Tenho dificuldade em levantar o corpo de Tom do chão. As lágrimas ainda escorrem descompassadamente pelo seu rosto vermelho, e eu começo a ficar preocupada com seu estado.
Eu sabia que a dor e o trauma estavam consumindo cada poro do seu corpo, mas não entendi, até o presente momento, a gravidade disso. Vê-lo com as mãos geladas, a boca completamente pálida e a respiração lhe faltando me deixa completamente desesperada.
Eu deveria ter notado antes essas malditas sequelas... Todos nós deveríamos, mas na maioria das vezes, elas são tão silenciosas que só notamos quando uma crise como essa acontece.
A Jenny deve ter notado antes, e agora, consigo entender porque a amizade entre eles ganhou tanta força, eles reconheciam a dor um do outro e a compreendiam inteiramente. Era como se falassem a mesma língua, como se conseguissem enxergar além do que nossos olhos, tão superficiais, conseguiam enxergar.
E é completamente impossível não me sentir culpada por ter sido tão idiota... Eu sempre soube o que a dor é capaz de fazer e sempre soube, perfeitamente, como tragédias conseguem nos transformar em versões completamente desconhecidas, que algumas vezes até nos assustam.
Mas, por algum motivo até o presente momento completamente desconhecido, preferi ignorar o que toda essa bagunça fez com o Tom. Talvez egoísmo, ou uma urgência absurda de acreditar que tudo estava normal, que nada ia mudar.
Que ironia... No fundo, eu sempre soube que tudo, absolutamente tudo mudaria.
Se é difícil para outras pessoas se acostumarem com as novas versões das pessoas que amam, imagine quando é necessário que você mesmo se reconheça outra vez.
Quando seus olhos encaram a si mesmo no espelho e não conseguem reconhecer, mesmo com um esforço desmedido, o ser humano parado bem ali na sua frente.
Eu conhecia todas as fases da dor, todas as fases do trauma, poderia exemplificar e catalogar cada uma... Eu deveria ter reconhecido isso nele, no momento em que os nossos olhares se cruzaram assim que eu acordei.
Mas preferi acreditar, cegamente, que tudo estava bem... Que ele continuaria sendo o Tom sem marcas e cicatrizes que conheci um dia.
Harrison me ajuda a erguer o corpo de Tom do chão e colocá-lo com dificuldade dentro do carro. Ninguém entende o que acabara de acontecer, na verdade, até eu me esforço para raciocinar. Demora um pouco até conseguir convence-lo de que posso dirigir o carro, mesmo em pedaços, é nítido que a minha saúde é algo completamente prioritária para ele.
Não tem bem um motivo para não estar dirigindo, quer dizer, não tem a ver com as luzes, com as buzinas, e possíveis estresses que o trânsito pode causar, nada disso. A verdade é que as sequelas de um acidente não aparecem de uma hora para outra, mas sim, gradativamente. Então a chance de estar conduzindo um carro, e ter uma convulsão por exemplo, é enorme. Em decorrência disso, eles pedem para que pelo menos, nos primeiros três meses, tentemos não fazer esse esforço.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Home - What if it was never you?
Romance"Eu preciso que você me escute... Eu preciso que você ao menos tente me entender..." - Seus olhos fitam os meus desesperados, como se procurassem em um algum lugar distante um pouco de perdão. "Eu fiz isso porque amo você... Por favor... Só me escut...