Acidente

1.9K 299 47
                                    

Charlie acabará de sair do escritório. Me viu deitado num dos pequenos sofás que tinha ali, um pouco perto da saída de sua sala.

Seus olhos me congregaram, as mãos apoiadas na cintura e a testa levemente franzida em sinal de alerta. Eu escutava música com os fones no ouvido, todo desengonçado no sofá que não era nada confortável.

Percebi sua presença só depois de abaixar o celular e tira-lo da cara. Não sei quanto tempo passou depois do último capítulo, mas agora era pouco mais de 21:00 da noite.

Não tinha mais Sol lá fora, tudo estava numa repleta escuridão.

— Não deveria ter deixado você vir. — Seu tom de voz mudou completamente. Preocupação, temor, medo? O que poderia ser eu não sei.

— Por que diz isso agora?

Charlie agia estranhamente depois dos acontecimentos das últimas horas, não tinha saído nenhum minuto da sala para ficar analisando o caso do animal.

Passou as mãos sobre os cabelos, bagunçando seus fios e soltando um leve suspiro.

Pensei em dar um tempo a ele, só estava cansado por não dormir desde a noite passada, quase não conseguia se manter de pé em meio ao salão. Tive que dar espaço para que ele pudesse sentar no sofá, ao meu lado.

— Precisam de mim pra vigiar agora, não posso voltar com você e já está tarde, te deixar voltar sozinho é perigoso demais. — Ele pressionou as têmporas com um pouco de força.

— Tudo bem, pai, eu posso ir sozinho não tem problema. Sei me cuidar.

— Péssima ideia.

— Pare com isso, você está exausto, eu volto pra casa em segurança, mas você vai me prometer que depois da vigia vai descansar um pouco. Por favor. — Sussurrei as últimas palavras em negação.

Temia por ele, não por mim.

Charlie pensou. Encarava qualquer coisa naquela sala, sem deixar a preocupação de lado.

— Me liga quando chegar? Eu vou dormir antes de ir pras ruas, prometo. — Senti seus lábios tocarem minha testa e sua mão me puxar para um abraço.

— Ótimo, prometo que vou ligar também.

Retribui o abraço. Estava tão quentinho que eu preferia ficar ali, mas não podia. Charlie me levou até a picape e mais uma vez nos abraçamos antes que eu partisse na imensa escuridão da estrada.

O motor rugiu quando girei a chave na ignição, os vidros embaçados por conta da neblina de mais cedo. As palhetas faziam seu trabalho enquanto eu me atentava na estrada.

A única luz que iluminava o asfalto era os faróis da picape. A floresta se camuflava na negridão da noite, uma lua cheia tomava conta do céu no momento. O frio aumentou. O vento se chocando nas folhas dos arbustos criava um som assustador.

Peguei o celular para colocar uma música e disfarçar a tensão que se criava dentro de mim, talvez um pop aliviasse a atmosfera.

Foi uma missão difícil. Manter os olhos na estrada e tentar colocar a música, ainda mais que os pneus não ajudavam muito na caminhada. Derrapariam se eu não tomasse cuidado, sem muita velocidade.

Rolei a lista da minha playlist e dei uma olhada rápida na estrada.

Acho que não é perigoso, só tem eu naquela rua extensa e vazia. O que poderia acontecer?

Consegui achar a música que tanto queria.

Tirava e colocava o pé no acelerador, mas não precisamente queria pegar velocidade e sim diminuir. Sem querer deixei o celular cair no espaço próprio a frente do banco do passageiro. A tela ainda estava ligada. A música parou.

— Ah, dá um tempo! — Bati no volante, tomando um grande susto com o som alto da buzina. Tenho quase certeza de que se tivesse casas por aqui teria acordado todo mundo.

Pisei um pouco no freio. Precisava pegar o celular, não queria ficar sem a música nem lascando.

Talvez esse seja meu problema, eu sou muito persistente em tudo que faço e isso acaba num problema grande.

Me certifiquei de que a estrada estava livre a minha frente. Nada. Apenas escuridão. Curvei o corpo para o lado e, devagar, estendi a mão até o celular.

Droga.

Um dos meus dedos acabou empurrando o aparelho mais para dentro do espaço. Olhei mais uma vez para a estrada. Tudo tranquilo.

— Você consegue Jimin, eu confio em você. — Certo. Essa frase não fez sentido.

Tentei pegar o celular mais uma vez, estiquei o braço até a altura da minha cabeça, perto o bastante para pegar o aparelho nas mãos. Finalmente tinha conseguido pega-lo entre dois dedos.

Havia algo errado.

Na euforia e na felicidade por conseguir tomar o celular nas mãos, me esqueci completamente de olhar para a estrada. Não me lembrava de estar em alta velocidade. Quando voltei a olhar para frente, tomei um tremendo susto com algo que surgiu do nada, se pondo na frente da picape.

Era um lobo ou um urso branco, os olhos vermelhos bem como eu conhecia. Tão familiar que eu me desconcentrei. Era grande. Estava a pouco metros de mim. Ao perceber que ia bater, pisei no freio com tudo e arregalei os olhos. Tudo o que ouvi foi o ranger estridente dos pneus e a picape começar a girar.

Eu estava tonto, tudo ficava embaçado conforme o carro girava mais e mais, até parar de cabeça para baixo.

A parte lateral da minha testa ardia muito. Tinha parado de girar, mas parecia que tudo ao meu redor ainda girava. Percebi o que tinha acontecido. Estava sem forças e o sangue subindo para a cabeça, ficando quase com falta de ar.

Não sabia o que fazer.

Tentei encontrar o botão do cinto de segurança e a trave da porta, mas foi em vão. Minha visão começava a ficar preta. Antes que eu apagasse, uma silhueta pálida saíu de um carro que se aproximava. Seja lá quem for era muito forte, conseguiu colocar o carro de volta a sua posição normal. A porta se abriu depressa e mãos me pegaram com uma força sobrenatural.

Tão geladas quanto o gelo, tão duras quanto pedra. Me agarravam como se eu fosse algodão, delicadamente e com uma certa facilidade.

Nada ouvi vindo da pessoa. Então eu apaguei sem saber quem me tirará de lá, sem saber se a pessoa era de confiança. Acho que a esse ponto não importava.

INNOCENCE • JIKOOK • (Em revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora