eles passaram meia hora daquele jeito, encarando o teto, escutando a rigorosa respiração de Tommy lentamente desanuviar. Nenhum dos dois falaram. Nenhum dos dois precisavam. O silêncio era uma linguagem por si só, e Techno era o mais fluente nele. E então ele era o único que sabia exatamente como quebrá-lo.

"Deixe-me adivinhar," Techno falou pausadamente, "você e Wilbur brigaram de novo?"

Tommy expirou por seu nariz. "Me chamou de criança irritante," ele murmurou.

"Ele faz isso todos os dias, Tommy."

"Eu sei. Foi diferente dessa vez, no entanto. Ele pode realmente ter falado sério."

"Ah." Houve um farfalhar de tecido quando Techno cruzou os braços sob a cabeça. "Bem, Wilbur não está tendo uma semana muito divertida, então eu lidaria com qualquer coisa que ele dissesse com uma pitada de sal."

"Eu não sabia disso," Tommy resmungou. "Nenhum de vocês me contam nada."

"Você nunca expressou um desejo de ser contado."

"Eu iria apreciar ser contado independentemente."

"Anotado, então."

Outro momento de silêncio esticou antes de Tommy sussurrar, "Ele nem correu atrás de mim. Ele corria, antes."

Com o canto do olho, ele viu Techno se mover, para que pudesse olhar para ele, o braço apoiado no chão.

Quando Techno falou novamente, sua voz estava paciente. "Antes do que? Antes de ele ser rei?"Tommy suspirou. Ele sentiu como se seus pulmões tinham se soltado em todo o caos. Tudo em seu peito estava tudo muito apertado, tudo muito dolorido. Ele fechou seus olhos contra a dor, vendo seu irmão na escuridão: cachos castanhos caindo sobre seus olhos enquanto ele se curvava sobre o violão, sorrindo com a sua própria música. Tommy daria qualquer coisa para ouvir Wilbur tocar daquele jeito de novo.

"Não," Tommy começou, repensando suas palavras mesmo enquanto estava falando elas, "ser rei não tem nada a ver com isso. Eu acho que quero dizer que era diferente antes... antes de ele começar a escolher ser rei em vez de ser meu irmão mais velho."

"Oh, Tommy." A tristeza na voz de Techno fez os olhos de Tommy imediatamente abrirem. "Você acha que ele tem escolha?"

Tommy rolou para finalmente olhar Techno nos olhos. Nada muito mudou em Techno ao passar dos anos. Ele ainda deixou seu cabelo longo e ocasionalmente deixava Tommy o trançar. Suas mãos permaneceram com as mesmas cicatrizes de sempre, com algumas novas de vez em quando de aventuras que ele nunca contou a ninguém, e ele ainda trajava camisas com babados demais para o gosto de Tommy. Mas ele não havia mais o brinco de esmeralda que costumava usar quando eram mais novos; Tommy não pôde lembrar a última vez que viu Techno com ele. No seu lugar estava a safira que Tommy lhe deu dois anos atrás—majoritariamente como uma brincadeira, e ele apenas admitiu que ficou satisfeito em ver o Techno o usando sob ameaça de morte.

A expressão de Techno estava fechada, daquele jeito dele sempre que tópicos desconfortáveis ​​surgiam. Seu passado. Segredos de Estado. Papai.

"Algo realmente está acontecendo," Tommy disse, observando o rosto de Techno cuidadosamente. "Algo ruim."

A face de Techno permaneceu inalterada, exceto por a reveladora peculiaridade no canto de sua boca que sinalizava sua raiva. Tommy só viu Techno verdadeiramente irritado um punhado de vezes, e não estava ansioso para aumentar a lista.

"As coisas estão um pouco frágeis agora," Techno disse, "mas eu estou tentando. Eu realmente estou, e eu preciso que saiba disso, Tommy."

"Eu sei," Tommy disse resolutamente. "Eu confio em você."

Porque enquanto Techno ficava quando Tommy e Wilbur estavam em seu pior, eles o reembolsaram em gentileza. Alguns anos após o reinado de Wilbur, Techno começou a estudar estadismo e política e etiqueta, como se sua própria vida dependesse disso. Era o único aspecto que faltava nele, ele disse, e ele precisava dar cobertura para Wilbur quando a pressão chegasse ao chão de debate. E quando Tommy e Wilbur não conseguiam entender seu repentino zelo, eles ainda sabiam que seu tutor precisava de descanso tanto quanto outro ser humano, então eles desenvolveram seus próprios sistemas em conseguir fazer Techno comer e beber, e muitas vezes tiveram que fisicamente arrancá-lo da biblioteca. Techno eventualmente cedeu para se acalmar depois de derrubar Wilbur no chão em uma de suas lutas para levá-lo para a cama.

E quando às vezes desaparecia no meio da noite, ou ia para deuses-sabem-onde por dias a fio, eles simplesmente o recebiam quando estava pronto, sem nenhuma pergunta—parcialmente por causa da expressão no rosto depois de suas pequenas aventuras implicava que quem perguntasse seria jogado de uma varanda.

"Se as coisas estão tão ruins, por que você está aqui, então?" Tommy perguntou. "Você não deveria estar ao lado do rei, Senhor Braço Direito?"

Techno enrugou seu nariz em resposta.

"Oh." Risada borbulhou de Tommy, espontânea, mas bem-vinda. "Entendo, entendo. Ele lhe expulsou, também, não foi?"

"Eu sugeri uma solução que resolveria todos os nossos problemas com muita facilidade. Wilbur vetou. Com firmeza."

Tommy sorriu. "Então você está fazendo uma birra."

Techno zombou. "Eu não sou você, Tommy." Ele pausou. "Mas suponho que, de acordo com a definição do dicionário de birra, estou atualmente no meio de uma."

Tommy começou a rir, aquele tipo de risada que terminava em chiados e soluços. Techno o assistiu com um leve sorriso, e os dois se deleitaram com a simplicidade disso: só dois garotos no chão em um dia quente de verão, risadas refletindo em sua pele como a luz do Sol.

"Nós ficaremos bem, Techno," Tommy o assegurou quando finalmente se acalmou. "Digo, é você e o Wilbur. Você vai descobrir como sempre faz."

Techno encarou Tommy por um momento antes de rapidamente desviar o olhar. "Isso é lixo sacarina o suficiente para um dia, eu acho. Se levante para que eu possa lhe derrubar no chão de novo."

"O que sacarina significa?"

"Significa que você precisa atualizar seu vocabulário, Tommy." Techno se pôs de pé e ofereceu a Tommy uma mão.

Tommy sorriu enquanto Techno o puxava para cima, e embora sua palma tivesse cicatrizes, estava quente.

⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀________________

Tommy girou os ombros para trás até ouvir o estalo satisfatório de seus ossos se endireitando. Ele e Techno duelaram até o Sol descer, em que um ponto um mensageiro chegou para informar Techno que o Rei Wilbur estava chorando por ajuda (não com essas palavras, mas perto o suficiente na interpretação).

"Vá," Tommy encorajou quando Techno hesitou nos degraus que desciam para o pavilhão de treinamento. "Pelo menos um de nós é bem-vindo de volta nas boas graças de Sua Majestade."

"Ele deveria estar procurando um caminho de volta para as suas," Techno respondeu, e foi embora.

Techno passou o resto da tarde golpeando um boneco de treinamento com sua lança, até outro servo chegar para o chamar para o jantar que—sem nenhuma surpresa—ele comeu sozinho em uma vazia sala de jantar. Após isso, ele decidiu engolir seu orgulho e encontrou seu caminho de volta ao escritório de Wilbur. O guarda parado do lado de fora se foi, o que significava que Techno ainda estava lá dentro; afinal, quem precisa de guardas com Technoblade lá?

À medida que Tommy se aproximava, vozes começaram a se infiltrar por a porta, abafadas, mas ficando mais claras à medida que ele se aproximava.

"—quietas hoje," alguém estava dizendo. "Mas isso dificilmente significa algo. Eu acho que elas sabem de algo que eu não sei, Techno."

Tommy segurou sua respiração enquanto pressionava seu ouvido contra a porta.

"Você fez os exercícios de respiração que eu lhe ensinei?" A suave fala arrastada de Techno.

"Se eu—é claro que eu fiz. Eu fiz tudo que você disse, eu sempre faço." O carregado múrmuro de Wilbur.

"Então por que você não me deixa fazer isso para você?"

Fazer o que? Tommy encostou o mais próximo que ousava.

"Porque não irá ajudar," Wilbur disse. Soava como uma discussão que eles já houveram um milhão de vezes. "Nós não sabemos o porquê de estarem se reunindo na borda ainda."

"Você estudou história. Você sabe que nada bom vem daquele tipo de intriga, Wilbur. Entretanto, quanto mais esperarmos, menos preparados estaremos quando eles—"

"Se eles atacarem," Wilbur interrompeu, "nós não estamos inteiramente despreparados. Eu enviei os avisos de recrutamento."

Houve uma pausa carregada. "Você enviou?" Tommy não sabia se Techno soava mais impressionado ou indignado. "Quando?"

"Essa tarde, após meu pequeno irmão me olhar nos olhos e percebi o quanto tenho a perder."

Nesse ponto, Tommy já se afastara precipitadamente da porta como se o queimasse. Ele girou em seus calcanhares e correu, sua cabeça girando e seu coração martelando, incerto se deveria rir ou chorar. Algo ruim estava realmente acontecendo, algo que fez Wilbur pensar que irá perder tudo. Tommy não prestou muita atenção aos seus tutores de história (eles nunca eram tão incríveis quanto Technoblade) mas ele sabia que sua família manteve paz no reino por décadas, e conversas sobre bordas nunca foram casos alegres.

Agora, no silêncio de seu quarto, ele compassou, trabalhando as torções em seu corpo e se esforçando para ignorar a torturante sensação de que estava à beira de algo grande demais para ser compreendido.

Mas havia uma coisa que com certeza ele soubera. Nada disso teria acontecido se seu pai tivesse ficado. Techno ficou, mesmo quando eles o conheciam por alguns meses. O que o teria parado de fazer o mesmo?

E então havia a culpa de saber exatamente o que poderia ter feito ele ficar. o que poderia ser feito. Segredos. Que terríveis, pesadas coisas.

Tommy ainda estava abrindo caminho por o tapete quando ouviu a batida, o assustando para fora de seus pensamentos.

"Sim?" ele chamou, subitamente com vontade de alcançar por uma das espadas decorativas penduradas em sua parede.

"Sou eu."

Wilbur. Tommy relaxou. E então, sacudindo novamente, Wilbur?

Tommy abriu sua porta lentamente, incerto de quem estava o esperando no outro lado: o rei ou o irmão?

Mas parado na soleira, seus ombros caídos e seu sorriso cansado, estava apenas Wilbur.

"Olá," Wilbur disse. "Posso entrar?"

Tommy revirou seus olhos. "Techno o disse para vir, não foi?"

O sorriso sumiu do rosto de Wilbur. "Isso importa?" ele perguntou exausto.

"Suponho que não." Tommy se afastou para permitir a entrada de Wilbur.

Wilbur entrou sorrateiramente como um turista, olhando para cada centímetro do quarto de Tommy como cada pequena coisa fosse um artefato inestimável. Quando foi que Tommy permitiu que seu irmão mais velho entrasse em seu quarto pela última vez? Provavelmente na mesma época que Wilbur moveu suas coisas para os aposentos do rei.

"Eu gosto disso," Wilbur disse futilmente, apontando para uma antiga estrela da manhã pendurada ao lado da porta. "Realmente une o quarto, eu acho."

"Corta o papo furado, Wilbur," Tommy estourou, a veemência da manhã voltando como ondas amargas para a costa. "Só me diz porque você está aqui."

Wilbur suspirou enquanto se jogava em um dos sofás vazios. "Nós precisamos conversar, Tommy."

"Certo." Tommy se encostou contra a parede e cruzou seus braços, observando Wilbur desconfiado. "Diga, então."

Wilbur cruzou suas penas e retornou o escrutínio de Tommy dez vezes mais; seus escuros olhos pareciam ser feitos com o único propósito de encarar as pessoas. "Primeiramente, eu gostaria de me desculpar por o que eu disse mais cedo. Você nunca foi uma irritação para mim, Tommy. Mas você é uma criança."

"Wilbur—"

Wilbur levantou uma mão para silenciá-lo. "Me deixe terminar," ele disse, não exercendo a autoridade de um soberano, mas de um irmão primogênito. "Você é uma criança. Isto não é uma coisa ruim—você tem permissão para ser o que é, e você é jovem. Mas essa também é o motivo por qual achei melhor esconder as coisas de você. Nos meus esforços para lhe proteger, eu lhe afastei, e esta é a última coisa que eu quero. E você está certo, falar com o Techno me ajudou a chegar a essa conclusão, mas todos nós precisamos da ajuda do Techno de vez em quando, não precisamos?"

Tommy zombou, mas sabia que não podia discordar. Wilbur sabia, também.

"Eu não preciso ser protegido, Wilbur," Tommy disse fracamente.

"Então por que você sempre parece tão triste?"

Os olhos de Tommy prenderam em Wilbur. "O que?"

Havia um mundo de dor na expressão de Wilbur. "Quando você pensa que ninguém está lhe vendo, você parece tão triste, Tommy. Mas eu lhe vejo. Você faz piadas e ri e grita o dia todo, mas no momento que você está sozinho, você—você fica com essa cara. Como se estivesse carregando um enorme peso e está tentando achar algum lugar para o soltar, mas não tem nenhum lugar. Eu já vi essa cara antes, Tommy, e isso é porque eu tenho medo por você. Porque Pai—"

"Não," Tommy coaxou. "Não me compare a ele, Wilbur. Eu não sou nada como ele."

"Prove, então." Wilbur repentinamente se pôs de pé, fazendo Tommy se afastar contra a parede. "Faça o que ele nunca teve coragem de fazer, e me diga. Me diga o que há de errado, Tommy. Me diga o que você está carregando, e eu irei lhe ajudar."

O peito de Tommy se sentia apertado com a pressão do segredo com a idade de uma década. Seus olhos instintivamente escanearam o quarto por uma saída, um jeito de fugir, um jeito de nunca mais falar sobre isso. Ele queria nada além de se derreter no papel de parede atrás dele e nunca mais ver a luz do dia novamente.

A expressão de Wilbur suavizou com o pânico de Tommy, e lentamente se sentou de volta no sofá.

"Me desculpe," ele disse gentilmente. "Eu não quis—" Ele beliscou a ponte de seu nariz e soltou um longo suspiro. "Eu sou uma merda nisso. Ok. Ok. Aqui. Para prová-lo que posso aguentar seu segredo, eu lhe contarei o meu."

As sobrancelhas de Tommy franziram. "Você tem milhões de segredos, Wilbur. Talvez mais do que milhões."

"Eu sei, mas esse é o segredo, Tommy."

Lá estava ele novamente—o sentimento que estava parado no precipício de um abismo escuro e sem fundo.

"Eu," disse Wilbur, "ouço vozes." Ele tocou em sua têmpora. "Bem aqui. Vozes que não são minhas, ou de qualquer outra pessoa, até onde eu sei. Nós estamos tentando desvendar."

"Nós?" Tommy respirou.

"Techno e eu."

"Ah. É claro." Tommy inclinou-se um pouco para a frente, confusão e medo guerreando em seu intestino. "O que essas vozes dizem?"

"Às vezes, elas são enigmáticas. Vagas. Falando sobre destino e linhas. Às vezes, elas só me provocam. E às vezes, é pior." Wilbur tremulamente respirou fundo. "Tão pior."

"E agora?" Tommy perguntou, incerto se ele queria saber a resposta.

"Agora," Wilbur disse quietamente, "elas estão dizendo para eu te matar."

A respiração de Tommy prendeu em sua garganta. Ele estava de repente muito ciente de quantas armas—decorativas ou não—ele tinha em suas paredes. "Wilbur, você não pode—"

"Eu não vou lhe matar, Tommy," Wilbur disse, soando magoado que Tommy pudesse pensar o contrário. "Eu nunca lhe machucaria. Mas as vozes—elas dizem que é inevitável. Que é o seu destino morrer nas minhas mãos. Que isso é... que isso é uma história que já foi contada muitas vezes, e nós não conseguimos mudar o seu final."

"E como é o seu final?"

"Ruim," Wilbur sussurrou. Seu tom deixou claro que o que quer que seja, Tommy não estava preparado para ouvir.

"Bem você não—você não realmente sabe se o que as vozes dizem é verdade, certo? Talvez seja tudo besteira e que não vai realmente acontecer."

"Mas já aconteceu." Wilbur engoliu, e ambos ele e Tommy prepararam-se para o que ele estava prestes a dizer. "Dois meses atrás, as vozes me disseram que tinha algo vindo. Que um exército estava se reunindo na nossa fronteira do Norte."

"Mas nós não temos inimigos."

"Era isso que eu pensei, também. Mas eu mandei alguns espiões para investigar, só para garantir, e eles confirmaram." Wilbur juntou seus dedos, seus olhos mais duros e escuros que ferro polido. "Exatamente como as vozes disseram. Uma guerra pode estar chegando, Tommy."

O que foi mesmo que o Techno disse? Wilbur não está tendo uma semana muito divertida. Tommy poderia rir de como isso era um eufemismo, se ele não estivesse muito ocupado engasgando com a própria língua.

Guerra. Uma palavra tão pequena para uma coisa tão grande.

"Bem." Tommy deslizou ao chão enquanto suas pernas vacilaram. "É isso, então."

"Techno e eu estamos tentando contatar com os generais de exércitos estrangeiros," Wilbur disse, e Tommy notou por a primeira vez em quantos cabelos grisalhos Wilbur ganhara, quase brilhando na luz da Lua fluindo das janelas. "Nós estamos fazendo de tudo para impedir que aconteça, Tommy. Mas, sim, é isso. Esses são os meus maiores segredos. Os restos são inconsequentes." Ele respirou fundo, como se quisesse se equilibrar. "Eu acho que é a sua vez, Tommy."

Tommy riu amargamente. "Depois dessa revelação, qualquer coisa que eu dizer só irá soar estúpido."

"Não vai," Wilbur disse resolutamente. Ele encostou no sofá, dando a Tommy um olhar gentil. "Quando estiver pronto, Tommy. Eu estou bem aqui."

Tommy arrastou suas pernas para si mesmo e enrolou seus braços em volta de seus joelhos, agarrando-se para salvar sua vida. Isso tudo era muito, muito rápido. Ele queria gritar. Ele queria quebrar seus punhos ao meio na estátua de mármore com as pequenas marcas de Techno. Ele queria se beliscar e acordar ontem, quando nada estava errado além da dor cortante em seu peito que nunca desaparecia, mesmo depois de nove anos. Ele queria seus pais.

O mundo repentinamente ficou escuro, e nas sombras, Tommy soltou.

"Você quer meu segredo, Wilbur?" Ele pressionou seu rosto contra seus joelhos, como se isso fosse esconder sua vergonha do mundo. "Eu vi ele."

Ali estava. A verdade. Ou uma confissão. Ou os dois.

"Naquela noite, eu vi ele."

Ele ouviu Wilbur respirar fundo. Não havia necessidade de elaborar. Entre os dois, havia apenas um 'ele,' e apenas uma noite.

"Ele beijou meu cabelo, e foi isso que me acordou. Eu vi ele andar da minha cama, indo para minha janela. Eu vi ele abri-la, e eu vi descer. Ou pular. Eu quero dizer ele voou, como um pássaro. Mas eu não me lembro dessa parte muito bem. O que eu lembro é só estar deitado aqui. Totalmente acordado, sabendo que algo estava errado para caralho. Eu só fiquei deitado lá." Os olhos de Tommy começaram a arder, então ele os fechou antes que a primeira das patéticas lagrimas pudessem cair. "Eventualmente, eu saí da cama, e fui ao quarto deles, querendo acreditar que eu só sonhei aquilo tudo. E foi quando eu encontrei a Mamãe."

Ele poderia parar, em sua mente. Ele lembrava tão pouco dela, mas ele nunca conseguiu esquecer de como subiu na cama perto dela, tentando acordá-la. Ele nunca conseguiu esquecer a sua confusão quando ela não acordou, nem a dor cegante quando ele percebeu porquê.

"E na maioria dos dias, Wilbur, isso era tudo que eu conseguia pensar. Como eu estava acordado e poderia conseguir pará-lo, e poderia conseguir fazê-lo ficar, e você não nunca precisaria ser rei tão jovem. Eu poderia ter te poupado por tudo isso, Wilbur. E agora, tudo está sendo uma merda e é tudo minha—" Um soluço se soltou de seus lábios, repentino e impiedoso. "Eu quero lhe ajudar. Mas eu não sei como. Ninguém nunca me ensinou como."

"Tommy..." A voz de Wilbur parecia tão distante.

"Mas a pior coisa," Tommy continuou, tentando ignorar o laço cada vez mais apertado em volta de seu pescoço, "é que talvez eu podia ver isso chegando. Ele costumava ir até sua porta, no meio da noite, quando você costumava ficar no outro lado do corredor. Eu mantive minha porta aberta, só uma brecha, depois de acontecer por a primeira vez, só para ver se ele iria de novo. E ele foi, tantas vezes. Eu costumava pensar que ele iria bater eventualmente, mas ele nunca bateu." Tommy apertou seu segurar sobre si mesmo, tremendo com mágoa, e talvez com alívio, também. "Eu acho que ele estava se despedindo muito antes de partir, Wilbur."

Por um momento, a única resposta para suas palavras foi silêncio. Tommy estava com medo de olhar para cima, para ver se Wilbur foi embora, irritado e traído.

Mas invés disso, Tommy sentiu quentes braços o envolver e o puxar contra algo seguro e sólido.

"Tommy," Wilbur sussurrou no cabelo de Tommy, "você tinha seis."

E ali estava. Foi isso que quebrou Tommy, no final. Ele quebrou em seu irmão, envolvendo seus braços em volta do torso de Wilbur e enterrando seu rosto em seu peito. As lágrimas finalmente vieram, uma culminação de nove anos de culpa e paranoia, de tropeçando por a vida sem saber onde ele estava com seu irmão, de temendo que um dia, Wilbur talvez descubra o que ele falhou em fazer e o odiar para sempre.

Mas isso não era ódio. Isso era o oposto.

"Shhh." Wilbur correu uma mão através o cabelo de Tommy. "Está tudo bem, Tommy. Deixe tudo sair."

Só havia os dois naquele momento. Não havia nenhuma voz, nenhum fantasma, nenhum segredo.

Somente Wilbur e Tommy. Tommy e Wilbur.

Eventualmente, o soluçar de Tommy baixou. Suas bochechas estavam molhadas e geladas por causa de suas lágrimas, mas ele conseguia respirar mais fácil do que já respirou. Ele se afastou do círculo dos braços de Wilbur e achou seu irmão o olhando com uma gentileza que ele nunca poderia merecer em mil anos.

"Vê?" Wilbur disse, delicadamente limpando lágrimas perdidas nas bochechas de Tommy. "Não é mais leve com alguém a mais para carregar?"

Tommy fungou. "Você sempre tem que estar certo, não é?"

"Bem, é claro. Caso contrário, meu título de Grande Mestre da Pretensão seria despojado. O Conselho fariam uma festa."

Tommy riu molhado. "O que suas vozes dizem depois de sofrer essa desgraça?"

"Curiosamente," Wilbur disse suavemente, "elas estão bem quietas agora."

"Então o que acontece agora?" Tommy sussurrou no escuro.

"Eu não sei," Wilbur confessou. "Mas o que eu sei é que não deve haver mais nenhum segredo entre irmãos. Combinado?"

"Combinado." Tommy sorriu. "Sem mais nenhum segredo."

Wilbur olhou como se quisesse dizer algo a mais, mas Tommy nunca iria ter a chance de descobrir o quê, porque naquele exato momento, Techno entrou no quarto, sua expressão como fogo do inferno.

Wilbur se pôs de pé em um instante, alcançando por uma nota amassada que Techno o deu. Tommy observou o rosto de seu irmão drenar todas as cores enquanto seus olhos examinavam a mensagem.

"O que?" Tommy demandou, a batida do seu coração tocando em seus ouvidos. "O que diz?"

Quando Wilbur olhou de volta para ele, seus olhos estavam desoladores e assombrados. "Você queria saber para que recrutamentos serviam, Tommy? Bem, você está prestes a descobrir."

Passerine | Sleepy Boys IncOnde histórias criam vida. Descubra agora