O6 - minhas palmas e dedos cheiram a gasolina (de jogar combustível no fogo)

1.1K 47 66
                                    

! ! ATENÇÃO ! !

O capítulo a seguir tem os seguintes possíveis gatilhos, você foi avisado.

— Manipulação.
— Representações de violência/consequências de violência.

capa feita por @/UpS1gbT3f7op3Dr no twitter

Não haveria grandes discursos desta vez, Tubbo sabia. Invés disso, eles formaram uma linha sombria como almas esperando nos portões do submundo—onde eles encontrariam julgamento ou absolvição. Os únicos sons eram cansados murmúrios e quietas batidas enquanto os soldados sobreviventes do Exército Real empilhavam o que restou de seu acampamento em carrinhos e carroças. Ambos os machucados e mortos foram colocados gentilmente em camas de feno, com cobertores cobrindo o pior de seus ferimentos, uma cortesia fútil por um exército que havia visto o pior o dia antes. Eles encontraram alguns sobreviventes durante a busca na noite anterior, mas como Tubbo temia, havia principalmente cadáveres para carregar de volta. Às vezes nem mesmo um cadáver inteiro. Às vezes, só um braço, uma perna. Uma única mecha de cabelo cor de hibisco. Uma mão enrugada ainda segurando uma longa espada ensanguentada. Alguns voluntários ficariam no vale para continuar a busca sombria, mas para a maior parte do Exército Real—incluindo Tubbo—era hora de voltar para casa.

Casa. Ele havia partido apenas algumas semanas antes, mas mal conseguia imaginar isso em sua mente. Para ele parecia que tudo antes da guerra era uma vaga, desconhecida relíquia preservada atrás de um vidro embaçado. Por mais que Tubbo pressionasse contra isso, ele só podia ver vislumbres nebulosos do que estava por trás: uma fragmentada memória de uma quieta cidade, uma pequena casa nos subúrbios, sua família... Ele partiu para uma guerra no meio da noite, com apenas uma carta rabiscada apressadamente deixada na mesa de cabeceira de sua irmã para explicar onde ele estava indo, o que ele queria fazer. Eu irei proteger este reino. Proteger você. Ele se perguntou se ela ainda conseguia reconhecê-lo, quando ele não conseguia mais se reconhecer. Não era para isso que servia a família? Eles não deveriam conhecê-lo, mesmo quando—especialmente quando—ele se sentia como um estranho em seu próprio corpo?

Tubbo ergueu sua cabeça para o céu, deixando os fracos raios do amanhecer aquecerem seus membros congelados. Houve uma terrível tempestade na noite passada, mas os únicos traços dela hoje eram as gotas de orvalho agarradas à grama e a lama escorregadia sob as botas de Tubbo. Ele se sacudiu para fora de seu devaneio.

Havia mais trabalho para se fazer.

Havia sempre mais para fazer.

Lentamente, Tubbo teceu em torno da movimentada panóplia de pessoas e carrinhos, ajudando onde podia—amarrando caixas de suprimentos, alimentando os cavalos e checando seus freios, consertando a tipoia de braço de alguém. Qualquer coisa que o mantivesse se movimentando. Qualquer coisa que o distraísse do roer em seu intestino. Ele olhou sobre seu ombro para o vale atrás deles, esperando ver um soldado vestido de verde rastejando por os escombros em sua direção, reanimado por vingança, mas não havia nada além de ar livre e um bando de pássaros circulando preguiçosamente no alto. Corvos ou abutres—não importava qual. Eles estariam comendo bem hoje.

Instintivamente, os olhos de Tubbo começaram a abaixar. E foi quando ele os viu.

Uma simples carroça puxada por cavalos, indistinguível de suas vizinhas, exceto as duas pessoas que estavam de pé sobre ela como enlutados em um túmulo: um rei e um general, gêmeos em sua miséria. Tubbo sentiu uma estranha pontada em seu peito ao perceber quem exatamente estava naquela carroça, quem exatamente eles estavam se despedindo. Enquanto Tubbo observava, o rei se inclinou sobre a carroça, como se fosse entrar com seu morto. Mas então ele se afastou, seus ombros tremendo e suas mãos profundas em seus bolsos. Tubbo se perguntou se elas estavam tremendo, também. Por um momento, parecia que o general se aproximaria do rei, mas em vez disso ele puxou algo do próprio bolso e alcançou a carroça. Quando ele se inclinou de volta, suas mãos estavam vazias e paradas.

Passerine | Sleepy Boys IncOnde histórias criam vida. Descubra agora